A mídia e o Caso Nardoni

Por Renato Dornelles

O papel da mídia deve ser motivo permanente de preocupação e debate na sociedade. Afinal, ainda que sejam totalmente contestáveis as definições como "o quarto poder" e rejeitado qualquer tipo de censura, é inegável o quanto, em determinados momentos, a atuação midiática cresce em termos de importância e de influência em diferentes aspectos da sociedade.

Volta e meia, discussões importantes nos são trazidas pela arte, principalmente por documentários. Recentemente, o Canal Brasil reprisou várias vezes a série documental 'O Caso Escola Base'. Antes de mais nada, esse trabalho traz à tona um debate sobre a atuação da imprensa em um polêmico caso policial.

Para quem não lembra ou não acompanhou, a Escola Base foi uma instituição de ensino particular de São Paulo onde, em março de 1994, o casal proprietário, uma professora e um motorista foram injustamente acusados pela imprensa de abuso sexual contra alguns alunos de quatro anos. Os reflexos na opinião pública provocaram o encerramento das atividades e a "morte social" dos acusados. 

Agora, recentemente, a Netflix lançou o documentário 'Isabella, o Caso Nardoni'. Em uma rápida recapitulação, lembro aqui que o tema nos remete ao assassinato de Isabella de Oliveira Nardoni, de cinco anos de idade, que foi jogada do sexto andar de um prédio em São Paulo, na noite de 29 de março de 2008. O caso gerou grande repercussão e o pai da menina, Alexandre Nardoni, e a madrasta, Anna Carolina Jatobá, foram condenados por homicídio doloso qualificado. 

Desde o princípio, com base nas primeiras avaliações policiais, o público concluiu que o pai e a madrasta eram os responsáveis pelo crime. Isso parece ter pautado o trabalho da imprensa. Em casos de grande repercussão, como foi a morte de Isabella, desde o início a sociedade, de um modo geral, parece exigir que sejam apontados os culpados. Neste contexto, parte dos jornalistas corre atrás de um furo, algo que faz parte da profissão. 

Mas aí surgem os riscos. Não são raros os julgamentos antecipados, muitas vezes sem que os acusados tenham qualquer direito à defesa e em que a condenação ocorre de forma sumária. Retomo aqui o caso da Escola Base, que virou emblemático na história da mídia brasileira.

Não estou aqui discutindo o resultado do julgamento de Alexandre Nardoni e de Anna Jatobá que, condenados a mais de 30 anos de prisão, nunca admitiram e seguem negando a autoria do crime. Mas avaliando o trabalho da mídia. O documentário, em seu desenvolvimento, traz com maestria a discussão entre o papel e a atuação da mídia. Vale a pena assistir e refletir.

Autor
Jornalista, escritor, roteirista, produtor, sócio-diretor da editora/produtora Falange Produções, é formado em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) (1986), com especialização em Cinema e Linguagem Audiovisual pela Universidade Estácio de Sá (2021). No Jornalismo, durante 33 anos atuou como repórter, editor e colunista, tendo recebido cerca de 40 prêmios. No Audiovisual, nos últimos 10 anos atuou em funções de codireção, roteiro e produção. Codirigiu e roteirizou os premiados documentários em longa-metragem 'Central - O Poder das Facções no Maior Presídio do Brasil' e 'Olha Pra Elas', e as séries de TV documentais 'Retratos do Cárcere' e 'Violadas e Segregadas'. Na Literatura, é autor dos livros 'Falange Gaúcha', 'A Cor da Esperança' e, em parceria com Tatiana Sager, 'Paz nas Prisões, Guerra nas Ruas'. E-mail para contato: [email protected]

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