Direito de resposta e liberdade

Por Carlos Eduardo Lins e Silva O Supremo Tribunal Federal está julgando se a Lei de Imprensa, fragmento do entulho autoritário do regime militar …

Por Carlos Eduardo Lins e Silva

O Supremo Tribunal Federal está julgando se a Lei de Imprensa, fragmento do entulho autoritário do regime militar de 1964, deve ser revogada inteira ou parcialmente.


Há consenso sobre a necessidade de eliminar todos os dispositivos que inibem a liberdade de expressão ou permitem a prática de censura. Mas muitos setores, inclusive curiosamente as entidades de classe dos patrões e dos empregados, acham que a regulamentação legal deve existir para aspectos específicos. Entre eles, o direito de resposta.


O Brasil é um país em que se costuma confiar muito na capacidade de resolver problemas pela edição de leis. Quanto mais detalhadas, melhor. Há questões que são de tal modo complexas, que nem o espaço do jornal inteiro abarcaria todas as possibilidades.


O direito de resposta é uma delas. A Constituição, no artigo quinto, inciso V, diz que "é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem".


Mas como regular isso? Como definir a proporcionalidade, comprovar o agravo, quantificar o dano?


Como garantir o direito de resposta a um livro? A editora deve publicar outros livros, escritos por pessoas que se sentem prejudicadas pelo original, com a mesma tiragem e o mesmo tamanho?


Se 50 pessoas acharem que seus interesses foram prejudicados, por razões diversas, por uma reportagem de jornal, o diário deve publicar 50 reportagens no mesmo espaço e com o mesmo destaque?


Como obrigar um blog a veicular versão de quem se sentiu atingido por um comentário do blogueiro ou de algum comentador? E se o blog, embora em português e sobre o Brasil, é editado no exterior?


Como emissoras de TV ou rádio estrangeiras sintonizadas no Brasil vão compensar com direito de resposta os brasileiros que provarem que uma de suas matérias lhes trouxe problemas ou danos?


Além do Brasil, outro país se debate atualmente com tais dilemas: Filipinas. No dia 13, a Câmara dos Deputados de lá retoma o debate de projeto de lei capaz de deixar muitos brasileiros com inveja, pelo nível de minúcia e severidade das punições que contém.


Outras nações encontraram outras soluções. Nos EUA, em 1974, no caso "Miami Herald v. Tornillo", a Suprema Corte em votação unânime sepultou as tentativas de regular por lei o direito de resposta em decisão que disse: "A escolha do material que sai num jornal (?) constitui exercício de controle e julgamento editorial. Ainda está para ser demonstrado como regulamentação governamental neste processo crucial pode ser exercida em consonância com a garantia de liberdade de imprensa assegurada pela Primeira Emenda".


Lá, os que se sentem ofendidos recorrem à legislação comum. E não há reclamação contra isso. Aqui, há quem considere o Código Penal muito rigoroso e antiquado.


Por que não reformá-lo, então, em vez de criar outra lei específica? Ou, quem sabe, nossos legisladores demonstrarão o que a Suprema Corte americana achava impossível demonstrar.


*Carlos Eduardo Lins e Silva é ombudsman da Folha de S.Paulo, onde este artigo foi originalmente publicado.

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