Wianey Carlet: Fominha por falar e escrever

Apaixonado pelo que faz, ele não hesita em dizer que atuaria com o mesmo prazer em qualquer área que não fosse o esporte

Wianey Carlet - Reprodução

O garoto que nunca jogou futebol tornou-se um reconhecido jornalista esportivo. É um paradoxo, mas Wianey Carlet foi uma criança que passou longe de qualquer esporte com bola, e hoje, antes de ter qualquer vocação ou paixão por futebol ou coisa do gênero, ele garante que gosta, mesmo, é do jornalismo, de fazer rádio. "O esporte entrou como em um teste de múltipla escolha", ele diz. "No começo, havia vaga disponível para trabalhar neste setor. Entrei e fiquei." E, seguro de sua opinião, como sempre quando está ao microfone ou na frente do computador, assegura: "Mas, se fosse atuar em qualquer outra editoria ? polícia, política ou economia ? , eu me atrevo a dizer que o resultado seria o mesmo".

Wianey Carlet entra neste detalhamento pelo fato de o futebol só ter entrado em sua vida muito tarde, quando já era adulto. "Li, escutei, observei e aprendi algumas coisinhas sobre este esporte. Me envolvi e gostei. O futebol é um esporte fascinante. Mas política, por exemplo, também é", afirma. Curioso, como todo jornalista, Wianey gosta de descobrir as coisas vivenciando-as. Sua paixão pela política fez com que se candidatasse a vereador de Porto Alegre nas eleições de 1992. "Eu embarquei pra ver como era? e descobri coisas que me deixaram muito aborrecido." Ele concorreu pelo PMDB e ficou de suplente. Em 1994 foi chamado para assumir o cargo por alguns dias. Com facilidade para falar e escrever, discursou na Tribuna como nenhum outro, nos poucos dias em que foi vereador.

Aos 58 anos, já atuou em seis Copas do Mundo: Argentina (1978), Espanha (1982), México (1986), Itália (1990), Estados Unidos (1994) e França (1998). Começou aos 21 anos na Rádio Sideral, em Getúlio Vargas, passando pela Rádio Erechim, Rádio Difusora (atual Rádio Bandeirantes), Rádio Gaúcha, Rádio Sucesso e Rádio Guaíba. Hoje, de volta ao Grupo RBS, Wianey é comentarista da Rádio Gaúcha e colunista do jornal Zero Hora. O profissional também narra jogos e mantém um blog, campeão em número de acessos, no zerohora.com.

Trabalho, caráter, esforço, responsabilidade e disciplina são valores que guiam a trajetória do jornalista provisionado. "O melhor é o mínimo que eu procuro sempre", enfatiza Wianey, ao mesmo tempo em que reconhece o seu grande defeito: "Sou pavio curto. Aliás, eu acho que eu nem tenho pavio".

Natural de Três Passos, João Wianey Carlet nasceu em 16 de julho de 1949. Casado há 30 anos com Marisa, tem duas filhas: Carolina, 22 anos, e Camila, 19. A mais velha está se formando em Psicopedagogia. Eles moram em Viamão. "Nas horas de folga eu leio, vejo televisão, crio galinhas e patos? tenho uma casa com terreno relativamente grande que tem até mata nativa. Lá eu fiz um laguinho e uma "muralha da China", pra ficar bem seguro. Lá é o meu refúgio."

O ingresso na rádio

Começou a atuar profissionalmente na área da comunicação em 1970, na Rádio Sideral, em Getúlio Vargas. Ingressou através de um teste, concorrendo com profissionais de toda a região. "E me orgulho muito disso, porque eu nunca tinha chegado perto de um microfone", confessa. "Lá eu fazia de tudo, como em toda rádio do Interior. Por isso que é uma boa escola". Permaneceu na emissora durante dois anos e depois foi para a Rádio Erechim, onde atuou por pouco mais de um ano. "Não gostei de morar sozinho e voltei pra casa", diverte-se Wianey. Como naquele momento a Rádio Sideral não tinha vaga, Wianey foi trabalhar em contabilidade. Mas algum tempo depois conseguiu retomar a vaga.

Logo em seguida, seu pai resolveu vender os negócios que tinha na cidade e se mudar para o Paraná. "Meu pai era muito cigano. Já tinha saído de Três Passos, já tinha morado em Getúlio Vargas, em Frederico Westphalen, girava o mundo", relembra. Foi então que, em 1973, Wianey optou por tentar a vida na Capital gaúcha. "Vim pra Porto Alegre, com uma mão na frente e outra atrás", conta. Não demorou muito e ele começou a trabalhar como locutor e redator de notícias na extinta Rádio Cultura. Morava numa pensão na Avenida Independência, com um amigo de Getúlio Vargas, o Gerson Pavinato, que fazia o programa "Dona da noite", na Rádio Itaí. O colega conquistou uma vaga na Rádio Difusora ? hoje Rádio Bandeirantes ?, e avisou Wianey que a emissora estava contratando um noticiarista. "E daí eu disse: é comigo, vamos lá. Eu "tava louco" pra voltar a fazer rádio". Mas a vaga fora preenchida no dia anterior.

