Por um jornalismo mais literal

Por Fabio Berti, para Coletiva.net

Fabio Berti - Juliano Verardi

Há tempos, ando incomodado com o excesso de uso da linguagem figurada no jornalismo. É evidente que a tarefa de tradução de assuntos mais densos ou termos eruditos se torna mais simples com o emprego desse recurso linguístico. O problema é transformar o metafórico em hiperbólico ou, simplesmente, exagerado!

A comoção causada com a recente morte da literalmente fantástica jornalista Glória Maria, evidenciou o quanto as analogias estão sendo mal-empregadas. Entre tantos justíssimos elogios, vieram os exageros verbais. Glória foi destacada como uma grande "guerreira" em razão das condições adversas superadas. Não seria ela uma mulher e uma profissional exitosa, vitoriosa, gloriosa? Guerreira tem a ver com guerra, é sinônimo de beligerante, belicosa.

Na cobertura esportiva, muitos jornalistas costumam enaltecer os atletas quando, segundo sua descrição, "estão prontos para a guerra" ou "venceram mais uma batalha". A mim, já causa espanto que os e as participantes do reality show Big Brother sejam descritos pelos jornalistas apresentadores como "heróis e heroínas". E guerreiros/as, também, é claro. 

O autor Umberto Eco, em sua obra, descreveu a metáfora no ambiente do jornalismo como uma "figura pela qual se dá a um vocábulo um significado que não é o seu próprio". Não raro, as notícias têm ganho vida por excesso de sensações. O abuso metafórico pode desempenhar o papel de um vírus - que metáfora, hein! -, especialmente em tempos de disseminação de fake news e da já consensual diminuta capacidade de interpretação de textos e de informações pela média da população brasileira.

A semântica é uma área da linguística voltada ao estudo do significado em diversos níveis, analisando inclusive o conteúdo e o contexto. Integra a semiótica, que é a ciência dos signos ou da significação, cuja compreensão é fundamental para o exercício do jornalismo. Uma notícia deve refletir nitidamente o que mostra, sob o risco de atravessar a linha tênue para o sensacionalismo.

Restam, portanto, dois compromissos para nós, jornalistas: avaliar muito bem o que denota e o que conota cada palavra no conjunto da informação e - tarefa básica -, ler mais para ampliar o vocabulário. Eu sou um leitor assíduo, jamais um leitor voraz!

Fabio Berti é jornalista, professor universitário e doutor em Educação em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).

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