Chau, Evaldo!

Por Antonio Oliveira* Nos últimos anos nos encontrávamos somente nas festas de final de ano da nossa turma de Jornalismo na PUC, montadas quase …

Por Antonio Oliveira*
Nos últimos anos nos encontrávamos somente nas festas de final de ano da nossa turma de Jornalismo na PUC, montadas quase sempre pela Arlete e a Joyce. Outro dia ainda me perguntei se não íamos nos encontrar este ano.Era quando relembrávamos as confusões que aprontamos durante anos, indo e voltando sempre juntos no caminho da faculdade. E depois trabalhando na Zero Hora.
Uma vez fiquei impressionado quando ele disse-me que não ia trabalhar no dia seguinte no banco. Tinha aderido à greve. Era a primeira greve que os bancários faziam aqui em Porto Alegre no tempo da ditadura militar.
Coisas assim nos aproximaram e sempre nos consultávamos um ao outro sobre decisões, dúvidas em textos, idéias sobre filmes. Louco por cinema, ele sempre tinha algo a falar sobre a sua paixão.
Saíamos junto com o professor Antonio Silva depois das aulas de Cinema na PUC e íamos para os bares. Entrávamos madrugadas adentro discutindo o que fazíamos naquela época.
Realizamos três curtas-metragem durante o curso na PUC. Com Geraldo Canalli, Marques Leonam e tantos outros. Um até com Ana Amélia de atriz principal.
Resolvemos inscrever um desses filmes no concurso da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre. E quando nos demos conta, tínhamos ganho uma "menção honrosa´´, não sei por qual razão.
Acontece que no dia da entrega dos prêmios, no Theatro São Pedro, havia um debate e chamaram um de nós para a mesa. Evaldo Gonçalves teve um ataque de riso que não conseguia parar, por causa da enrascada em que tínhamos nos metido.
Como ele não conseguia parar de rir, lá fui eu para a mesa. Apresentaram os filmes vencedores e o nosso no meio, por causa da tal da "menção honrosa´´.
E começaram a aparecer as perguntas dos que entendiam de cinema e queriam explicações: "Por que vocês botaram aquela cruz em tal cena ?´´, ´´por que o padre correu para a direita e não para a esquerda ?´´ "por que tal cena foi filmada assim e não assado´´, e mais um monte de indagações para as quais eu tive que fazer um exercício danado e usar de toda a minha lábia para me safar. Afinal, era apenas um filme para ganhar nota na Faculdade e passar na cadeira do irmão Adelino. Perguntaram até por detalhes e mensagens que nós nem tínhamos nos dado conta que estavam lá dentro do filme.
Depois, demos muitas risadas, inclusive das explicações que eu dera à platéia sobre o filme. E ele continuou com seu ataque de riso até de madrugada num bar qualquer.
Durante um período, saíamos religiosamente da PUC, ai acompanhados também de Carlos Alberto Sampaio, todas as sextas-feiras à noite, rumo ao Adelaide`s Bar, na Marechal Floriano, para ouvir Lupicínio Rodrigues, na mesa com Jhonson, Hamilton Chaves, Rubem Santos, Demóstenes Gonzalez e tantos outros. E também admirar a beleza da própria Adelaide, é claro.
Evaldo só se indignava por razões ou situações absolutamente insuperáveis. Pelo menos com os amigos.Tocava a vida com uma impressionante calma, em meio às maiores confusões. Foi com esta sabedoria que, dizem, sempre tocou a profissão de jornalista, a qual eu acompanhei apenas no início.
Ele tinha a mais importante das qualidades do jornalista. Ouvia as pessoas com quem conversava sempre com a maior compenetração. "Aquele detalhe´´ nunca escapava da sua observação.
E tinha também um olho clínico. Uma vez precisávamos de um estagiário na Editoria de Esportes de Zero Hora e ele disse: "Tem um guri lá perto de casa que lê tudo e é tarado por futebol. Tem pilhas de revistas no quarto dele´´.
Mandamos chamar o guri, que em seguida tornou-se um dos mais respeitáveis textos na crônica esportiva brasileira: José Emanuel Gomes de Mattos. Um péssimo lateral direito, que mal conseguia anxergar a bola, e que chutava todo mundo. Até os próprios companheiros.
Fiquei sabendo da morte de Evaldo pelo Coletiva. Não fui ao cemitério. Estas coisas de morrer me perturbam.
Tempos atrás, encontrei o Ucha num destes eventos difíceis, patéticos, que marcam o final de uma carreira, e ele me confidenciou: "O que me assusta é

que estão chamando os da nossa turma´´.
É verdade. Foi mais um.
Chau !
* Antonio Oliveira é ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas do RS e ex-conselheiro da Fenaj.
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