O fracasso de um modelo

Por Roberto Andrade Estou observando com atenção algumas características muito interessantes destas eleições. Erraram quase todos que tentaram prognósticos sobre como se comportaria o …

Por Roberto Andrade

Estou observando com atenção algumas características muito interessantes destas eleições. Erraram quase todos que tentaram prognósticos sobre como se comportaria o eleitor a partir do advento do mensalão e do terremoto político que se seguiu.


As elites políticas conservadoras, carregadas de soberba e cegas nos seus erros de avaliação, estavam seguras que Lula sequer completaria seu mandato. Seria corrido pelo povo, numa repetição que lhes parecia lógica do arrastão cívico que defenestrou Fernando Collor e sua gang de Brasília.


Já a imprensa ficou nadando pela periferia da informação, esbanjando frases de efeito e apostando no que seria a maior crise política de todos os tempos. Confesso que também pratiquei em parte este erro.


Quase nenhum editorialista ou repórter aprofundou-se na interpretação de um novo quadro sociológico que se criava. Poucos analisaram como este turbilhão de fatos seria processado na cabeça do cidadão comum.


Agora a resposta veio de forma clara, indiscutível. O Instituto Datafolha divulgou uma pesquisa que impressiona. 76% dos eleitores entrevistados afirmaram que são "felizes" atualmente. E 44% deles acham que Lula é o candidato mais preparado para ser Presidente do Brasil.


A pesquisa, feita em 349 municípios com 7.724 pessoas, revelou ainda que 63% não sabem em quem vão votar para deputado federal e 60% para estadual. O quadro nos estados indica uma ampla vitória do PMDB, o partido do conchavo, do acerto fácil e da total infidelidade.


Lula afastou-se do PT, visitou todos os palanques, de evangélicos a usineiros, de sanguessugas a mensaleiros, sem nenhum constrangimento. Escapuliu dos debates e administrou com esperteza os bons frutos que colheu com o que chamamos de "estabilidade econômica" e "programas sociais".


Alckmin é o anti-novo e o anti-povo. Limpinho, asséptico, penteado e cheiroso demais para um país onde uma esmola de 100 reais por mês, batizada de bolsa-família, reelege um presidente. O ex-vice de Covas sequer conseguiu compreender a dimensão do que é administrar São Paulo. Quanto a Heloísa Helena e Cristovam Buarque, sem comentários.


O povo, agora, revelou-se. Mostrou a que veio. E, principalmente, está utilizando as mesmas artimanhas que aprendeu com esta péssima categoria de políticos que frequentou o imaginário do brasileiro e das páginas policiais nos últimos 20 anos. A impressão que fica é que o eleitor vai aplicar a Lei de Gérson e defender exclusivamente seu próprio interesse.


Este é o preço verdadeiro que temos a pagar pela arrogância, pela prepotência e pela permanente visão corporativa das elites brasileiras. Enquanto estiveram ao lado do poder, usufruindo das benesses permanentes dos que se agregam à gestão pública, nada construíram de sólido em termos políticos.


Em nenhum momento houve uma preocupação efetiva de construir um ambiente de inteligência, com projetos políticos modernos, honestos, voltados à preparação do Brasil para os grandes desafios do novo milênio. Discutiu-se à exaustão e em tom pequeno o periférico, sempre com discursos levianos em "defesa" da democracia e do interesse público.


É triste a realidade que temos pela frente. O resultado desta eleição vai servir de exemplo para as classes dominantes brasileiras. Resta esperar que deste quadro político esquizofrênico resulte um debate que permita o surgimento de novos líderes e, principalmente, de forças políticas mais qualificadas. O Brasil merece.

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