Uma grande mentira

Por Gabriel Bocorny Guidotti Abro o jornal e leio: Petrobras lucra bilhões. É muito bom viver em um país onde as instituições públicas funcionam …

Por Gabriel Bocorny Guidotti
Abro o jornal e leio: Petrobras lucra bilhões. É muito bom viver em um país onde as instituições públicas funcionam com máxima eficiência. O cidadão não precisa se incomodar com os dramas da política. Eventualmente eles acontecem, mas para decidir qual é o melhor partido em atividade. As campanhas são limpas e inclusivas. Não existe, para os eleitos, promessa sem cumprimento. Pátria amada, Brasil.
Há quem diga que existem várias realidades possíveis. Em uma eu seria um ricaço excêntrico. Em outra, um indigente miserável. Eu poderia nem existir. Com o país seria o mesmo. Pessimistas apontam que uma linhagem alternativa do tempo nos alçaria ao mais alto espectro da corrupção. Dinheiro público sendo desviado às ganhas para atender interesses particulares de pessoas inescrupulosas. Prefiro não pensar nisso. Macular a imagem do "Brasil perfeito" é crime previsto no Código Penal.
No "Brasil perfeito", profissionais capacitados nascem na base, não nas universidades. O curso superior é apenas um adereço para o sucesso garantido. Nossas crianças recebem qualificados padrões de educação, numa escala reconhecida globalmente. Os Estados Unidos vieram estudar a radiologia de nosso ensino. Os americanos dizem que seus alunos andam alienados, distantes do mundo real. Os brasileiros, contudo, sabem seu lugar: ao lado do conhecimento.
Os serviços são um primor no país. Ônibus apresentam conforto incomparável. As pessoas chegam rápido em casa, não perdem tempo. Logo, não perdem qualidade de vida. As linhas de trem e metrô conectam diferentes estados e cidades. Avião é coisa rara, exceto para os turistas. O crescimento da economia é geométrico. A Inflação não faz nem cócegas. Gastar demais no supermercado é pleonasmo. Impossível sair de lá sem todos os itens necessários - pagando preços módicos.
A cultura nacional está incrustada na alma de cada brasileiro. Dizem que Pedro II reforçou o espírito patriota nos anos do Brasil imperial. Deve ter nascido daí a unidade. De Norte a Sul, o povo se ama. A identificação em hábitos e costumes é sensível. Não há divisão política ou econômica. Os entes da Federação recebem os mesmos direitos e deveres. Um equilíbrio perfeito. Uma engenharia divina presidencialista.
Em suma, a ética é a regra. A contravenção fica em segundo plano. Nossos presídios, entretanto, fazem seu trabalho. Recuperam seus cativos, reinserindo-os na sociedade. O governo tem programas sólidos que oferecem uma segunda chance. Com tantas oportunidades em vista, por que ainda há pessoas que têm a cara de pau de transgredir? Parece não reconhecer as maravilhas desse país.
Mas então, as linhas alternativas do templo se mesclam. Por algum motivo, sou transferido para outro lugar, um Brasil menos próspero. Leio o jornal e os escândalos vertem como água na torneira. O crime, a manipulação, está em todas as esferas de poder. Difícil é encontrar um pouquinho de honestidade, nos mínimos atos. Seja furando a fila, atravessando fora da faixa ou dando o troco errado. Aquele, agora, era meu mundo.
E permanecerá sendo, até meu último suspiro. Recomeçar não é possível. Começar a partir de agora, sim. O Brasil de hoje deixa a desejar. Dá vontade de fechar as malas e cruzar a fronteira. A cada campanha eleitoral, a esperança de um futuro melhor que jamais chega. Ilusão desvirtuada. Infelizmente, o "Brasil perfeito" é uma grande, uma enorme mentira.
Gabriel Bocorny Guidotti é bacharel em Direito e estudante de Jornalismo e tem o site http://gabrielguidotti.wordpress.com.
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