É preciso reler Balzac

Por Flávio Porcello Estamos na reta final da campanha para o segundo turno das eleições de 2006 e se o leitor quiser encontrar na …

Por Flávio Porcello

Estamos na reta final da campanha para o segundo turno das eleições de 2006 e se o leitor quiser encontrar na Imprensa informações para escolher seus candidatos vai ter que procurar bem. Ou melhor, aconselho que leia várias publicações, some, diminua, multiplique e divida o que leu para chegar a uma média que o deixe perto de entender o que está acontecendo. Um breve exemplo: a Veja, número 1978, de 18 de outubro, trouxe na manchete "Limpeza de alto risco", e no subtítulo, "A operação para encobrir a origem do dinheiro pode ser ainda mais devastadora para o governo". A concorrente Carta Capital, número 415, com a mesma data de capa, deu como título: "A trama que levou ao segundo turno", e nas linhas de apoio completou: "A partir da trapalhada do PT, a mídia, em especial a Rede Globo, beneficiou o candidato tucano de forma decisiva, às vésperas das eleições presidenciais, com a divulgação das fotos do dinheiro e a ocultação de informações cruciais na cobertura do escândalo do dossiê".


Com lentes tucanas ou petistas, cada revista viu o que quis ver, e o leitor, para tentar entender o que está acontecendo, além de ler as duas semanais precisa buscar outras fontes de informação. O segundo turno da eleição de 2006 está reduzido ao debate Ética x Privatizações.


- A imprensa, como a mulher, é admirável e sublime quando conta uma mentira. Não o deixa em paz até tê-lo forçado a acreditar nela e emprega as maiores qualidades nessa luta em que o público, tão tolo quanto um marido, sucumbe sempre.


O autor do texto acima, escrito há mais de 150 anos, foi Honoré de Balzac, no livro Os jornalistas. Ele referia-se à imprensa francesa de meados do século XIX e acrescentava: "Se a Imprensa não existisse não seria preciso inventá-la". Um certo exagero. Poderíamos tê-la inventado bem melhor. Se bem que quem leu Veja e Carta Capital essa semana, juntas ou separadas, vai concordar com Balzac: se é para ser assim, melhor que não tivessem sido inventadas.


Mas já que a Imprensa (ainda bem) foi inventada, tratemos de melhorá-la. Mais de 400 pesquisadores, professores, jornalistas e estudantes de Jornalismo de todo o Brasil e vários países tentarão contribuir para essa melhora logo depois das eleições. De três a sete de novembro, a Ufrgs vai sediar em Porto Alegre dois congressos voltados para discutir o Jornalismo: a I Journalism Brazil Conference, que tem como tema central "Pensando o jornalismo para além das fronteiras nacionais: novos desafios e perspectivas emergentes", e o IV Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, que discutirá "A pesquisa em jornalismo e o interesse público".


Será uma oportunidade para refletir com profundidade sobre os temas que afligem o jornalismo atualmente, ouvindo e debatendo com pesquisadores brasileiros e internacionais tendências e comportamentos. Quem estiver interessado em participar pode obter mais informações no endereço eletrônico www.sbpjor.org.br . Afinal, Balzac talvez preferisse que ela nunca tivesse existido, mas já que a Imprensa foi inventada temos que fazer o que está ao nosso alcance para melhorá-la.

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