Ney Silveira: Empreendedor atleta

Publicitário e jornalista, descobre uma nova motivação com a carreira de lojista

É num escritório organizado e aconchegante, de um prédio na Rua Vicente da Fontoura, que o publicitário e jornalista Ney Thadeu da Silveira relata os fatos e as curiosidades da sua vida pessoal e profissional. Acreditando que uma mesa desorganizada é como uma vida em confusão, Ney explica que de santo, ele tem o segundo nome, fruto de uma promessa de sua mãe: por três anos, a dona de casa Edite da Silveira tentou engravidar sem sucesso. Até que no dia 1º de agosto de 1943, nasceu o primeiro de seus cinco filhos, que recebeu o primeiro nome do pai, Ney Azambuja Silveira, e o segundo, de Thadeu. "Foi uma homenagem e agradecimento ao santo das causas impossíveis, São Judas Thadeu", explica o primogênito.

Ele se considera um leonino orgulhoso, organizado e decidido. Já na época de escola, em Cachoeira do Sul, teve os primeiros sinais da visão empreendedora que o acompanha pela vida. "Eu recordo que uma das atividades de aula era construir caixinhas de madeira com serra manual. Quando construí a minha primeira, fiquei pensando como é que poderia fazê-las em escala industrial para vender".

O tempo passou e, em 1968, o jovem formou-se em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), mas seu lado empreendedor o levou a atuar em outra área. Ele lembra que sempre gostou de escrever, porém achava que deveria ter uma atividade que combinasse a criatividade com o universo empresarial. Na época, já tinha duas filhas e visualizou na propaganda uma oportunidade de trabalhar estas duas opções e ainda ser melhor remunerado do que no Jornalismo.
Operador de agência

Completamente feliz sendo o que chama de "operador de agência", iniciou sua carreira na extinta MPM Propaganda, em 1971, na área de atendimento. Saiu de lá 10 anos depois para abrir sua própria agência, que, no início, se chamava Ney Silveira e Associados, hoje Quality Comunicação. "Teve um determinado período em que era a quinta agência com melhor faturamento em Porto Alegre", revela. Chegou a ter filiais em Brasília e em São Paulo, e, como alguns contratos foram se extinguindo, foi levado a planejar um recolhimento. Acreditava que não teria mais disposição de ir ao mercado disputar contas com outras agências de pessoas mais jovens, com outros objetivos. "Eu fui encolhendo a Quality, e hoje ela é um empresa pequeníssima, mas as receitas pagam as despesas."

Com esta atitude, diz que foi se aquietando, começou a ter algumas incursões em projetos culturais e, desde novembro de 2009, virou lojista, com a abertura de uma boutique de papéis finos no Shopping Moinhos de Vento, a Papel Kraft. O negócio deu tão certo que ele está com contrato fechado para abrir mais duas lojas em Porto Alegre, uma no Barra Shopping e outra no Iguatemi.

Esta será uma atividade paralela com a qual Ney irá conviver por tempo indeterminado. "Sou muito perseverante. Tenho certeza que dará certo e que tudo isso vai conviver com as minhas incursões em projetos culturais e com a gestão da minha agenciazinha." Como uma pessoa de ritmo acelerado, o publicitário diz que não sabe - e não consegue - parar. "Será que eu não posso parar, porque se eu parar eu penso, e se eu pensar eu choro?", brinca.
Um anúncio

Ney recorda que quando entrou na MPM estava inquieto, trabalhando na sucursal do jornal O Globo e no cartório do pai. Ao ler um anúncio no Correio do Povo, decidiu correr atrás de seus objetivos. "Eu me autointitulo como um baixinho petulante, mas sou muito pertinente", diz. Enviou um currículo para a MPM e foi chamado para uma primeira entrevista com Flávio Fogaça, que depois o encaminhou para o diretor executivo da agência, Adão Juvenal de Souza, que o contratou. Quando saiu de lá, em 1981, abriu a Ney Silveira e Associados, em parceria com o atual diretor da Escala, Miguel de Lucca. A sociedade durou três anos, até ser convidado por Antônio Marcus Paim para trabalhar na Escala. Aceitou a proposta, com uma condição: "Que o Miguel fosse contratado junto comigo para o mesmo cargo". Imposição aceita, porém, como tinha o que chama de "bicho-carpinteiro", resolveu sair da agência após o período de um ano, e foi passar um tempo em São Paulo.

