Carnaval também é papo sério

Por Renato Dornelles

Chegou mais um carnaval. Participo desta que é a maior festa popular do país desde antes de entender os seus muitos significados. Lembro de pessoas fantasiadas, crianças em bailes infantis, adultos pelas ruas seguindo para salões, para os coretos de bairros ou para os desfiles oficiais de Porto Alegre na Avenida Borges de Medeiros. Ainda que tenham sido as primeiras e mais longevas lembranças, elas ainda estão bem presentes em minha memória.

Com isso, dá para perceber que o carnaval faz parte da minha vida bem antes de eu me tornar um jornalista e de me especializar na cobertura deste evento. Ao longo deste tempo todo, e já são quase seis décadas, aprendi variados significados do Reinado de Momo. É claro que um dos objetivos principais é a diversão, alegria, confraternização, tão necessária para pessoas que ao longo do ano passam perrengues, driblam crises, enfrentam dificuldades diversas.

Aliás, esse é um dos pontos a meu ver mais absurdamente polêmicos em torno do Carnaval. Ouço pessoas diversas manifestando-se a cada ano sob a alegação de que "os foliões deveriam trabalhar para enfrentar a crise, em vez de passar dias se divertindo". Dizem isso como se os foliões não fossem trabalhadores e não enfrentassem de frente crises as quais, em muitos casos, não foram os causadores, e não tivessem o direito à diversão.

Outra contradição é que os mesmos que reclamam do Carnaval participam, com todo o direito, de outros tipos de festejos ao longo do ano. Por fim, conheço muita gente que tem esse discurso, mas não abre mão de um feriadão (mesmo que não oficial) durante os quatro dias de festejos.

Mas saliento aqui que, além da alegria, o Carnaval é cultura, é consciência, é democracia. Basta observarmos os enredos das escolas de samba e as manifestações de foliões de blocos, que por sinal incomodam o conservadorismo. A democracia carnavalesca se faz presente não só nas letras de sambas e marchinhas, não só no conteúdo dos temas-enredos, nas faixas e cartazes exibidos nos blocos, mas também por ser uma festa marcada pela diversidade. 

Mas é importante também destacar que, embora muitos confundam a democracia e a liberdade com a ausência de limites, estes existem no dia a dia e continuam existindo durante os festejos. Principalmente no que diz respeito ao assédio. O respeito é fundamental. Nunca é demais lembrar, principalmente aos homens: "não é não", certo? Fique longe deste B.O. E eventuais vítimas não se intimidem a denunciar. 

Bom Carnaval para os que curtem, bom descanso para os que preferem ficar em locais mais sossegados, bom trabalho para os que tenham ou optem por desempenhar suas funções profissionais nestes dias.

Autor
Jornalista, escritor, roteirista, produtor, sócio-diretor da editora/produtora Falange Produções, é formado em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) (1986), com especialização em Cinema e Linguagem Audiovisual pela Universidade Estácio de Sá (2021). No Jornalismo, durante 33 anos atuou como repórter, editor e colunista, tendo recebido cerca de 40 prêmios. No Audiovisual, nos últimos 10 anos atuou em funções de codireção, roteiro e produção. Codirigiu e roteirizou os premiados documentários em longa-metragem 'Central - O Poder das Facções no Maior Presídio do Brasil' e 'Olha Pra Elas', e as séries de TV documentais 'Retratos do Cárcere' e 'Violadas e Segregadas'. Na Literatura, é autor dos livros 'Falange Gaúcha', 'A Cor da Esperança' e, em parceria com Tatiana Sager, 'Paz nas Prisões, Guerra nas Ruas'. E-mail para contato: [email protected]

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