Como entender as manifestações e a insatisfação popular

Quando o IPO – Instituto Pesquisas de Opinião “bate a porta” dos gaúchos para questionar sobre as manifestações populares, que ocorrem desde 2013 até …

Quando o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião "bate a porta" dos gaúchos para questionar sobre as manifestações populares, que ocorrem desde 2013 até o momento, os argumentos centralizam-se na descrença e no ceticismo da população com a política e com os políticos. E este comportamento que indica a existência de uma aversão generalizada à corrupção e à desonestidade vem de longe e inclui inclusive, os que não vão as ruas.
A situação de descrédito tem sua origem na percepção de que a maioria dos políticos de posse de um mandato atuam em favorecimento de uma pequena parcela, não atendendo as principais demandas da maioria dos eleitores. Esta percepção de descrédito amplia-se no acompanhamento dos noticiários, onde amontoam-se denúncias e acusações por fraudes e irregularidades das mais diversas matizes.
A partir das desilusões acumuladas com o comportamento e as atitudes dos políticos, o imaginário social do eleitor atribui à política uma conotação negativa, onde os políticos são considerados "todos iguais". Nesse sentido, o argumento "não gosto de política" processa-se como uma forma do eleitor se isentar e manter-se afastado do mundo da política.
Cada novo escândalo de corrupção reforça a visão de que os políticos são todos iguais. E os partidos políticos, ao invés de ressaltarem suas diferenças, construindo sua própria identidade e se aprofundando em suas propostas de forma positiva, preferem desconstituir a imagem dos opositores, optam por uma construção da negação, alimentando como "numa bola de neve" essa idéia de que os políticos são todos iguais.
E é neste contexto da cultura política brasileira é que deve-se analisar as manifestações. Os gaúchos afirmam que são contra a corrupção e desejam "que os serviços públicos sejam minimamente feitos". A população verifica no seu dia-a-dia o aumento do custo de vida, a explosão da violência e o descaso das autoridades com os problemas cotidianos. Na percepção da população, não há melhoria na qualidade dos serviços em áreas como a saúde, educação, segurança e infraestrutura.
As manifestações representam "um copo de água cheio" de uma cultura política de descrença. Não devem ser analisadas por um único motivo, nem contra um único partido ou governante. As manifestações refletem a insatisfação com as práticas permissivas que incomodam e prejudicam a população no seu cotidiano.
Passa pela interpretação de que o aumento da energia e dos combustíveis foi resultado do esquema de corrupção na Petrobrás e que este aumento resultará na ampliação do custo de vida, na volta da inflação. "A vida está pior em função da corrupção".
A insatisfação está ancorada na percepção de que, para a maioria, há uma luta constante pelos direitos mínimos. As dificuldades cotidianas para se conseguir uma consulta, se deslocar com segurança, ser bem atendido por um funcionário público, conseguir uma vaga na creche desmotivam a população que se sente "pedindo um favor". Estes se dizem atônitos quando assistem no noticiário o aumento de salários de servidores públicos, listas de benefícios que não condizem com a realidade da maioria ou com o momento político econômico do país.
Os relatos de insatisfação são inúmeros, expõem dilemas cotidianos, mas indicam uma visão única do eleitor: "como está não pode ficar". Os eleitores desejam uma quebra de paradigma, uma nova forma de governar. Onde a honestidade seja a bandeira e o comprometimento a meta.
Por princípio básico, o objetivo da democracia seria alcançar o bem comum, a igualdade econômica, política e social. As manifestações indicam que este objetivo básico deve voltar ao foco da tripartição de poderes.

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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