De volta a Porto Alegre, trabalhou na agência Módulo, com Rolf Poganski, que, segundo ele, tinha uma ideologia empresarial que conseguiu casar com sua parte de operador e empreendedor de agência de propaganda. Contrataram, então, Roberto Filomena, atual diretor da Matriz, e o diretor de arte uruguaio Ronin Papa. Com a equipe, conquistaram muitas contas e reconhecimento na agência.
De relho

Foi na Módulo que viveu uma de suas histórias inesquecíveis na propaganda, ao participar do desenvolvimento do comercial chamado "Perseguição", para a rede de lojas Manlec. A ideia do filme era de um caminhão da Manlec saindo da loja rumo à praia. Um cliente que queria enviar um produto para o Litoral perseguia o veículo, em um táxi, até alcançá-lo. Depois de realizado, o filme foi encaminhado para a RBSTV para ser finalizado e alguém da empresa acabou apagando o vídeo. Com isso, se gerou um transtorno na agência e na reunião que sucedeu o episódio, Ney teve de agir como um verdadeiro domador, pegando um relho e batendo na mesa para conseguir a atenção de todos e decidir o que deveria ser feito. O resultado foi a reprodução do filme e a conquista de um prêmio regional da Rede Globo.

Quando saiu da Módulo, em 1989, reencontrou o publicitário Lúcio Pacheco e, por sugestão dele, transformou a Ney Silveira e Associados em Quality Comunicação. "A agência teve uma história de ascensão interessante, e hoje eu vejo que, como empresário, fui impetuoso, sonhador e pretensioso, pois imaginei que poderia construir uma agência nacional sólida", diz, explicando que foi um período em que a empresa apresentou grande rentabilidade. A Quality se ramificou e teve escritórios em Porto Alegre, São Paulo e Brasília. "Neste período, o dinheiro passou pelas minhas mãos", revela, com orgulho. Hoje alega que, com o alto custo que os escritórios exigiam, precisou fechá-los, mantendo apenas a matriz em Porto Alegre.

Atualmente, a Quality atende a quatro contas de empresas, uma delas a Manlec, há quase 20 anos. "Eu brinco que os meus casamentos duraram menos que a minha relação com a Manlec", ressalta Ney, explicando que o casamento para se manter longo precisa de renovação das duas partes - e, no caso Manlec, foi muito mais disciplinado na relação. A cada ano que passa, ela se intensifica: "Hoje, eu tenho a maior vaidade de dizer que eu sou também um conselheiro da Manlec. Algo que eu fui adquirindo e a empresa foi entendendo e abrindo espaço para que eu exercitasse esta função de consultor, transcendendo completamente o tema da publicidade", diz.
Viciado em endorfina

Nos dias de folga, Ney diz que gosta de ir ao cinema, de sair para almoçar e jantar fora e de praticar esportes. As atividades, que o acompanham há muitos anos e são permanentes em sua vida, são as corridas e a musculação. "A corrida faz com que o corpo libere endorfina, que é uma droga que o corpo mesmo fabrica e eu sou meio viciado em endorfina, porque ela também diminui a minha ansiedade", confessa.

Já correu até 15 quilômetros na Maratona de São Silvestre, em São Paulo, e, atualmente, corre em rústicas de 9 a 10 quilômetros. "Acho que participar de maratonas é uma exigência muito grande, na qual é necessário separar um espaço da sua vida profissional para se dedicar a isso", acredita. Além do esporte, os filmes e livros policiais estão entre suas preferências. A prática da leitura, ele descobriu na adolescência, por influência de um tio que era professor e abriu sua biblioteca para o jovem. "Intelectualmente, gosto de tudo um pouco, pois tenho voracidade de informação."

Já o gosto musical foi mudando com o tempo e é, muitas vezes, influenciado pelos filhos. Ney tem filhos de duas gerações: Teniza, 40; Taís, 39; Tatiana, 37; Thiago, de 27, e Sofia, 15. Os filhos de Teniza, Lorenzo, 5 anos, e Martina, 2, estão acostumados com um avô moderno, que cuida da saúde e adapta seu tímpano com as músicas de cada geração. "Não me autointitulo um avô clássico, e neste caso, sou como um camaleão."
Daqui pra frente?

Para a próxima década, o publicitário quer dar continuidade a alguns projetos culturais, permanecer com a Quality em plena atividade e expandir a Papelaria Kraft. Para a vida pessoal, seu desejo é de continuar correndo, fazendo musculação e evoluindo. "Não pretendo me dar trégua tão cedo." E, lembrando Roberto Marinho, diz que pretende agir como ele, que, com quase 100 anos, mexia com projetos que levariam cerca de 10 anos para acontecer. "Mesmo que ele se cuidasse muito, tinha quase certeza que não estaria vivo para ver o resultado destes projetos, mas mesmo assim não esmorecia."

Realizado do ponto de vista profissional, Ney revela que está atravessando um período de satisfação nas atividades que exerce. "Estou vivendo um momento de maior felicidade na minha vida, pois já tive muitas angústias, muitas pretensões e, hoje, consigo enxergar até onde meu passo alcança." Seu lema de vida é viver do presente para frente sem obstinação, pois, como diz, "a nossa vontade não deve ter limites".
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