Papel de carta

      "Sabem o que mais detesto? Quando vou escrever uma carta e não tenho o papel adequado. Nunca o tive, talvez uma vez, quando houve …

      "Sabem o que mais detesto? Quando vou escrever uma carta e não tenho o papel adequado. Nunca o tive, talvez uma vez, quando houve um tal primeiro amor que ficava em Porto Alegre no verão. O papel era quase transparente e o toque dava a impressão de que deveríamos dizer algo que se manda dizer pela alma, pois somente com um papel assim podemos falar ao silêncio. Aquilo tinha o poder da cura. A carta ficava tão leve que desaparecia no abraço. Já, este papel, em que escrevo, é similar ao memorando, ao relatório, à redação, que, aliás, era do que eu mais gostava".
      Voltando à vaca fria, o pior, mesmo, é passar a limpo. Que sinuca. O teclado, a tela. Deve ser por isso que alguns gravam ditos e pensamentos, passando-os adiante para que outros os tirem das fitas ouvindo aquele sonzinho metálico. Por quantos filtros passam as idéias até chegarem aos ouvidos dos interleitores? Sem dúvida, após ler Ilusões Perdidas de Honoré de Balzac, o filtro mais cretino é aquele em que você decide se escreve, ou não. Decide se pode revelar ou deve tergiversar. A favor ou contra.
      Vocês conhecem Sofrenildo, o personagem azarado de Sampaulo? Aconteceu, acreditem. Outra coisa que detesto é não achar nada que me fixe na tevê a cabo. Encontrei um canal muito legal, com papos muito "cabeça", sobre psicanálise, cinema, jornalismo, literatura, fiquei encantada. Porém, entra em ação Sofrenildo: dois dias depois dessa tardia descoberta, o canal era retirado do ar, temporariamente, para troca de programação devido a um diagnóstico feito em nome do Governo Federal brasileiro com vistas à inclusão deste canal na tevê aberta. Não entendi bem, pois desde então o canal saiu do ar. Era o 19, Canal Cultura e Artes de onde surgiu a leitura de Balzac em um tema tão polêmico sobre a ética em jornalismo. Programa criativo na forma e no conteúdo. Vi também um documentário sobre Porto Alegre, com textos de Renato Dalto (produzido pela TVE/RS) e duas palestras de escritores brasileiros. Fica, portanto, a mensagem da semana: é preciso trabalhar no que restou. E Sofrenildo dá a dica: Ilusões Perdidas de Honoré de Balzac, Cia das Letras, 2002 (tradução e adaptação de Silvana Salerno).
      Quanto a cartas, está posto: resolvo com mails.
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