Jairo Jorge: Sou jornalista, estou prefeito

Com 30 anos de carreira, Jairo Jorge diz que a prefeitura de Canoas é uma missão temporária - a paixão está no Jornalismo

Jairo Jorge - Reprodução

Como ensinam os usos e costumes para quem exerce cargo público, o prefeito de Canoas, Jairo Jorge, é simpático ao estender a mão e oferecer um sorriso. Mas logo faz questão de esclarecer: apesar de o cenário da entrevista ser o Gabinete do Prefeito, a conversa não é com o político, mas com o jornalista. Aos 48 anos e com uma sólida carreira, traçada em grande parte na televisão, Jairo Jorge acredita que as escolhas e os caminhos trilhados ocorrem ao natural. Atrás do óculos de grau, é possível enxergar os olhos brilharem quando lembra da trajetória no Jornalismo. Voltar para a Comunicação? Claro, mas só depois de cumprir com o que chama de missão temporária - a gestão pública.

Para alguém comedido até mesmo nas palavras, pode levar algum tempo para que se sinta à vontade. E quando isso acontece, a conversa torna-se recheada de sorrisos e brincadeiras, que aparecem entre uma lembrança e outra. Com pouco mais de 30 anos de carreira, memória não lhe falta quando resgata fatos lá de trás. E ao falar em passado, ele volta para quando tinha apenas sete anos: "Consigo lembrar bem de quando comecei a ler. Meus pais não tinham acesso a muitos livros, então a primeira coisa que peguei para ler foi o Correio do Povo, embaixo de uma parreira".

Escolher a profissão, na adolescência, após um breve sonho de ser astronauta - como todo menino na década de 1970 -, não foi uma decisão imediata. Médico, pesquisador, biólogo, cientista e até padre, tudo isso já quis "ser quando crescer". Jovem, encontrou no Jornalismo a maneira mais certeira de ajudar a sociedade que vivia sob a ditadura militar. Aliás, a única certeza que tinha era de trabalhar com algo que pudesse contribuir com o próximo. "Sempre acreditei que o jornalista, além de contar e registrar histórias, deve ajudar a ultrapassar certas muralhas, como foi esta da ditadura, difundir uma consciência crítica e passar para as pessoas um senso de cidadania e responsabilidade", reflete.

Experiências de um político

Na adolescência, grêmio estudantil e Juventude Operária Católica foram ambientes que permitiram que ele se expressasse e lutasse por aquilo que acreditava. Quando acadêmico, também teve a oportunidade de defender temas polêmicos. No início da década de 1980, na antiga TV Educativa, hoje TVE, emissora onde trabalhou por 14 anos, produziu e apresentou o programa Quinzumba, ao lado de colegas universitários. "Foram momentos muito importantes. Trabalhar na TV Educativa foi uma experiência muito rica, onde pude exercer diversas funções - entre assistente, produtor, técnico, repórter e apresentador - e atuar com grandes nomes do Jornalismo", recorda.

Outro destaque deste período foi uma série de documentários chamada 'Menor, questão maior'. Com reportagens que tratavam de diversas questões da criança e do adolescente, antes mesmo de se levar em conta o estatuto deles (ECA), Jairo Jorge recebeu Menção Honrosa no Prêmio ARI de Jornalismo, em 1988, e no ano seguinte a própria premiação. Os reconhecimentos não pararam por aí. Em 1992, veio uma distinção considerada especial: o Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo, com uma reportagem sobre extermínio de menores.

Mais tarde, já nos anos 2000, foi que começou a atuar de fato com Política. Integrante do Partido dos Trabalhadores (PT), trabalhou na comunicação durante a gestão de Olívio Dutra (1999 - 2003). Depois, também colaborou com a candidatura a governador de Tarso Genro, em 2002, coordenando toda a parte de TV da campanha. Com a derrota e a nomeação de Tarso como ministro da Educação, Jairo Jorge o acompanhou em Brasília, afastando-se um pouco das atividades jornalísticas. Retornou à profissão cinco anos depois, de volta a Porto Alegre, quando foi apresentar um programa de entrevistas na Ulbra TV, o Domínio Público. Cerca de dois anos depois, por dificuldade de agendas, abandonou a Comunicação e passou a dedicar-se, exclusivamente, ao cargo de prefeito de Canoas, função que assumiu em 2009.

Antes da prefeitura, porém, já havia trabalhado em atividade pública. No final da década de 1980, foi o vereador mais votado para a legislatura. Quatro anos mais tarde, o Jornalismo falou mais alto e ele decidiu terminar a faculdade e não concorrer à reeleição.

