IN FORMA

Por Marino Boeira

Os estereótipos da política

A vida brasileira há muito é dominada por dois tipos de procedimentos: o culto de estereótipos políticos e a grande hipocrisia no trato das questões que dizem respeito às pessoas e às coisas.

Anos atrás, quando estive no Uruguai, querendo ser gentil com uma pessoa local, falei da admiração dos brasileiros pelo seu presidente, Pepe Mujica. Ela me respondeu que muitos uruguaios, como ela, não se sentiam representados por uma pessoa que fazia questão em se apresentar como um pobretão no cenário internacional e não com uma postura altaneira representando um povo que não se sentia inferior a nenhum outro.

Mujica apenas criara um estereótipo. Os políticos brasileiros modernos seguem essa escola. Em busca do reconhecimento das pessoas e do voto dos eleitores, eles não se posicionam como defensores ou críticos de ideologias, eles fazem tipos.

Veja-se a história recente dos nomes que se destacaram na vida política brasileira: Collor era um jovem, cheio de energia, que vinha para acabar com os velhos políticos; Itamar, o brasileiro ingênuo e inculto com as habilidades do homem do interior; FHC,seu oposto, o intelectual universitário respeitado pelos seus conhecimentos acadêmicos; Lula era o nordestino esperto, o novo Macunaíma de Mário de Andrade, enquanto Bolsonaro, um sujeito desprezível representava aquela criança medonha e traquinas sempre disposta a fazer uma maldade; finalmente Dilma, "a guerreira do povo brasileiro", com seus modos autoritários, era a gerentona que iria pôr a casa em ordem.

Nos cenários regionais, a mesma aposta, não em políticos de esquerda ou da direita que se apresentem com propostas políticas, mas em tipos às vezes frutos espontâneos de personalidades distorcidas, outras vezes de uma cuidadosa elaboração mercadológica.

No primeiro caso, temos aquele trio de políticos paulistas representando o que de pior existe na área: Adhemar de Barros, com seu lema do "rouba, mas faz"; Jânio Quadros e sua vassoura moralista e Paulo Maluf, com o elogio da imoralidade total.

Como produto de uma construção típica do marketing eleitoral, temos o governador do Rio Grande, Eduardo Leite. Sem nenhuma grande ideia política, salvo a repetição de velhos chavões, foi vendido como um jovem, simpático e bem educado que ia livrar a política dos velhos com seus métodos ultrapassados de administração. Para consagrar essa imagem foi se declarar em rede nacional de TV como gay, o que no imaginário das pessoas sempre representou alguém delicado no trato com as pessoas e as coisas.

São esses tipos políticos que se movimentam em cenários, nacional e estadual, em meio a uma hipocrisia geral do público, sempre estimulada pelos meios de comunicação. Não se separam as pessoas pelas suas ideias mas pelo seu comportamento. Não se diz que o rei está nu. Como escreveu Eça de Queirós "a nudez forte da verdade é coberta pelo manto diáfano da fantasia".

Quem morre num dia, vira santo no outro. O mau comportamento é sempre desculpado. Não se busca a raiz das coisas. Nos contentamos com as meias verdades. Quem quiser fazer um teste que leia as colunas necrológicas dos jornais: só os bons pais de família, os políticos honestos e as mulheres virtuosas é que morrem. Os maus, os corruptos e as dissolutas estão todos vivos.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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