Em favor da Conferência Nacional de Comunicação Já!

Por Emanuel Gomes de Mattos Não há maioria sem sonho, como não há sonho sem maioria, dizia Paulo Freire. Assim como a caminhada, por …

Por Emanuel Gomes de Mattos

Não há maioria sem sonho, como não há sonho sem maioria, dizia Paulo Freire. Assim como a caminhada, por melhor ou mais árdua, começa no primeiro passo.


Em 27 de agosto de 1974, período em que o ditador de plantão era o general gaúcho Ernesto Geisel, foi fundada a Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre - Coojornal -, no salão nobre da Associação Riograndense de Imprensa.


Estive presente nesta ocasião história - era meu primeiro ano no exercício da profissão e trabalhava como repórter da Folha da Manhã, cuja redação estava praticamente toda presente a este ato que entrou para a história da imprensa do Estado como aquele em que jornalistas criaram uma associação que tinha por finalidade termos autonomia para tocar projetos, sem ingerência patronal.


O projeto, sabotado pelo regime militar, encerrou em 1983. Ficaram as dívidas, que foram saldadas, mas nunca mais se apagou a chama libertadora que volta e meia os profissionais da imprensa local teimam em acender por causa nobre.


Como tem sido o caso da luta para evitar o fim da profissão regulamentada de jornalista. Nesta terça, 25/11, a Federação Nacional dos Jornalistas - FENAJ,  entregará proposta de projeto que regulamenta o exercício da profissão. Os eixos do projeto incluem a exigência de diploma de ensino superior em para todas as funções jornalísticas, diferenciação entre jornalismo e o colaborador, o fim do provisionamento - com regras para o período de transição -, além de definir as especificidades do estágio e transformar em funções as atividades que já estão previstas, como professor de jornalismo e assessor de imprensa.


Sábado, 22 de novembro de 2008, ocorreu mais um movimento que poderá ser histórico, a partir de uma nova iniciativa de jornalistas. No Auditório João Neves da Fontoura, o Plenarinho da Assembléia Legislativa, foi realizado o "Seminário Estadual Pró-Conferência Nacional de Comunicação". Ao final, foi entregue o Certificado para os participantes dos três painéis: "Reestruturação do Sistema e Controle Público", "Conteúdo Cidadão" e "Convergência".


O tema é polêmico, ainda não encontrou a ressonância merecida no Congresso, mas com a união dos principais sindicatos e entidades, o barco poderá andar. São signatários do encontro: Conselho Federal e Regional de Psicologia/RS, Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Campanha Ética na TV, Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), Sindicato dos Jornalistas do RS, Sindicato dos Psicólogos do RS, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS), Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Amarc/Conrad), Central Única dos Trabalhadores (CUT/RS), Sindicato dos Telefônicos (Sinttel/RS), Canal Comunitário POA TV, Alice/Jornal Boca de Rua, Conselho Municipal dos Direitos da Mulher - Ilê Mulher, Executiva Nacional de Estudantes de Comunicação Social (Enecos), Federação da Alimentação do RS, DISTBRASIL, Conlutas e SIMPA.


O primeiro painel teria a ex-prefeita de São Paulo e deputada federal, Luiza Erundina (PSB), que no Congresso é titular da importante e nevrálgica "Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática", defensora do tema que mediaria: "Reestruturação do Sistema e Controle Público". Doente, a deputada Erundina foi substituída na função por Dagmar Camargo, da Conrad.


Em sua intervenção, Pedrinho Guareschi, mestre da PUC, citou o exemplo positivo da participação dos cidadãos na BBC, principal estatal pública da Inglaterra, tem o conteúdo decidido pela população. "Quando houve debate a respeito de haver espaço para programas religiosos - e foi aprovado."


Osvaldo Biz, também mestre na PUC, abordou a respeito de "Leitura crítica da mídia: desafios e perspectivas". Pontuou sua fala com slides. Alguns registros: "Através da TV o mundo que chega é editado, já com uma visão construída sob  determinado ângulo. Por isso, é fundamental a formação do cidadão que saiba fazer uma leitura crítica. É necessário que o leitor conheça o processos de construção da informação. Os meios de comunicação são fascinantes e preocupantes ao mesmo tempo: são simples, fáceis, mas não ingênuos." E advertiu que é estreita a relação entre os donos do capital e da mídia.


Maria Helena Weber, da UFRGS, abordou a influência da mídia na política, ao referir três novelas que a Globo exibiu simultâneas à eleição de Collor. "Agora, em "A Favorita" desqualificam a política através de um corrupto", constata. "O que é o interesse público quando se trabalha em comunicação?", propõe, ao pregar que esse debate seja transportado para dentro das universidades. E alegou: "Não é o que a mídia faz por nós, mas o que nós fazemos com a mídia".


