Arbitragens ruins são reflexos do nosso futebol
Por Rafael Cechin

Todo o ano é a mesma coisa. À medida que a temporada avança e os erros de gestões ou dos técnicos e jogadores se acentuam, interferindo nos resultados em campo, as reclamações contra a arbitragem se multiplicam. Não, não pense que esse artigo vai isentar os juízes de futebol dos problemas causados por eles e que prejudicam, sim, o campo. O ponto é que a responsabilidade não é unicamente dos apitadores. Eles, aliás, são apenas a ponta de uma bagunça quase generalizada.
No fim de outubro, uma rodada do Brasileirão foi encerrada com três árbitros com escudo FIFA sendo afastados. Por erros claros identificados em suas atuações. Da "geladeira", esses viram outros equívocos se sucederem na semana seguinte. E assim será sempre. Aqui no Rio Grande do Sul, um dos juízes mais habilitados, Jean Pierre Lima, está fora de partidas nacionais há um ano e meio depois de errar e discutir com o atual chefe da arbitragem no país. A culpa é de quem?
Todos os personagens são culpados. Vamos a todos eles, começando por quem poderia decidir por algo diferente: os dirigentes da CBF. Há décadas as competições não são prioridade para a entidade que comanda o esporte por aqui. A Seleção, muito lucrativa, tornou-se "galinha dos ovos de ouro" desde os anos de 1990.
O Brasileirão ficou em segundo plano. Primeiro, porque gera custos sem grandes ganhos. Depois, porque é difícil de se gerenciar num continente chamado Brasil. Fato é que os presidentes vão, outros chegam, e o nosso principal torneio é espremido num calendário caótico. A gestão dos árbitros vira mais um componente do problema. Investe-se em qualificação de treinadores, de atletas, de cartolas, mas pouco é feito para preparar melhor quem apita os jogos.
Igualmente responsáveis são os presidentes dos clubes envolvidos. A profissionalização é uma realidade cada vez mais urgente nas associações que eles comandam. Se não for administrado como um negócio, igualzinho a uma empresa, o time está fadado a ocupar posições ruins em qualquer torneio. Por que, então, não exigem que a arbitragem vire profissão?
Em vez disso, repetem todo o ano (ou todo o mês, muitas vezes toda semana) a postura de irem contra os "homens do apito". Um conflito permanente que eles mesmos poderiam evitar se lutassem por melhores condições de trabalho e dedicação dos juízes. Afinal, temos vendedores de lojas, professores de educação física, advogados, motoristas e gente com muitas outras habilitações que em momentos de folga do trabalho vão ditar as regras dentro das quatro linhas. Não tem como dar certo.
Os jogadores, além de terem salários muito acima dos ganhos dos árbitros, também entram nessa roda. Pecam por tumultuar o trabalho da arbitragem a cada minuto. Se percebem que o juiz está bem, fazem de tudo para que ele perca as rédeas. Se o juiz é ruim, tomam conta da partida e fazem os erros aparecerem com mais clareza. O importante é sempre buscar uma vantagem com os equívocos do apitador. E reclamar quando não é favorecido, claro.
Nós da imprensa não ficamos de fora. Temos papel importante na mediocridade que domina o futebol. As análises são rasas, difusas e confusas. Especialistas de arbitragem foram banalizados. Hoje em dia, todo mundo acha que entende. Poucos entendem. O conflito de opiniões deixa os torcedores com sensação permanente de desconfiança e raiva, fazendo com que o círculo vicioso se volte contra os árbitros cada vez que pisam num campo.
De uniforme preto (ou rosa, vermelho, amarelo como ocorre hoje em dia) os personagens principais das polêmicas dão sua contribuição para o caos do futebol com atuações duvidosas. Em grandes duelos, incluindo clássicos, buscam aparecer demais. Favorecem algumas vezes o time mandante. Se deixam pressionar. Erram muito mesmo.
A culpa é de quem, então? De todos. Não à toa temos cada vez menos talentos nascendo no Brasil. Não à toa o valor da nossa Seleção despenca. Não à toa temos muito mais queixas, mesmo com o VAR, contra a nossa arbitragem. A solução pode vir de vários lados, mas eu duvido que chegue. Não é interesse de parte alguma envolvida.
A nossa dupla Gre-Nal está inserida no sistema falido. E infelizmente colabora para que tudo esteja tão ruim. O que nos salva um pouco é a postura recente, em especial do presidente do Inter, de tentar criar uma liga única. Quem sabe passa por aí a salvação do esporte em nosso país.