Quando o rebranding apaga a essência

De Maicon Dias, para o Coletiva.net

Maicon Dias é especialista em Marketing, comportamento e CEO da Gampi Casa Criativa. - Crédito: Divulgação

Há algo de poético, e também trágico, no momento em que uma marca se olha no espelho e não se reconhece. Quando ela esquece de onde veio. Nos últimos anos, temos assistido a uma sequência de mudanças visuais e estratégicas apressadas, discursos genéricos e promessas que não se sustentam. Marcas que antes tinham personalidade forte, hoje correm para se encaixar em modelos pré-fabricados de comportamento, estética e relevância cultural.

O desejo de modernizar, muitas vezes, vem acompanhado de um apagamento da essência. E, na pressa de parecer atual, muitas delas se afastaram do que as tornava únicas. Quando a marca esquece quem é, o público também esquece porque se conectava com ela.

O posicionamento de uma marca é difícil de construir, mas fácil de se desfazer. Conquistar uma identidade que permanece no tempo não é sobre seguir tendências do momento, mas sim sobre sustentar convicções profundas que resistem ao barulho da moda passageira. É fácil ceder à sedução do que está em alta, das narrativas do agora, dos temas que ocupam os holofotes, mas organizações verdadeiramente relevantes são aquelas que conseguem adaptar-se à cultura sem abandonar sua essência.
Compreender e acompanhar o tempo não significa abandonar os próprios pilares, mas reconhecer que sua trajetória, seus símbolos e sua voz já fazem parte de um contexto cultural, com postura, com responsabilidade narrativa e com um sotaque próprio que ninguém mais tem.

Fazer parte da cultura exige presença, e isso exige escuta. E é justamente aí que muitas marcas falham. Porque continuam operando a partir de estratégias isoladas, frias e distantes, desenhadas por estruturas que ignoram o fato de que o consumidor de hoje não é mais uma figura passiva diante da mensagem. Ele não apenas escolhe o que consome; também influencia o que o mercado passa a oferecer, pautando, ressignificando e, muitas vezes, construindo ou desconstruindo valores com base em sua percepção coletiva e conectada.

Por isso, marcas que desejam permanecer precisam sair da zona confortável da comunicação previsível e se colocar num estado constante de escuta. Não a escuta que espera sua vez de falar, mas a que está aberta a reconhecer que sua verdade só se sustenta quando dialoga com o contexto vivo que a cerca. Isso exige humildade, curiosidade e, acima de tudo, coragem.

A construção e sustentação de uma identidade sólida não está em agradar a todos, nem em seguir cada nova onda cultural, mas em ter consistência naquilo que a marca acredita, mesmo que isso exija enfrentar o ruído do momento. Porque no fim, o que realmente permanece não é quem gritou mais alto, nem quem se curvou mais rápido às pressões do presente, mas quem falou com verdade. E verdade, como sabemos, é o único ativo que resiste ao tempo.

Maicon Dias é especialista em Marketing, comportamento e CEO da Gampi Casa Criativa.

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