Coopítulo 79 - O modelo cooperativa

Por José Antonio Vieira da Cunha

Uma pergunta recorrente, que ainda há poucos dias fui provocado a responder: o modelo de cooperativa é viável nos dias de hoje para reunir um grupo de jornalistas? 

Bem, a forma de atuação profissional em cooperativa existe em vários ramos de atividade e é vitoriosa no país. Então, a resposta é quase óbvia: no caso de um coletivo de jornalistas, ou de trabalhadores intelectuais, sim, é bem possível ser exercitado o modelo cooperativista. Basta que um grupo de pessoas com interesses e objetivos comuns se reúna e lidere a iniciativa. É uma questão de vontade, por um lado, e de necessidade, por outro, se levar-se em conta que o mercado de trabalho para jornalistas é cheio de pedras, com uma concorrência brutal e uma remuneração geralmente decepcionante.

Então vamos lá: além de ser a união de pessoas com objetivos comuns, uma característica essencial no cooperativismo está no fato de ser um organismo essencialmente democrático, em que todos os associados têm direito a um voto, independente do valor de cotas que cada um detenha. Suas decisões são tomadas em assembleias gerais das quais participam todos os associados, com iguais direitos para votar e ser votado, por exemplo. E mais, não visa lucro, e sim o bem-estar de seus associados e a determinação de melhorar a renda deles.

É relevante considerar outro aspecto, o de que os próprios cooperativados detêm o controle do que se produz e estão diretamente comprometidos com os resultados de um negócio que não tem um único dono a ditar as regras. Os donos são todos os associados, com direitos e responsabilidades iguais, o que é um decisivo diferencial em relação às empresas convencionais, seja de que ramo forem. Mas, atenção, o desafio é que o cooperativismo é um permanente exercício de paciência e compreensão; nele, o indivíduo tem de aprender a respeitar os direitos dos demais integrantes da sociedade, saber dialogar e, principalmente, dobrar-se ao consenso obtido pelo grupo, mesmo que discorde de alguns pontos ou premissas estabelecidos.

Um entendimento basilar é o de que a verdadeira prosperidade não é conquistada apenas com o crescimento econômico, mas também com a tolerância, o debate, a troca de ideias, aí embutido ainda o princípio do respeito às ideias alheias. E no caso específico da Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, a Coojornal, vale registrar que o cenário para debates não era nada amigável nos anos 70, em plena vigência da ditadura militar.

A Coojornal foi uma iniciativa pioneira no Brasil e inspirou outras similares em 15 estados porque apresentava uma originalidade desafiadora, representada exatamente pelo envolvimento direto de profissionais do jornalismo. Foi ela que estimulou os jornalistas a procurarem se organizar, acenando com um objetivo irresistível, o de proporcionar emprego e renda aos associados. Havia nela até um apelo encantador com o fato de o cooperativismo ser considerado um sistema híbrido, misto de capitalismo com socialismo. Um, caracterizado por buscar o lucro e priorizar o individualismo e a propriedade privada. O outro, por buscar o bem coletivo. Pode-se creditar a este mix o sucesso do cooperativismo em nível mundial.

A Cooperativa dos Jornalistas era a própria corporificação da iniciativa empresarial de trabalhadores sem capital, uma das milhares de empresas que ontem e hoje povoam o Brasil. Mas a Coojornal tinha um espírito norteador que abrangia mais que uma cooperativa. Tratava-se de uma organização que reunia homens e mulheres cultuadores dos princípios do jornalismo profissional. Com seu trabalho, buscavam também ser o espelho fiel da realidade mesmo quando ela se encontrasse disfarçada ou oculta. Assim, atuar com senso crítico e independência era condição imperativa, e é o que assegurava credibilidade. E, com ela, a cooperativa e seu Coojornal deixaram um legado que é antes de tudo uma valiosa contribuição para entender aquele período complexo dos anos 70 e 80. 

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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