IN FORMA

Por Marino Boeira

Circula nas redes sociais um vídeo mostrando o escritor Rubem Fonseca, em 2013, falando na inauguração de uma "sala de leitura" para os trabalhadores do metrô do Rio de Janeiro. Ele, um dos maiores escritores modernos brasileiros, defende a importância da leitura dos livros para a conscientização dos seus direitos pelos trabalhadores.

Ironicamente, Rubem Fonseca, autor de livros memoráveis como 'Agosto', 'Feliz Ano Novo', 'O Cobrador', 'A Grande Arte' e 'Buffo & Pallanzini', que morreu em 2020, aos 95 anos, foi uma das maiores vítimas do pensamento engessado da chamada esquerda liberal, que não consegue separar pessoas de suas obras. Ele teria, como advogado, trabalhado para a Light e alguns dos seus textos sobre política foram usados por opositores ao governo Goulart.

Se quisermos sair um pouco do Brasil, veremos que essa esquerda-burra, existe por todos os lugares do mundo. O pintor Salvador Dali, na Espanha, independentemente da sua arte, foi exorcizado pelas posições políticas anárquicas e anticomunistas; Vargas Llosa, um dos maiores romancistas sul-americanos, por suas posições liberais e até Jorge Luís Borges pela sua ligação com as oligarquias argentinas. Uma esquerda incapaz de separar um autor de sua obra, não merece ser chamada de esquerda, porque está muito mais para uma direita autoritária.

Hoje, quando imagina ter chegado ao governo com Lula e Alckmin, essa esquerda de poucas leituras, engessou de vez sua visão política da realidade e se recusa a aceitar qualquer crítica aos arranjos políticos de Lula com as forças mais retrógradas do País, incrustadas no Parlamento, no Judiciário, no meio empresarial, sejam provenientes do agronegócio, do comércio, da indústria e bancário.

Num posicionamento que chega a ser hilário, tenta interpretar as viagens turísticas de Lula e sua mulher pelos Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Espanha, Argentina e Uruguai, como obrigações de um estadista, mesmo quando ele se contradiz em suas falas em cada porto que escala. Internamente, depois de quatro meses de governo, quando normalmente os novos dirigentes aproveitam o apoio eleitoral que tiveram nas urnas, para lançar medidas de impacto, o que vemos é apenas a preocupação de Lula de criticar seu antecessor. Ele devia deixar o ajuste de contas com o maléfico governo de Bolsonaro para a Justiça e tratar de governar e fazer alguma das coisas que prometeu nas eleições.

Esse artigo não tem a pretensão de falar mais uma vez sobre a falta de ação desse governo, mas de mostrar que esse é um tema proibido para seus apoiadores na mídia, principalmente na mídia social.

Seus seguidores nesses espaços se limitam a chamar de "bolsominions", um termo adaptado de bonequinhos americanos, o que já é revelador de suas formações intelectuais, os que criticam Lula e seu governo, abrindo mão de um debate de ideias.

É uma verdadeira conspiração do silêncio. Não vamos falar nisso e talvez os críticos do atual governo, silenciem, pensam. Em vez de ajudar o governo que elegeram, cobrando suas promessas e pressionando para que elas se tornem realidade, preferem desqualificar quaisquer comentários que não sejam de elogios ao Lula, à Janja, ao Dino, ao Haddad e a todos seus integrantes desse núcleo eleitoreiro, que o professor Nildo Ouriques chama de "Governo Petucano"

Começamos lembrando Rubem Fonseca e seu discurso de saudação pela valorização do livro e terminamos lamentando que seu apelo foi desconsiderado, pelo menos por essa nossa esquerda liberal.

 

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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