Comandante Antônio

Por José Emanuel Gomes de Mattos "Conte-me, e eu vou esquecer. Mostre-me, e eu vou lembrar. Envolva-me, e eu vou entender." (Confúcio ? 551/478 …

Por José Emanuel Gomes de Mattos

"Conte-me, e eu vou esquecer. Mostre-me, e eu vou lembrar. Envolva-me, e eu vou entender." (Confúcio - 551/478 a.C)


O Antônio Oliveira, que acaba de ter seu perfil publicado no Coletiva.net, era subchefe do Esporte na véspera do carnaval de 1974 quando fiz meu primeiro teste num jornal.


Foca, escrevi o texto em espaço 2. Aquele sujeito de cabelo desgrenhado e barba de bucaneiro divertiu-se. Ali aprendi a primeira lição: as laudas na redação eram escritas em espaço 4.


Mas gostou do conteúdo e contratou-me para a vaga, que disputei indicado por seu companheiro de faculdade e meu colega bancário, com quem trabalhei durante anos nas redações e tornou-se grande amigo até a morte: Evaldo José da Silva Gonçalves.


Em meados daquele ano, o editor José Antonio Ribeiro passou-lhe o cargo e embarcou na aventura do Hoje, vespertino da RBS, lançado em outubro de 74 e naufragado em julho de 75.


Antônio exercia o comando do Esporte como capitão de corsário - não admitia contestação. Os graduados ouviam desaforo. E não foram poucos. Os grumetes caminhavam na prancha. Aprendi na prática.


Em 1975, enviava de Belo Horizonte duas páginas diárias sobre o Cruzeiro, adversário do Inter, pelo título brasileiro. O saudoso amigo Sergio Roberto Souza Moita - que Deus o tenha - avisou: "Teu material vem sendo publicado sem crédito". Remeti um telex moleque: "Assinem, nem que seja como Zé dos Anzóis, a fim de dar credibilidade ao trabalho que está sendo feito".


Recado que chegou: capitão foi visto trepado num porco espinho.


Lição número dois: humildade. Fui lavar o convés.


No dia da decisão, recebi como pauta anotar a opinião da imprensa que veio acompanhar o jogo histórico. Bem feito.


Houve outros episódios marcantes, um deles traumático, quando virei marionete em pesado jogo de bastidores pelo poder na redação, que não tornarei público porque o principal envolvido - José Antônio Ribeiro - já nos deixou. E por acreditar que erros da mocidade fazem parte do aprendizado. Afinal, o fato ocorreu há mais de 30 anos. 


Relato apenas que paguei a mula roubada. Passei a trabalhar em horário diferenciado, com a tarefa de produzir pautas destinadas aos repórteres especiais: Eduardo Peninha Bueno, Marcelo Matte e Mário Speranza. Três jovens talentos, hoje brilhantes comunicadores.


Sobre o Peninha, lembro que, numa daquelas manhãs, fui assombrado pelo arroubo da sua entrada: "É aqui o Esporte? O Fernando Ernesto mandou eu me apresentar pra trabalhar", deu o carteiraço, todo pimpão.


Para finalizar: naquele período ensandecido, o Esporte situava-se em uma sala grande e isolada do resto da redação - apelidada apropriadamente de "jaula". Às sextas-feiras, buscávamos no bar Porta Larga - que ficava ao lado de ZH - litros de cachaça com limão, combustível essencial ao fechamento de duas edições simultâneas.


A cada garrafa que surgia brotava uma lágrima no rosto do diagramador Chimba.


Na madrugada, quando exu pau d"água incorporava geral, Antônio tinha a morbidez de predizer que morreria com 33 anos, sei lá por qual razão. 


O subeditor Boró estacava, de olho arregalado, solidário. 


Hoje, perto de completar 63, esse geminiano bonacho talvez nem recorde da bizarra profecia.


- Velas ao vento!


Que a tua nave ainda tenha muito tempo pela frente para singrar outros tantos mares, comandante Antônio.

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