Fernando Ernesto Corrêa: Gestor por necessidade

Um dos acionistas do Grupo RBS, o jornalista Fernando Ernesto Corrêa relembra a carreira na comunicação

Pode-se dizer que Fernando Ernesto Corrêa praticamente nasceu dentro de uma redação. Filho da dona de casa Maria Isabel e do jornalista e economista Ernesto Corrêa - figura lendária no Jornalismo gaúcho, e que durante muito tempo dirigiu o Diário de Notícias-, veio ao mundo pelas mães de uma parteira no último andar do prédio que o jornal ocupava, na Praça da Alfândega. Consequentemente, a trajetória profissional não poderia deixar de passar pelo Jornalismo. Hoje, é codiretor do Campos Advogados Associados e membro do Conselho de Acionistas do Grupo RBS, organização da qual é detentor de 8% das ações.
De repórter a vice-presidente do Conselho Administrativo do Grupo RBS, garante que, das atividades que desempenhou, a mais prazerosa foi a produção de matérias. "Sou jornalista por natureza, tenho instinto jornalístico, é algo hereditário. Acabei sendo gestor por necessidade, mas por vocação eu atuaria sempre na área editorial. Alguém tem que cuidar da área administrativa, da comercial, alguém tem que vender, mas o objetivo é transmitir uma boa informação. O coração dos veículos é o conteúdo", ressalta.
O pai dirigiu, por 43 anos, a redação do Diário de Notícias - principal concorrente do Correio do Povo nas décadas de 50 e 60 - e foi lá que Fernando Ernesto iniciou a carreira na Comunicação, aos 18 anos, como repórter na editoria de Geral, posição que manteve durante os cinco anos do curso de Direito. Formado, tentou ingressar na advocacia, mas as dificuldades financeiras de iniciante na carreira o trouxeram de volta ao jornal.
Foi comentarista esportivo da Rádio Gaúcha e da TV Gaúcha e, mais tarde, passou a advogar pelas emissoras. Participou do processo de compra de Zero Hora, que garantiu a Maurício Sirotsky Sobrinho e Jayme Sirotsky o controle sobre o impresso e o tornou sócio no negócio. A transação culminou na fundação do Grupo RBS, no qual ele atuou na área institucional, administrando as relações da empresa com o setor público. Integrou o quadro de membros de diversas entidades da área de comunicação e foi presidente da Associação Gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão (Agert), e vice-presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).
Desafios e realizações
De toda a trajetória, dois acontecimentos são relembrados com carinho e orgulho. O primeiro, na RBS, foi ter concretizado a Rede Regional de Televisão, na década de 1970. Até aquele momento, as emissoras de TV Gaúcha e Piratini tinham estações geradoras em Porto Alegre e apenas retransmissoras no Interior. Implantado primeiramente no Rio Grande do Sul e após em Santa Catarina, o modelo, pioneiro no Brasil e idealizado por Maurício Sirotsky, foi executado por Fernando Ernesto e possibilitou aos telespectadores dos demais municípios do Estado acesso a noticiários, informações de lazer e de entretenimento específicas da região. "Não fazia sentido levar certas informações de Porto Alegre a Santa Rosa e, a partir daí, cada região passou a ter a sua participação no processo de comunicação", destaca.
Outro momento bastante marcante foi a oportunidade de trabalhar junto à Assembleia Nacional Constituinte, em 1988, da qual participou ativamente, representando o segmento de comunicação de todo o País. "A responsabilidade era muito grande, porque, dependendo do que fosse aprovado para a Constituição, poderia mudar a Comunicação Social brasileira completamente", ressalta.
Fernando Ernesto rememora, ainda, a existência de uma grande divisão na comissão temática da qual fazia parte, uma vez que, segundo narra, uma parcela significativa dos participantes defendia uma comunicação praticamente estatal, com mecanismos de controle dos veículos. O embate foi tão grande que o grupo não chegou a um consenso e o texto acabou sendo aprovado somente em plenário. O episódio é lembrado por ele como uma vitória da liberdade de expressão, tendo em vista a inclusão de dispositivo que impede a censura de qualquer natureza e a criação de leis que possam estabelecê-la. "Nós lutamos para que os meios ficassem prevalentemente no setor privado e conseguimos estabelecer um texto bastante favorável", avalia.
