‘Comoéquetálá?’

Por Fernando Silveira* O uso do "comoéquetálá" é uma prática comum entre os publicitários. Não se trata de uma novidade. Há muito tempo é …

Por Fernando Silveira*
O uso do "comoéquetálá" é uma prática comum entre os publicitários. Não se trata de uma novidade. Há muito tempo é assim. Acontece o tempo todo, não precisa de um momento especial como o Salão da Propaganda, o Colunistas ou um evento qualquer, basta um daqueles encontros que acontecem ao acaso (ou nem tanto) para que alguém seja mais rápido no gogó e fale o "comoéquetálá". Sim, é assim mesmo, despretensioso, descontraído e cheio de uma malícia invejosa, porém nem tão pecaminosa para que seja detestável e nem tão inocente para que seja considerada inofensiva. Na verdade ela existe porque é alimentada pela curiosidade, pela competição e pelo desejo de zum-zum que vive alfinetando publicitárias e publicitários. Quer testar? Vamos lá, leia como em voz alta, sem pensar muito, exatamente o que está escrito aqui:
- E aí, comoéquetálá?
É isso! Fácil, fácil. E é assim mesmo, tudo emendado, rápido e rasteiro. Digamos que o "comoéquetálá" seja o "tudo bem" dos publicitários. É mais ou menos como fazem os advogados, que não podem ver um ao outro e já lançam aquele "doutor". Eu sempre soube que pra ser considerado doutor precisa ter doutorado, mas tudo bem, pois abro a exceção aos médicos. Afinal, fica desconfortável ir ao consultório e ficar chamando o médico pelo nome. Então vai doutor mesmo. Bom, mas no caso dos advogados, ainda não descobri porque insistem no doutor pra cá, doutor pra lá. E olha que devem ser poucos os advogados com doutorado, chego até a arriscar um palpite dizendo que se 2% forem doutores é muito. Mas enfim, eles lá e a gente cá.
Tá, mas no caso do "comoéquetálá" ainda é um pouco diferente, pois é uma pergunta e, portanto, exige uma resposta que nem sempre pode ser totalmente honesta. Veja por esse ângulo: as pessoas costumam perguntar se está tudo bem e mesmo que você esteja na maior M do mundo, jamais será honesto o suficiente para responder. Dirá "tudo bem" e pronto. OK? OK. Mas não vamos abandonar nosso foco "comoéquetálá" assim tão facilmente. Já estamos convencidos de que faz parte do nosso universo, agora precisamos entender a profundidade da resposta ao "comoéquetálá". Afinal, dependendo do que é respondido, tudo pode ficar altamente inflamável. Tente visualizar a cena:
O redator A, que estava na agência X e há uns seis meses foi para a Y, encontra o amigo atendimento B, que está tomando um cafezinho pós-almoço com o produtor C, também amigo do redator A, mas nem tanto, porque como o produtor C chegou na agência X quando o redator A já estava pensando em sair e não houve tempo para amizades. Durante o almoço, atendimento B e produtor C discutiam os problemas da agência X quando o redator A passa e pára para aquilo que deveria ser um breve "oi". Claro, um oi, pois estão todos vivos embora sem champanha para fazer tim-tim (que trocadilho de telefonia móvel pra lá de infame, peço perdão).
Pois bem, retomando. Depois do "oi", o atendimento B questiona:
- Mas me diz aí, redator A, comoéquetálá?
O redator A, diante da pergunta e da última encheção de saco que teve para liberar o anúncio do jornal quinzenal de Tucunduva, onde o cliente resolveu comprar uma mídia só pra ajudar o amigo de um amigo que suplicou horas e horas, diz:
- Cara, não é bem aquilo que dizem por aí, aliás, eu estava bem melhor lá na X.
- Sério? Espanta-se o atendimento B
- Aham. Vai por mim, cara, a X é muito legal. Mas é isso, cara, vou nessa, falou.
- Certo. Até mais, tchau.
Diante dos olhares estupefatos do atendimento B e do produtor C, o redator A sai rumo à agência Y, que fica logo ali. Enquanto o A vai, os dois ficam discutindo sobre o que poderia estar acontecendo com o cara na agência Y. Sem conclusão, aliás raramente tira-se alguma conclusão de um papo que começa com "comoéquetálá", os dois levam suas dúvidas para o trabalho. Depois de alguns telefonemas e umas duas dúzias de e-mails, o mercado já comenta. Se não todos, muitos já falam que o A tá P-da-vida na Y. O diretor de arte DA fala pro atendimento N, que está na produtora HZ, sobre o assunto. A mídia J da agência U e que namora o assistente de arte K da nova agência P, diz para o namorado que ouviu no corredor sobre a possível volta do redator A pra X. E assim vai, vai, vai, vai e vai. Os que conhecem o A falam. Os que nunca deram sequer um "oi" ao A e muito menos tiveram a chance de mandar um "comoéquetálá" pra ele, também falam no assunto. Todos falam, sejam conhecidos ou não, como amigos íntimos sobre os problemas do A e também da Y. Não faltam aqueles com ar de conhecedores de tudo dizendo:
- Eu disse, grana não é tudo?eu disse.
É uma bomba muda. Explode, mas ninguém ouve o estrondo. O efeito é rápido, dura dois, três dias, no máximo uma semana, pois em breve surgem novos personagens. Mas vamos imaginar que no mesmo encontro entre o redator A, atendimento B e produtor C, a resposta ao "comoéqueestálá" tenha sido diferente. Veja:
- Mas me diz aí, redator A, comoéquetálá?
O redator A, radiante com suas últimas campanhas, com facilidade em aprovar e também com o profissionalismo da agência Y, diz:
- Cara, a Y é muito legal. Isso é que é agência!
- Sério? Os caras são tudo isso mesmo?
- Aham. A Y é organizada, moderna, atenta com a equipe?pô, é muito legal mesmo. Mas agora tenho que ir, cara. Outra hora te conto mais. Falou!.
- Certo. Até mais, tchau.
O que você acha que acontece? Pensa que todo mercado fica sabendo disso? Pensa que muita gente vai invejar o trabalho do cara? Que nada. O atendimento B vai olhar para o produtor C e, no máximo, dirá:
- Legal! Bom pra ele.
Ou seja, a culpa não é do "comoéquetálá", mas sim das respostas ao questionamento. Elas vão ou não vão criar o zum-zum no mercado. Aliás, já perdi a conta das vezes em que fiz isso e também das vezes em que fui questionado. Coisas do mercado. Há pouco tempo encontrei o Firpo e usei "comoéquetálá". Esses dias, ao cruzar pelo Jacoby, ele usou o "comoéquetálá". É assim mesmo. Aliás, se não te perguntei aquele dia no almoço, me diz uma coisa: "Comoéquetálá"?
* Fernando Silveira é diretor de Criação da Integrada (RS)
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