O “Jornal do Brasil”

Por Braulio Tavares “E vejam meu azar: comprei um Jornal do Brasil, emprego tinha mais de mil… e eu não arranjei um só!”  O …

Por Braulio Tavares
"E vejam meu azar: comprei um Jornal do Brasil, emprego tinha mais de mil? e eu não arranjei um só!"  O drama não é meu, é do personagem cantado por Jackson do Pandeiro no clássico "Meu Enxoval", em que o "paraíba" desempregado, depois de não achar uma colocação, acaba dormindo em frente em Teatro Municipal, na Cinelândia, aconchegado pela imprensa carioca: "O meu travesseiro é um Diário da Noite, e o resto do corpo fica na Última Hora".
O humor de Almira & Gordurinha, autores da música, fala de uma época em que a imprensa impressa carioca tinha titãs da informação, da polêmica e da cultura.  "Diário da Noite" e a "Última Hora" deixaram as bancas para repousar no silêncio das bibliotecas; agora foi a vez do "Jornal do Brasil", que para muita gente continua sendo o símbolo de um jornal moderno e modernizador, na diagramação, no visual, no estilo, na abordagem, na prosa, no tratamento da cultura.  Sem ele, teria sido muito diferente a história da música popular brasileira, do cinema brasileiro, da poesia, do teatro, dessa coisa toda enfim.  Sem ele, aliás, não existiria sequer o "Jornal Dobrabil" de Glauco Mattoso.
Todo jornalista em atividade no Rio tem sua história com o "JB"; eu tenho a minha.  Entrei lá em 1987 por obra e graça do escritor Sérgio Sant?Anna, que me indicou para substituí-lo numa página de comentários sobre TV, na Revista de Domingo, intitulada "Conversa ao Pé do Vídeo".  Fiquei ali durante dois anos, fazendo duas colunas por mês (revezando-me com Ingo Ostrovsky). Meus editores eram Alfredo Ribeiro e Joaquim Ferreira dos Santos.  Tempos pré-Internet, em que às vezes eu tinha de pegar um ônibus para levar as laudas datilografadas até o prédio do jornal.  Meu último texto publicado ali foi uma entrevista que fiz com Ariano Suassuna, em 2007.
O "JB" encerrou sua edição de papel. Procurei um exemplar em vão, no derradeiro dia, mas tinha esgotado.  Se o público viesse demonstrando tanto interesse assim, o jornal não teria acabado nunca.  Mas, ao contrário do "Diário da Noite" e da "Última Hora", o "JB" não morreu.  Sublimou-se!  Transcendeu-se!  Virtualizou-se: deixou de gastar papel mas continua vivo, nos pixels luminosos e coloridos de uma edição on-line.  E isto mostra as vantagens da Internet, amigos, que pode ajudar a extinguir os dinossauros de papel, mas também lhes proporciona um novo planeta, onde esses pesadíssimos e onerosos órgãos de imprensa veem-se metamorfoseados em criaturinhas mais ágeis, uma espécie de velociraptors céleres e dribladores.  Morreu o "JB"?  Não creio.  Passou da página para a tela, o que não é muito diferente de passar da lauda datilografada para a página em off-set.  Porque - e chegamos agora ao Q.E.D. desta conversa toda - jornalismo (como literatura) é texto.  Os jornais dos brasis agora têm como sobreviver, sem precisar de papel e tinta, porque o texto, este sim, não morre nunca.  O texto é uma alma imortal que a humanidade inventou para si própria.

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