Quando estava indo embora da Difusora, passou pelo Departamento de Esportes e deu um jeito de ser apresentado a Flávio Dutra, na época produtor do programa de esportes. Para garantir a oportunidade, Wianey apostou num gesto de ousadia, dizendo: "Eu faço tudo em esporte: sou narrador, sou comentarista, sou repórter, sou redator? ? e eu não era nada", diverte-se o profissional. "E o Flávio gostou, pois eu era do Interior, e o pessoal do Interior sempre está disposto a trabalhar", acredita o comunicador, que na mesma hora fez um teste e, aprovado, foi admitido pela Rádio Difusora. Ele, que não entendia absolutamente nada de futebol, começou sua carreira no esporte, em 1974, fazendo setor do Internacional. "Nunca tinha tido contato com futebol. Eu não sabia regras, nunca joguei futebol na minha vida", garante o comentarista.

Sobre a paixão nacional

"Já disse um trilhão de vezes e ninguém acredita, portanto vou dizer mais uma vez: eu não tive futebol na minha infância. Na minha casa não se ouvia futebol. Eu não tive nenhuma influência, então não desenvolvi paixão por clube nenhum", justifica. A primeira vez que Wianey assistiu a um jogo de futebol foi em Porto Alegre, num Gre-nal, pouco antes de começar na Difusora. "Só fui porque meus amigos me arrastaram! Eu pensei: eu não vou ficar uma tarde inteira sentado num cimento, no sol."

Assim, foi ser setorista no Internacional pela Rádio Difusora, foi obrigado a correr atrás do prejuízo, ou seja, aprender tudo sobre o mundo do esporte e, em especial, sobre futebol. Para isso contou com a ajuda de Valdomiro Vaz Franco, jogador do time colorado, que ensinou regras e deu dicas ao futuro jornalista esportivo. "Uma alma generosa, muito simples, muito humilde, uma pessoa fantástica. Ele me dizia assim: "Wianey, entrevista o Claudiomiro, que tá machucado. Pergunta se ele vai poder jogar domingo?". Eu não tinha a menor noção", confessa.

Depois disso, a carreira na área do jornalismo esportivo engrenou. Saindo da Rádio Difusora, Wianey teve passagens pelas rádios Gaúcha, Sucesso e Guaíba. "Na Guaíba eu comecei a diversificar um pouco, pra não ficar só no esporte, comecei a fazer programa jornalístico, ganhei prêmios ? Prêmio ARI, Prêmio Direitos Humanos. E assim estou enganando até hoje", brinca. Em 1994 voltou para a Gaúcha, onde está até hoje.

Distante do rádio e do futebol

Quando criança, Wianey nunca teve uma bola de futebol. Suas diversões eram outras: bicicleta, carrinho de rolimã, jipe. Bola, não. A admiração pelo pai é evidente. "Não sobrava muito tempo pra brincar, porque eu sempre ajudei meu pai. Ele era marceneiro, um artista na madeira, fazia um monte de coisas legais. Construía uns jipes grandes de pedal, fazia coisas maravilhosas esculpidas na madeira. Hoje ele seria considerado um artista, um escultor."

Enquanto os outros meninos jogavam futebol, Wianey estava sempre envolvido com as atividades da escola. Apresentava discursos nas solenidades de datas comemorativas, organizava a programação e fazia o roteiro. "Quando o Grêmio ou Inter jogavam em Erechim ou Passo Fundo, pra mim era torturante, porque os meus amigos todos organizavam caravanas pra ir ver o jogo e eu ficava sozinho. Isso me aborrecia, tornava-se um domingo chato, vazio.", relembra. "O meu negócio era outro, era grêmio estudantil, atividades literárias, era disso que eu gostava." O gosto pela literatura já era um indicativo da paixão que surgiria pelo jornalismo.

Lembranças...

Wianey nunca se esqueceu da primeira vez que teve contato com o futebol, na final da Copa do Mundo de 1958, entre Brasil e Suécia. "Certo domingo, dia de churrasco em família, meu pai acendeu o fogo, pegou um rádio Telefunkem gigantesco e instalou perto da churrasqueira. Eu achei aquele negócio meio estranho, "o pai nunca trouxe rádio pra cá", pensei, aí puxou fio, extensão e ligou aquela porcaria, com um som cheio de ruídos? e eu não entendia o que o cara falava? Daí perguntei pro meu pai: "vem cá, o que é esse troço aí, hein?!", daí o meu pai me respondeu: é um jogo de futebol, o Brasil vai ser campeão do mundo!"

Esta foi a primeira vez que o jornalista esportivo escutou um jogo de futebol. "Depois, mais tarde, é que eu fui saber que aquele jogo que o meu pai estava escutando era aquela decisão, aquele fato histórico que motivou até ele, que não era chegado em futebol, a escutar", constata.

