O big brother dos Correios

Por Antônio Leopoldo Curi A indústria gráfica brasileira pergunta à classe política se a impunidade será, mais uma vez, prevalente, agora nesta lamentável seqüência …

Por Antônio Leopoldo Curi

A indústria gráfica brasileira pergunta à classe política se a impunidade será, mais uma vez, prevalente, agora nesta lamentável seqüência de fatos que atinge os Correios. Esta é a grande preocupação da Associação Brasileira da Indústria de Formulários, Documentos e Gerenciamento da Informação (Abraform), da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf) e de todo o universo empresarial que representam. Há mais indignação e preocupação no conjunto de gráficas da área de documentos e formulários, cujo mercado, estimado em mais de R$ 500 milhões/ano, será abocanhado pela Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), caso o contrato número 13.159/2004, assinado em 21 de dezembro de 2004, não seja cancelado em tempo, em nome da justiça, do direito e da ética neste país.


Ainda no âmbito da CPI, verifica-se um desvio enorme de foco e de atenção, devido a infelizes descobertas, como "mensalão", caixa dois de partidos e candidatos, o que dispersa a energia e permite até a propostas oportunistas. Uma delas é a do novo ministro das Comunicações, que sugeriu a mudança do nome da CPI, dado que a imagem "imaculada" da ECT deveria ser protegida, devido à sua obrigação legal de distribuir correspondências a todos os rincões do país. O argumento do ministro, de que a instituição ainda goza de alta credibilidade, graças aos heróicos carteiros em todo o Brasil, é um desrespeito à inteligência da população e ao trabalho desses profissionais. Eles não têm qualquer culpa se pessoas inescrupulosas avançam sobre o erário público, buscando locupletar-se à custa do tráfico de influência e do exercício desvirtuado do poder.


Empresa estatal não pode exercer atividade que não seja determinada em lei. E a legislação postal vigente não confere permissão à ECT para imprimir eletronicamente correspondências comerciais, extratos bancários, contas de energia ou outros afins, que movimentam atualmente milhões de peças postadas em todo o território Nacional. Não existe lei postal que permita à ECT implementar Correio Híbrido Telemático e Correio Híbrido Reverso, mas a companhia já contratou e implementou todos esses serviços, à revelia da lei e dos interesses maiores da Nação.


Com o Correio Híbrido contratado ao consórcio BRPostal, a ECT amplia agora seus tentáculos de "Big Brother" para o  modelo perfeito de estender suas atividades  - e os meios justificam os fins, como só acontece ultimamente no PT e no Brasil. A companhia estatal avança para um monopólio que será exercido através da manipulação de tarifas postais, em contratos com os grandes emissores de correspondências comerciais, dado que os preços dos serviços que quer passar a prestar estão substancialmente acima dos praticados pelo mercado.


Por que "Big Brother"? Ora, porque os arquivos eletrônicos de todos os extratos bancários, cobranças, cartões de crédito e outros documentos privativos do cidadão honesto serão transmitidos e circularão pelo processamento de dados da ECT, que em pouco tempo irá dominar o maior e mais completo mailing list do País, com alta qualificação de endereços, nomes e comportamentos de consumo e despesas. É o sonho do marketing direto sob controle de uma empresa governamental, que já tem não só a distribuição de produtos de consumo (logística de itens de beleza e outros), como também site de venda por Internet.


Será a maior aberração quanto à privacidade de dados do cidadão brasileiro. Notem que a ECT já tem departamento de vendas para aplicações de malas diretas. O Super Correio será irmão da Super Receita. Assim, ao arrepio da lei e da Constituição, a ECT prepara-se para expandir, em médio prazo, seus serviços para América do Sul e, aparentemente, goza ainda das benevolências da dispersão da CPI e do que restou da construção da blindagem de poder do Executivo nas heranças do ex-super-ministro da Casa Civil.


É consternador estudar e analisar o Relatório de Ação de Controle, Auditoria Especial na ECT - Portaria 121/2005 CGU -, Relatório Parcial nº 8, disponível no site da Secretaria Federal de Controle Interno (CGU). Este relatório demonstra que nem a ECT sabia o que licitava, tanto quanto os auditores não sabem do que se trata o contrato nos serviços e softwares comprados. As recomendações são puramente cosméticas e o superfaturamento não é restritivo ao prosseguimento da implementação do contrato. E, como se observou nas ações cautelares, mandados de segurança e outras ações públicas que tentaram evitar o escândalo das falhas de objeto, quantidades, inconstitucionalidades e outras aberrações do edital que se converteu em contrato, as explicações da ECT e seu aparato jurídico são (estranhamente) suficientes para demover análises mais profundas nas esferas federais de 1ª instância e, agora, também na CGU.


O cúmulo da falta de vergonha foi o disparate de o representante da ECT na ultima Xplor (evento, aliás, que tem na liderança tácita uma das empresas do novo consórcio monopolista) afirmar ao público presente que o Correio Híbrido estará em operação a partir de janeiro de 2006. Certamente, para fazer em público tal afirmação, ele já deveria ter ciência do conforto e da acomodação dos fatos contidos no Relatório número 8, anteriormente citado. A quem podemos recorrer se a CPI não foca a ECT, se o ministro protege o plano da estatal e a CGU reporta-se à auditoria como que dando alvará de prosseguimento neste escândalo, infelizmente pouco divulgado pela mídia e pouco compreendido, senão por setores tecnicamente preparados na economia privada?


O Correio Híbrido é uma das mais patentes provas dos problemas ocorridos no setor público federal. É fruto de tráfico de influência e do jogo de interesses inconfessáveis. O mais estranho é que o projeto, nascido no governo anterior, foi barrado e esquecido, sendo retomado com grande contundência no Governo Lula. A Nação pergunta o porquê. Com a palavra, inquisidores e depoentes da CPI dos Correios!

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