As gerações mais preparadas podem ser a gerações mais despreparadas!

As gerações Y e Z, que podem ser consideradas como as gerações mais preparadas em termos de tecnologia e informação, podem ser enquadradas como …

As gerações Y e Z, que podem ser consideradas como as gerações mais preparadas em termos de tecnologia e informação, podem ser enquadradas como as gerações mais despreparadas em termos de consciência, participação política e sentimento de comunidade.
Esta análise procura sistematizar alguns elementos extraídos de diferentes pesquisas quantitativas e qualitativas realizadas pelo IPO - Instituto Pesquisas de Opinião, focadas no comportamento da juventude gaúcha, com menos de 35 anos.
Estas gerações desenvolveram-se numa época de grandes avanços tecnológicos, ampliação das oportunidades na área da educação, estabilidade e prosperidade econômica, sem experimentação do conceito de "inflação" e sem noção prática do significado de recessão econômica.
Possuem acesso aos mais variados bens materiais e de consumo duráveis e usufruem de um mix variado de alimentação, diferentemente da origem e desenvolvimento de seus antepassados.
Cresceram estimulados por atividades lúdicas diversas e contato com os meios de comunicação de massa. Acompanham a evolução do mundo digital e suas famílias procuram poupá-los do trabalho "braçal" e de situações desconfortáveis ou decepções no cotidiano educacional e profissional. No campo educacional visam a convivência com os colegas, o aumento da rede social e acreditam que o que importa é o "diploma", sendo que o mesmo pode ser conquistado com "a realização de tantos testes quanto necessários".
No mundo do trabalho possuem di?culdade para exercer tarefas subalternas de início de carreira e lutam por salários mais "avantajados" desde o começo de sua jornada por possuir "sede" por desa?os e busca de constantes feedbacks. Não se espelham nos profissionais mais experientes do seu local de trabalho e avaliam que "não vale a pena seguir estes exemplos" por terem uma "outra visão do trabalho", sem ter claro a referência de profissional experiente e competente.
Como consumidores são exigentes, informados sobre os produtos e com peso na decisão de compra. Preferem realizar compras no mundo virtual, em detrimento da loja física. Compram por impulso ou por modismo, a partir de tendências ou de adequação a tribo que pertencem.
Quanto mais jovem, maior a familiaridade com o mundo digital, maior a tendência ao individualismo e a competição e menor a capacidade de relacionamento social com o mundo real das instituições sociais e representativas.
As pesquisas indicam que o acesso à tecnologia e a informação "alimenta" uma percepção de que o "mundo está na palma da mão", esta percepção propicia uma gama imensa de "informação fragmentada" que não subsidia uma capacidade de contextualização, uma visão holística e uma consciência política.
Estes jovens apresentam os maiores índices de ceticismo, não acreditam na política e nos políticos, não legitimam os sindicatos e as instituições representativas. Não confiam nas instituições e não percebem a utilidade na existência das mesmas.
O conceito de cidadania, para estas gerações, está associado a direitos e não a deveres. Em parte, este comportamento social está sendo "alimentado" pela percepção de que há muitos direitos, sem a consciência de que há deveres e de que o direito de um acaba, quando começa o do outro.
Seus sonhos estão atrelados a conquistas pessoais, a conquistas materiais. Estas gerações não se "sentem" ou se posicionam como agentes transformadores da sociedade, em busca de uma nova concepção de mundo. Esse fenômeno está associado as informações e a percepção de mundo que as instituições sociais (família, escola, igreja..) compartilharam sobre as instituições representativas. E no sentido contrário, também é estimulado pela imagem negativa que as instituições representativas transmitem as instituições sociais, através de seus agentes políticos.
O atual momento de crise econômica, política e social (que se caracteriza em uma crise de confiança nas instituições) será propicio para o despertar do potencial "hibernado" destas gerações, que diante de novos dilemas e, com a diminuição da proteção econômica de suas famílias, terão que se aventurar para ampliar seu papel no mundo educacional, otimizar sua contribuição no mundo do trabalho e, em especial, ocupar a sua tarefa de agente transformador da realidade que o circunda, para além do mundo virtual.

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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