A rotina de Wianey no trabalho se divide entre atuação na Rádio Gaúcha, onde narra e comenta jogos, coluna em Zero Hora e atualização do blog. "Eu já tenho 58 anos e poderia me aposentar, pois já tenho mais de 40 anos de trabalho, mas alguma coisa não me deixa. Algo me impede de fazer isso. E, nessa idade, as pessoas geralmente começam a diminuir o ritmo. Eu estou aumentando o meu", comemora o comunicador.

Sempre que chega dos jogos, por mais tarde que seja, vai direto para o computador atualizar o blog. "As pessoas vão acordar de manhã e vão querer saber como foi o jogo. Eu mantenho o blog muito ativo, e o internauta quer isso mesmo, então tem que estar sempre atualizando", explica Wianey sobre a ferramenta que permite publicar seus comentários a todo momento. "E, modéstia à parte, o meu blog tem sido campeão de acessos entre todos os blogs da RBS. Dá muito trabalho, mas é um prazer que eu tenho. Escrevo em casa, escrevo aqui, em todo lugar, estou sempre escrevendo. Se eu tenho uma idéia, eu vou lá e posto. É muito bom esse contato com as pessoas, dá um retorno imediato. E eu tenho liberdade, escrevo sobre o que eu quiser", salienta.

Lugares... uma história marcante

Wianey é um profissional que teve oportunidade de viajar por muitos países, acompanhando a seleção brasileira e os clubes do Estado. "E assim eu conheci todos os continentes do mundo. Eu estive em muitos lugares fantásticos e históricos. Eu me organizava de maneira a poder atender às necessidades profissionais? dormir e comer eu não fazia durante o tempo que sobrava. Eu fui a todos os lugares possíveis nestas viagens que fiz profissionalmente", diz. E alinha os locais mais apaixonantes: Pequim, na China; Casa Blanca, em Marrocos; Roma, na Itália; Moscou, na Rússia; Áustria; Cingapura, "um lugar lindíssimo";  e Paris, "apaixonante".

Um episódio que marcou muito a trajetória do profissional aconteceu em 1985, quando trabalhava na Rádio Guaíba. "Fui para o México para fazer um acompanhamento de como estavam os preparativos para a Copa de 1986 e quando eu desembarquei na Cidade do México, no dia 19 de setembro, tinha havido um terremoto violentíssimo. O que era pra ser uma viagem de cobertura esportiva se transformou na cobertura de uma grande tragédia. "Comecei a visitar os lugares e entrevistar pessoas num bairro chamado Tlatelolco, onde havia duas torres gigantescas de apartamentos e uma tinha vindo abaixo. Milhares de pessoas morreram. Lá fui eu com gravador e máquina fotográfica. De longe, eu vi uma aglomeração de pessoas ao redor dos escombros. À medida que fui me aproximando, comecei a ouvir um canto? e aí quando eu cheguei perto, foi uma coisa impossível de se imaginar: Plácido Domingo, que tinha parentes que moravam naquela torre, estava ali, ajudando e dando conforto para os familiares das vítimas. E uma das maneiras que tinha encontrado para fazer isso era cantar pras pessoas. Era um momento de arte, apesar de toda a dor. É uma coisa que me emociona até hoje só de lembrar. Foi um dos momentos mais importantes da minha vida profissional", relembra.

Novos horizontes

Ele mesmo diz que já fez tanta coisa nessa profissão que é difícil imaginar algo que não tenha feito. Mas eu quero fazer mais coisas? eu já fiz seis Copas do Mundo, e quero fazer a sétima. O blog, por exemplo, é uma novidade, e se pintar outro tipo de mídia pode acreditar que eu estou na fila", garante Wianey. Entre os planos para o futuro, está fazer o curso de Direito. Até alguns anos atrás, ele era jurado espontâneo do Tribunal do Júri em Porto Alegre. "Eu tenho verdadeira adoração por Direito criminal. Mas como eu estou aumentando meu ritmo de trabalho, tem me sobrado cada vez menos tempo. Quem sabe em 2009, pois eu tenho que me preparar minimamente pra fazer o vestibular", argumenta.

Wianey considera que existe muita fantasia em torno da atividade jornalística. "É uma profissão fascinante, mas que dá um trabalho danado se você não transpirar muito. Eu digo para todos os meus colegas mais jovens: não adianta querer queimar etapas, não adianta puxar tapete de colega. Tudo isso resulta em absolutamente nada na consolidação de uma carreira. Procurar dar sempre o melhor de si, porque se tiver talento, dedicação e caráter, em algum momento alguém vai perceber. Então, tem que trabalhar sem fazer uso de artifícios para avançar porque se você trabalhar mesmo, e tiver talento, é inevitável? em algum momento você vai ser reconhecido. E assim se faz uma carreira sólida", aconselha o profissional.

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