Celso Schröder, coordenador geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação/FNDC, destacou que o assunto já faz parte da agenda nacional, tanto na dos empresários como dos políticos. Mas advertiu que a discussão no Congresso tem sido sempre adiada: "Há 30 projetos engavetados", denunciou.


Schröder constata que, a partir dos anos 90 deixou de haver distinção entre telecomunicação e comunicação. "Há uma crise enorme no atual modelo que ameaça os donos, os poderosos, esses senhores detentores do monopólio". Destacou que todos os atuais escândalos têm por trás a questão das teles. E citou a Internet libertária, multiplicadora, decisiva na última eleição da Espanha.


José Luis Sóter, das rádios comunitárias, enfocou a respeito do conteúdo gerado pela verticalização. "Há uma discussão ampla sobre a tecnologia na comunicação, porém discute-se o padrão tecnológico e não seus conteúdos."


Ricardo Maretzsohn relatou os avanços da Campanha "Quem financia a baixaria é contra a cidadania". Fez questão de salientar que não é censura, é controle social, tanto que foi criada tendo por base os estatutos legais, entre eles a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o Código do Direito do Consumidor e as convenções internacionais assinadas pelo Brasil. A conclusão do trabalho de comunicar as infrações aos Direitos Humanos gerou até agora 35 mil denúncias fundamentadas, resposta positiva de anunciantes, o que determinou a mudança na grade e no conteúdo das emissoras e a portaria de nº 1220, do Ministério da Justiça, sobre a classificação indicativa de programas.


Roseli Gofmann, do Conselho Federal de Psicologia, advertiu para um dado no mínimo alarmante: 90% da TV fundamenta a educação da criança, que assiste em média de 4 a 8 horas por dia. "O dano à educação e à informação da criança é irreparável, pois são seres que contemplam, repetem e fazem dele o hábito". Ela aponta exemplos positivos dos países mais evoluídos no debate desta questão e que já proíbem publicidade voltadas às crianças em qualquer horário.


A respeito de como obter resultados no Brasil, a fórmula, segundo Roseli, é simples: "Fazer política é vida, mobilização é vida. Só estamos realmente vivos quando participamos politicamente. E, ao lembrar o resultado obtido pelo "Movimento Diretas Já", conclamou: "A militância de rua é insubstituível". 


Antônio Hohlfeldt representou a Intercom - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Com a experiência de quem já fez de tudo na vida - inclusive governar o Rio Grande - convidou os participantes a refletir "se estamos fazendo tudo o que deveríamos fazer para convencer a sociedade sobre a necessidade da discussão dos conteúdos dos meios de comunicação Pedro Osório (Unisinos/FNDC), os palestrantes do Terceira Painel: "Convergência"


José Carlos Torves, do Departamento de Mobilização da Fenaj, mediou o painel "Convergência". Resumiu sua intervenção ao que considera fundamental em todo o processo que iniciou com a Pré-Conferência Nacional de Comunicação:


- Essa discussão é fundamental para o Brasil e deve ser feita com toda a sociedade civil e não em gabinetes fechados como tem ocorrido até agora.


Pedro Osório (Unisinos/FNDC) pregou: "A sociedade precisa estar capacitada para dominar a comunicação. Se não nos apropriamos das novas formas de mídia é mais difícil compreender e tomar decisões frente às corporações".


- Se não houver um debate sério, organizado, que envolva sindicatos, partidos e instituições, por todos os meios, enfim, não conquistaremos nossos objetivos.


Já o professor Valério Brittos (Unisinos) teme um novo ciclo de sucateamento da TV Pública. "As motivações e as conseqüências sabemos quais são", advertiu. Para ele, apesar da mudança de paradigma tecnológico, continuamos com um gargalo midiático, que é muito mais acentuado na educação e na cultura.


No final, o presidente do Sindicato dos Jornalistas do RS, José Nunes, saudou o auditório lotado, "o que significa que começamos a discussão com o pé direito".


A frase estampada nas frente das camisas distribuídas aos participantes do "Movimento Pró-Conferência Nacional de Comunicação/RS: início da mobilização". Na parte de trás das camisas consta a relação das entidades, sindicatos e associações e federações que integram a "Comissão Estadual Pró-Conferência Nacional de Comunicação" www.protoconferencia.com.br.


Em resumo, o Plenarinho da Assembléia serviu, das 9 horas às 18h, para os presentes tomarem conhecimento das dificuldades iniciais que se terá para organizar a "Primeira Conferência Nacional de Comunicação". Aparentemente,  o governo federal não tem interesse no assunto, muito menos a maioria dos que integram as duas Casas do Congresso Nacional, informou Celso Schröder. Seja como for valeu, pois toda a caminhada começa com seu primeiro passo. *


* Deve se destacar que o ideário de Daniel Hertz, fundador do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, foi destacado em diversas intervenções.

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