"O homem que eu queria ser"
Fernando Ernesto diz que não é de guardar elogios e traz como marca a dedicação aos trabalhos que realiza. Qualidade que, segundo ele, é irmã de seu maior defeito: a contundência. Movido pelo entusiasmo, ele acredita que, às vezes, torna-se inconveniente. Foi assim que foi expulso do gabinete do então ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães (1985-1990). "Eu argumentava com ele com tanta veemência, que ele entendeu que eu estava sendo desrespeitoso e disse: "ponha-se daqui para fora"", relembra. Ele esclarece que tem tendência a aumentar o tom de voz, em razão de ter perdido 30% da audição na adolescência, quando os riscos do excesso de antibiótico ainda eram desconhecidos.
Na parede do escritório de advocacia, dois quadros se destacam bem atrás da mesa principal. Neles estão impressas as imagens do amigo Maurício Sirotsky Sobrinho e do pai, Ernesto Corrêa, ambas inspirações no campo profissional e pessoal. "Tudo o que faço, penso antes como eles fariam", revela.
As capacidades empreendedora e de relacionamento humano de Maurício foram características muito admiradas por ele durante o período de convivência (1965-1986). Do pai, falecido em 1978, guarda na lembrança a rigidez moral e ética, o gosto pela leitura e a personalidade culta. Essas particularidades de cada um influenciaram os atos de Fernando Ernesto. "Em toda a minha vida, tentei agregar as qualidades de um e de outro como se formasse um homem ideal, um homem que não existe. Era aquele homem que eu queria ser, mas não consegui", desabafa.
Gremista doente, corredor compulsivo
Fernando Ernesto confessa que gosta muito de futebol, a ponto de se dizer "doente" pelo Grêmio Football Porto-alegrense. É, inclusive, conselheiro do time e compartilha a paixão com os quatro filhos. A esposa, no entanto, é colorada. "Ela é torcedora e eu, sofredor", conta.
Na rotina, além do trabalho no escritório de advocacia, ouve rádio, lê jornais - eventualmente revistas - e corre cerca de 50 quilômetros por semana. A atividade, praticada há 40 anos, tornou-se uma compulsão, tanto que o impacto do exercício provocou desgaste na coluna, que atualmente lhe rende sessões de fisioterapia e hidroterapia. Fora isso, afirma que tem uma "saúde de guri" e que faz tudo para manter-se em condições de correr.
No campo musical, aprecia boleros e as canções de Lupicínio Rodrigues. Os livros preferidos são policiais, biografias e alguns de filosofia. É na ciência do saber que está uma de suas três frustrações: não ser filósofo. "Queria conhecer Filosofia, conviver com esses pensadores todos, Nietzsche, Aristóteles, Platão, Descartes?" As outras duas desilusões? Não ser fluente em inglês e não tocar piano.
Em família
"Sou casado com uma mulher moça", comenta, referindo-se à esposa, Silvana Porto Corrêa, cerca de 25 anos mais jovem. E completa, enfático como em quase tudo: "Minha mulher é linda, é um mulherão". Casado há duas décadas, ele garante que a diferença de idade não é um problema. "Temos uma ótima relação, nos damos muito bem e nos amamos profundamente. Compreendo que, ao longo do nosso relacionamento, eu rejuvenesci um pouco e ela amadureceu um pouco. Assim, atingimos um equilíbrio", acredita.
Pai de Geraldo (presidente da plataforma de agronegócio da RBS), 51 anos; Fernando Filho, 47; Laura, 43 - os três do primeiro matrimônio -; e Ramiro, 16 - do segundo casamento -, diz que seu objetivo, hoje, é ver o caçula formado. Em qual profissão, Fernando Ernesto ainda não sabe, mas pressente que o filho irá seguir pela área de Humanas, portanto, Jornalismo, Publicidade e Direito são prováveis opções. "Sinto que ele tem uma veia artística, é muito criativo em suas redações e, além disso, tem a influência do pai, do avô, dos tios (Flávio Corrêa, o Faveco, e Paulo Sérgio Corrêa, o Paloca), e do irmão Geraldo", comenta.
Aos 75 anos, crê que ser pai de um adolescente pode ser complicado, pois, às vezes, se sente mais na condição de avô. Por isso, faz questão de participar da criação do filho, estar próximo e praticar atividades em conjunto, como tênis, boliche e caminhadas. "Tenho a absoluta certeza que vou morrer um dia. Não sei por que tenho essa convicção, mas eu tenho", brinca. "Mas quero prolongar isso o bastante para poder vê-lo formado e encaminhado na vida", afirma.
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