Com os pés no Brasil

Por Maria do Carmo Guimarães* No período de 10 a 12 de dezembro de 2003 aconteceu a primeira fase da Cúpula Mundial da Sociedade …

Por Maria do Carmo Guimarães*
No período de 10 a 12 de dezembro de 2003 aconteceu a primeira fase da Cúpula Mundial da Sociedade da Informação (CMSI). Apesar de tantas discussões entre governos, empresas e a sociedade civil, este primeiro momento decisivo da formação da sociedade do conhecimento serviu de base para que todos os membros envolvidos entendessem as posições particulares de cada um e estudassem melhor uma forma proveitosa de procurar atender cada necessidade. Algo que deverá ser concluído e definido na segunda fase da CMSI que ocorrerá na Tunísia em 2005.
No caso do Brasil, várias propostas foram feitas pelo governo, empresas e representantes da sociedade civil. E, mesmo sem a presença do Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, o país foi representado pelo Ministro de Estado, Interino, das Relações Exteriores, o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães Neto que, em seu discurso, mostrou a posição brasileira em relação à nova sociedade da informação mundial e o que o governo vem fazendo para que ela se torne realidade no país.
Pois, o governo brasileiro vem se preparando oficialmente para a CMSI desde julho de 2003, quando criou o Grupo Interministerial de Trabalho para a Preparação da Participação do Brasil na Cúpula Mundial da Sociedade da Informação, no âmbito do Ministério das Relações Exteriores. Esse preparo do governo foi acompanhado, mesmo que de forma distante, pela sociedade civil, que verificou nas reuniões preparatórias para a CMSI uma vocação para a tecnologia por parte das prioridades governamentais. Pois, é notória a maior visibilidade da representação que a Anatel ganhou no Grupo Interministerial de Trabalho para a Preparação da Participação do Brasil na CMSI, onde a instância técnica está sendo tida como prioritária, embora seus integrantes não assumam essa tendência.
Mas, conforme foi enfatizado pelo Embaixador Pinheiro Guimarães Neto, em seu discurso na CMSI, a presença do governo brasileiro na Cúpula se deve ao fortalecimento dos ideais humanitários defendidos pela ONU e à igualdade soberana dos Estados, sendo que, conforme está sendo debatido na CMSI, as novas tecnologias proporcionam a universalização do acesso à informação e a apropriação do conhecimento. Além de contribuírem para a superação da fome, da pobreza e do atraso em todos os países, superando etapas de desenvolvimento e promovendo o crescimento econômico e a justiça social.
Assim, como enfatizou o representante do governo, a Internet é uma grande conquista dos últimos anos, se transformando num novo canal de diálogo entre Governo e cidadãos, "não apenas como um espaço para o comércio eletrônico, mas também como uma plataforma para o desenvolvimento de políticas públicas de alto impacto social, em todas as áreas".
O canal criado pelo governo começa a se difundir pelo país. De acordo com a pesquisa feita pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN), em 2003, para analisar o grau de participação das 92 prefeituras do Estado do Rio de Janeiro no processo de desburocratização eletrônica, percebeu-se que as relações entre a administração pública e os cidadãos passaram a ficar mais estreitas, graças ao governo eletrônico. Nele, os processos administrativos se tornam mais simples, acabando com as formalidades e exigências burocráticas.
Apesar de nem todos os sites oficiais funcionarem de maneira satisfatória, percebe-se que o governo brasileiro começa a se mobilizar para tentar simplificar a vida dos cidadãos. No site da Câmara dos Deputados, por exemplo, foi colocado um link para a ouvidoria parlamentar, onde os cidadãos podem buscar informações sobre o processo legislativo e levantar questionamentos sobre o mesmo. Outro que vem sendo bastante procurado é o do Fome Zero que recebe mensagens dos internautas e possibilita que os mesmos acompanhem o projeto.
Para o governo brasileiro, "a construção de uma Sociedade da Informação realmente inclusiva demanda o estabelecimento de um modelo multilateral, transparente e democrático de Governança da Internet, no qual todos os países tenham voz e capacidade de influência, em conformidade com a Carta das Nações Unidas e com o princípio da igualdade jurídica dos Estados".
Esse desenho que vem sendo feito pelo governo envolve o uso do software livre, capacitando o povo para sua utilização nas comunidades. Além disso, o representante brasileiro afirmou que "a construção de uma Sociedade da Informação inclusiva requer a consolidação de um conceito abrangente e flexível de propriedade intelectual, que leve em conta não somente a necessidade de proteção, mas também o imperativo da universalização de acesso, de modo a evitar a condenação dos países em desenvolvimento ao atraso e de suas populações à ignorância".
Como afirmou o Ministro Interino, a exclusão digital é uma nova forma de exclusão social e, na medida em que provoca muitas desigualdades, o governo brasileiro transformou a inclusão digital em política pública. "O Governo brasileiro vem investindo em um Programa de Governo Eletrônico, atento às possibilidades oferecidas pela Internet para a prestação de serviços públicos à população, em especial para os setores marginalizados". Hoje já é possível votar com maior rapidez e "segurança", graças ao sistema eletrônico de votação e de apuração eleitoral; a informatização no setor público passou a possibilitar a utilização adequada das tecnologias nos setores públicos, como as declarações de Imposto de Renda que já podem ser transmitidas pela Internet sem tantos problemas.
Apesar da evolução e melhoria da infra-estrutura tecnológica apresentada pelo representante do governo na CMSI, não se pode negar que poucos têm realmente acesso. Apresentar um futuro melhor é fundamental, mas não se deve esquecer que o povo é o mais importante na história - algo que até foi cogitado pelo governo que informou no site do Planalto, em 2003, que estava autorizando uma medida de incentivo à instalação de 4.200 computadores nas agências dos Correios, em quase 4.000 municípios, para o uso público, onde todos terão o direito de obter uma conta de email gratuita e poderão se conectar durante dez minutos - isso ficou sob a responsabilidade do Ministério das Comunicações. Dessa forma, espera-se que mesmo que o governo tenha a Anatel como referência para seus posicionamentos, que é mais focada no âmbito tecnológico, não abra mão das metas que levam em conta a dignidade do ser humano.
E que a conclusão deixada por Pinheiro Guimarães Neto, em seu discurso na CMSI, se torne uma realidade em qualidade e quantidade de acesso, utilização e aproveitamento dos recursos: "A Sociedade da Informação deve ter como alicerce o propósito fundamental das Nações Unidas de que todos os homens e nações são livres e iguais. Somente se aderirmos a tal propósito, seremos capazes de utilizar as novas tecnologias em prol da justiça social e do desenvolvimento humano. Não podemos desperdiçar tal oportunidade inédita, e comprometer o futuro. O Governo brasileiro acredita firmemente que um novo tempo e uma nova sociedade poderão ser, efetivamente, construídos se a comunidade internacional for capaz de respeitar os compromissos assumidos na Declaração de Princípios e no Plano de Ação. Nesse sentido, o Governo brasileiro pretende participar intensamente do processo preparatório para a Segunda Fase da Cúpula, a realizar-se em Túnis, em novembro de 2005".
* Maria do Carmo Guimarães é jornalista em Brasília

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