Experiências de um jornalista

Além do Jornal da Cidade, de Canoas, e da Rádio Universidade, locais onde atuou ainda enquanto estudante, Jairo Jorge acumula experiência como apresentador do programa Ciranda da Cidade, da Band RS, e na TV Guaíba. Nesta última, o jornalista protagonizou, por dois anos, um comentário diário no programa de Clóvis Duarte. "Era algo inovador, pois era uma espécie de crônica com críticas à política econômica e cotidiana. Tudo sob o olhar dos trabalhadores", explica.

Por volta de 1995, Porto Alegre havia ficado pequena para sua ambição - e Jairo Jorge foi fazer carreira no interior de São Paulo, em um jornal de Ribeirão Preto chamado A Notícia. No veículo, cresceu rapidamente e chegou a ser diretor de Jornalismo, além de ter participado de toda uma reforma gráfica do impresso. Foi também na capital paulista que viveu a oportunidade de presidir uma emissora: participou da fundação, montagem de estúdio e planejamento da grade de programação 24 horas do Canal Comunitário de São Paulo. Resultado? Tornou-se presidente do canal a cabo.

Não satisfeito com toda esta experiência, foi ser dono do próprio nariz. Montou uma produtora de TV especializada em programas infantis, como era de se esperar. Nesta época, mais um orgulho: o Vila Esperança, transmitido na Record, que levou assinatura da produtora, recebeu prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), em 1998. O retorno a Porto Alegre foi provocado por um assalto à produtora. "Levaram absolutamente tudo que tinha na empresa", lamenta.

Experiências de um menino simples

De origem humilde, Jairo Jorge é filho de Jair, que foi motorista de táxi, e de Gasparina, costureira e cabeleireira - o irmão, Ademir, servidor público, é 16 anos mais velho. Casado com a produtora cultural Thaís Pena, derrete-se pela esposa: "Ela é uma mulher forte, inteligente e companheira. Alguém muito importante na minha vida", elogia, contando, em seguida, que se conheceram em 2004, na capital federal, e que "roubou ela de lá". A família é completada pelos filhos do primeiro casamento - o produtor musical Mário e a estudante de engenharia Isadora - e a enteada, Ana Cândida, jornalista e antropóloga. Sobre a paternidade, diz que "pai é quem caminha ao lado, mas nunca dizendo qual o caminho a seguir. Eles devem fazer suas próprias escolhas".

Longe de seu gabinete e da vida pública, Jairo Jorge gosta de tudo que seja simples: cinema, shows e leitura, muita leitura. No momento, por óbvio, tem lido obras de política e gestão, mas não há preferência de gêneros nos livros. Estes, aliás, foram inseridos em seus prazeres já na infância, conforme relata: "Minha primeira professora fez um concurso em aula, em que o melhor aluno ganharia um livro de histórias infantis. Ganhei", recorda. Os momentos de lazer também podem ser aproveitados para adquirir conhecimento, mas assegura que não pode ser nada obcecado, caso contrário "é processo emburrecedor". "Tem que ter prazer, frisson, parte lúdica", constata.

Na música, prefere Jazz e Música Popular Brasileira (MPB). E na cozinha, adora frutos do mar, ou melhor, suas carnes escolhidas sempre serão as brancas, já que, há muitos anos, evita carne vermelha. Apesar das preferências, não se arrisca na gastronomia. "Estou destreinado. Faz tempo que não visito a cozinha", brinca. Para definir sua vida, é rápido: "Sou um cara simples, preocupado em cumprir o meu papel como cidadão e procurando sempre o valor da humildade".

Experiências de cidadão

Durante a conversa, logo se percebe uma mania: Jairo Jorge não para de rabiscar em um papel. Tem explicação: "Deve ser mania de jornalista. Não pode ver uma folha e uma caneta". A profissão, aliás, ele garante que ajuda na posição de político, pois foi na Comunicação que aprendeu a praticar a síntese em tudo o que faz. Mesmo tendo certeza que ainda tem muito por fazer, sente-se um profissional realizado. "Acho que consegui construir uma boa história até aqui", resume.

A dica que Jairo Jorge dá para quem pensa em seguir o mesmo caminho dele é sempre colocar-se do outro lado. "Assim como na política temos que pensar como seria se fôssemos oposição, no Jornalismo é sempre bom se colocar no papel do entrevistado", detalha, acrescentando outra particularidade: "Sou católico. Não tenho visão ortodoxa, mas acho que os princípios cristãos me ajudaram a traçar este caminho de servir ao próximo".

Perfeccionista, perseverante e teimoso é como ele se define. E entre o prefeito, o cidadão e o jornalista, é categórico: "Política não é profissão, é função pública, uma passagem. Independentemente da posição que ocupo hoje, tenho uma profissão e a minha história, ninguém me tira. Sou jornalista, estou prefeito".

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