A anistia aos golpistas e a teoria das janelas quebradas
Por Renato Dornelles
Desenvolvida pelo cientista político James Q. Wilson e pelo psicólogo criminologista George L. Kelling, a "Teoria das Janelas Quebradas" (Broken Windows Theory) foi transformada em modelo de política de segurança pública em algumas regiões dos EUA.
Para desenvolvê-la, os pesquisadores realizaram um experimento em que dois carros foram abandonados em cidades diferentes: um em Nova York e outro em Palo Alto, na Califórnia.
O carro abandonado no estigmatizado bairro do Bronx, em Nova York, foi vandalizado em poucas horas. Já o veículo abandonado em Palo Alto, inicialmente permaneceu intacto. Quando os dois pesquisadores quebraram um vidro deste carro, começou um processo de vandalismo e furtos.
Com isso, estabelecendo uma relação entre "desordem, desleixo e impunidade", o cientista político e o psicólogo concluíram que "se ninguém se preocupar com uma janela quebrada, outros vidros serão quebrados".
Por analogia, passaram a defender que "se os pequenos delitos ou contravenções não forem reprimidos, acarretarão em condutas criminosas mais graves". Logo, para eles, a punição de pequenas infrações impede crimes maiores.
A teoria espalhou-se mundo afora e, logicamente, chegou ao Brasil, onde ganhou muitos adeptos. Até aí, nada de anormal. O "surpreendente" é vermos os defensores da teoria defendendo agora a anistia para os vândalos golpistas que depredaram os prédios da Esplanada dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
Vidros foram quebrados, móveis, objetos raros, como um relógio do Século XVII, obras de arte foram destruídos na invasão de centenas de pessoas que, acima de tudo, atentaram contra a democracia e o estado de direito.
No projeto de lei de anistia defendido por congressistas, pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e milhões de seguidores, onde fica a defendida relação entre "desordem, desleixo e impunidade" da "teoria das janelas quebradas"?
Acima, escrevi a palavra surpreendente entre aspas. Afinal, quem acompanha o histórico de punições no Brasil e as estatísticas do sistema prisional, com o perfil de quem o "habita", não encontra dificuldades em reconhecer uma seletividade.
Para uma parcela da população, incluindo políticos, a importância, a qualidade e a gravidade do crime importa menos do que "a qualidade" de quem o cometeu, vista a partir do olhar deste mesmo segmento.