Mulheres aos 40 anos

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins* Mulher é bicho esquisito, todo mês sangra, já dizia em sua eterna sabedoria a tia do rock nacional, Rita …

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins*
Mulher é bicho esquisito, todo mês sangra, já dizia em sua eterna sabedoria a tia do rock nacional, Rita Lee. É um bicho tão esquisito que nunca está contente com a idade, com seu corpo, seus olhos e cabelos. Se tem 20 anos, quer chegar aos 30, se está nos 30, teme os 40, quando chega aos 40, entra em uma confusão mental, profissional e sexual. Nunca está contente com o corpo. Se magra, quer emagrecer mais. Se gorda, é PHD em dietas. Se tem olhos castanhos, queria que fossem claros e se os cabelos são lisos, trata logo de encrespá-los.
Se a mulher já tem idiossincracias em seu estado normal, imagine uma jornalista repleta de afazeres ultrapassando o início dos enta. Isto, suponho, deve acontecer com todas as mulheres em qualquer profissão quando ultrapassam os 40 anos. Mas sendo jornalista, lhes asseguro que a neurose é bem pior. Falo por experiência própria. Por isso, parem todas as máquinas e respeitem a jornalista que está nos enta. Em qualquer ano dos enta. Não importa. Ela é um ser sensível e em estado de observação. Pronta pra explodir a qualquer passo, frase ou pensamento em falso.
A jornalista nos 40 tem medo de perder o emprego e ser trocada por duas de 20 (sem tanta experiência, mas com salário menor e menor quilometragem). E no jornalismo parece que é mais difícil arrumar emprego depois de uma certa idade - os 40 pesam negativamente no currículo. Os mais observadores dirão que temos ótimas jornalistas no cenário nacional e na imprensa gaúcha. Poderia ajudá-los nessa lista e somar pelo menos umas 50 colegas. Sejamos, no entanto, coerentes. Todas estão empregadas há muito tempo e o número é pequeno no universo de jornalistas que esse país acumula.
Não estou atuando em causa própria. Sinto-me bem empregada há cinco anos no mesmo local e respeitada profissionalmente (bati três vezes na madeira). Observo, no entanto, algumas colegas que perderam recentemente o emprego - colegas também de faixa etária, compreenderam? - e passam por sérias dificuldades para arrumar um novo trabalho. Todas com um currículo ótimo, passagem por veículos, assessorias e tudo o mais. Algumas passando por enta e outras na fase que antecede os enta. Todas desesperançosas.
Talvez pela cômoda situação de quem está empregada, começo a rever um pouco os meus pontos de vista. Já não acho tão horrível entrar nos 40. Posso ser trocada por duas de 20, no trabalho e no relacionamento.
Mas nenhuma delas certamente viverá a história que já vivi, os momentos que já passei com companheiros, os furos que já dei quando atuava em veículos e os releases que consegui emplacar enquanto assessora de comunicação. Chegar aos 40 ou passar um pouquinho deles é estar amadurecida, repleta de vida, transbordando de experiência profissional, vivências sexuais, muito amor pra dar aos filhos. Mesmo que seja em qualidade e não em quantidade, justamente porque a profissão nos obriga a chegar mais tarde em casa.
Só quem passou dos 40 assistiu a tantos fenômenos de todos os tipos. Jornalisticamente falando. Juro que lembro, por exemplo, do Sérgio Chapelin anunciando a chegada do homem à lua, o Cid Moreira informando a morte do John Lennon ou os primeiros casos de AIDS no mundo sendo relatados no Jornal Nacional, as capas da Veja contando da morte da Elis e depois a polêmica capa do Cazuza assumindo publicamente que era HIV positivo. E até a morte do Mário Quintana e do Caio Fernando de Abreu.
Sem falar na passeata das diretas, da morte do Tancredo, do primeiro voto para Presidente da República. São tantas emoções para quem já acumula tanta experiência. Portanto, mulheres de 40, não desanimais jamais. Se observadas bem de perto, podemos ter algumas rugas (nada que um botox ou Dmae não corrija). De quebra, ajudamos a fazer um mundo e mais do que isso, fomos espectadoras dele, colocando em cada acontecimento todo o amor e a sensibilidade que caracterizam as mulheres, principalmente as mais experientes.
* Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, assessora de comunicação, está completando mais de 40 em junho.
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