Aconteceu em Basel

Por Marino Boeira

Na época em que se estudei Geografia no Julinho, se aprendia que a Suíça era dividida em cantões, falando línguas diferentes: o francês em Genebra, o italiano em Lugano e o alemão em Zurique, Berna e Basiléia.
Se sabia também que o pais ficara neutro na Segunda Guerra e que sua marca, além dos bancos famosos por sua discrição com o dinheiro dos ricos clientes, era de ser um grande fabricante de relógios cucos.
E mais, seu nome oficial era Confederação Helvética.
Com todas essas informações, resolvemos incluir a Suíça no nosso roteiro ferroviário anual de inverno pela Europa.
A idéia era visitar Zurique e Basiléia, permanecendo um ou dois dias em cada uma delas.
Genebra, quase na fronteira com a França. ficaria para outra vez.
Primeiro problema que nos demos conta é que Basiléia ninguém, por lá sabe, onde fica.
É Basel e pronto.
Foi em Basel, que tivemos uma lição prática da diferença que existe entre o luxo ostentatório do modelo americano e o discreto luxo do modelo europeu.
Por alguma razão, quando chegamos em Basel, abandonamos o nosso esquema tradicional de encontrar o hotel mais adequado às finanças de turistas brasileiros no serviço que existe pra isso na estação ferroviária e resolvemos sair logo pra rua e escolher no olho nosso hotel.
Quase em frente à estação havia vários hotéis, mas logo nos inclinamos por um dele pela sua aparência mais sóbria.
Um prédio simples, térreo e mais um andar, sem grandes letreiros luminosos. Apenas discretamente a palavra hotel, seguido de um sobrenome alemão, que podia ser Schneider, Jung, Muller ou Schmidt.
Só não era Weber, que esse era o sobrenome da minha mãe e eu lembraria.
Então nos decidimos pelo Hotel Schneider ( ou algum similar alemão)
Mas, bastou abrir a porta para perceber o engano que havíamos cometido.
Um sujeito, saído dos filmes de sobre reis e rainhas do passado, segurou a porta para entrarmos e nos indicou a recepção.
Não tínhamos mais como recuarmos.
Pelo menos uma noite, ficaríamos por lá.
Fiz a maior cara de pau e disse apenas muito obrigado - e em português - para aquela outra figura medieval que nos levou ao quarto e que certamente estava habituado a ver sua gentileza sendo gratificada com dólares e marcos.
Foi apenas uma noite, suficiente porém, para desfalcar em muito o orçamento da viagem.
Ficou uma lição: as aparências, as vezes, enganam.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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