A Bélgica da Morte Súbita e do Delirium Tremens

Por Sérgio Capparelli Contam que na Idade Média, quando havia a peste e milhões de pessoas morriam por causa da água contaminada, Santo Arnaldo …

Por Sérgio Capparelli

Contam que na Idade Média , quando havia a peste e milhões de pessoas morriam por causa da água contaminada, Santo Arnaldo sugeriu que as pessoas bebessem cerveja , porque a água da cerveja era fervida.  A Igreja aprovou a idéia de Santo Arnaldo - naquela época ele não era santo , oficialmente -, e a Bélgica continuou a beber cerveja , até hoje , enquanto mosteiros da Itália e da França preferiram trocar a água pelo vinho .


E beber cerveja na Bélgica, especialmente a produzida pelos monges trapistas , é um ritual muito sério . Em outros lugares , como no Brasil, a cerveja é uma bebida popular , no sentido de "vamos beber umas cervejas para ficarmos mais à vontade ". A cerveja quase sempre é um meio para se chegar à espontaneidade . Na Bélgica, a cerveja também é uma bebida popular , no sentido "vamos beber e apreciar umas cervejas ", para conhecer o que é bom .


Passe na frente da do Café Trappisten, em Antuérpia, no De Garre, de Bruges, ou no Moeder Lambic, de Bruxelas. Poderá ver que as pessoas erguem lentamente seu copo de cerveja para observar o líquido contra a luz , bebem lentamente , saboreando cada gole , como se fosse um vinho inesquecível . Quer dizer , eles nem gostam de comparar com vinho , porque , para eles , vinho é uma bebida de pouco requinte , diante das boas cervejas .


Peça uma cerveja Chimay, por exemplo . Sim , dos trapistas . Você pede a branca , também chamada 7, porque apresenta um teor alcoólico de 7 graus , tem a cor do bronze e leve aroma , e vem com o logo vermelho . A clara , também chamada 8, por causa do teor alcoólico de 8 graus , é dourada e levemente amarga . E a azul , ou 9,  por causa do teor alcoólico de 9 graus , escura e de aroma intenso ,  tem o logo azul . Os apreciadores dessa cerveja a elogiam por ser mais forte e igualmente por causa da fragrância que exala e sua densidade .


A Bélgica tem mais de 500 cervejarias, a maioria delas pequenas, e uma inclusive, a Inbev, pretende comprar o controle da maior dos Estados Unidos, a Anheuser Busch. Mas não pense que encontrará todas as cervejas em qualquer lugar . Alguns mosteiros produzem um número determinado de litros (600 mil litros , por exemplo ) e estamos conversados, pois essa tem compradores certos . E quando você entra numa boa cervejaria e pede o menu , recebe um livro : centenas e centenas de marcas de cerveja , cada uma com uma particularidade .


Os nomes das cervejas talvez não sejam tão diversificados ou até mesmo ousados como os de pinga do interior do Brasil, como Amansa Corno , Amansa Sogra , Nabunda ou Atrás do Saco . Assim mesmo você pode pedir uma Morte Súbita ou uma Delirium Tremens, com teor alcoólico de 12 graus .


Os preços variam e é impossível compará-los com os do Brasil, numa época em que os preços são globalizados como técnica e como fonte de lucro . A gasolina aumenta no Brasil porque aumentaram os preços internacionais . Mas o litro de gasolina nos Estados Unidos custa R$ 1,50, na Alemanha, R$ 3,80 e no Brasil, R$ 2,74. Mas gasolina não se bebe - o carro bebe - nem é cerveja . E um copo de cerveja comum em Bruxelas - marca Stela d"Artois, por exemplo - custa em Bruxelas R $ 3,80, enquanto uma feita em mosteiro , como a Chimay Bleu, custa R$ 7,50.


*Sérgio Capparelli é jornalista e escritor, colaborador de Coletiva.net.

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