Conspiração à brasileira

Por Flávio Dutra

Entre tantos personagens inesquecíveis, Chico Anysio tinha um que eu considerava impagável: Bento Carneiro, Vampiro Brasileiro, "aquele que vem do aquém, do além, adonde que véve os mortos", apresentação pronunciada com sotaque caipira. Um dos seus bordões favoritos era ¨Minha vingança será maligrina¨.

Ao final dos quadros na TV, depois de muitas trapalhadas nas tentativas de assustar alguém, afirmava olhando para a câmera: "Bento Carneiro, vampiro brasileiro...pzztt", seguido de uma cusparada. Era um vampiro fracassado, com baixa autoestima.

Não sei porque me lembrei do Bento Carneiro ao conhecer os detalhes da movimentação dos militares envolvidos na tal Operação Punhal Verde e Amarelo, que queria impedir a posse de Lula e executar o presidente eleito, junto com o vice Alckimin e o Alexandre de Moraes. Bota amadorismo e inépcia nessa turma, sem torcida minha para que desse certo, mas apenas constatação. E mais: se os conspiradores faziam parte de um grupo de elite do Exército (os Kids Pretos) fico imaginando como será o preparo do restante da força! Assim, qualquer semelhança com o personagem de Chico Anysio não será mera coincidência.

Quando o táxi resolve ou atrapalha

As trapalhadas dos candidatos à golpistas ficaram evidentes num episódio prosaico: o aloprado de codinome Gana, que estava na campana para prender Alexandre de Moraes, não pôde cumprir a sua missão e nem se evadir a tempo... por não conseguir um taxi. Os outros Kids Pretos devem ter tido ganas de esganar o Gana, com o perdão pelo trocadilho. O sujeito nem plano B tinha para escapar!

Como militar, ele deveria conhecer um pouco de história e saber de um caso em que, diferente da situação dele, os taxis foram decisivos numa batalha. Em 1914, as tropas francesas usaram centenas dos então carros de praça para terem como chegar ao front e impedir que as tropas alemãs invadissem Paris.

Sem outros meios para transportar os soldados, todos os táxis disponíveis em Paris foram requisitados e pelo menos 600 deles participaram da primeira leva de tropas, que apoiou a contraofensiva das forças franco-británicas, naquela que ficou conhecida como a Primeira Batalha de Marne. Os taxistas foram devidamente indenizados, além da glória de terem participado do esforço de guerra, bem diferente da ação inglória do atrapalhado Gana.

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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