In forma (04/06)
Por Marino Boeira

NOS TEMPOS DO REPÓRTER ESSO
Aqui mesmo em Coletiva.net Flávio Dutra escreveu um excelente artigo sobre o avanço da publicidade nos espaços que seriam apenas do jornalismo. Embora ele não tenha usado essa palavra, é o avanço do merchandising (escusas pelo palavrão) numa área que teoricamente seria do puro jornalismo, principalmente no rádio e televisão.
Flávio Dutra não é um ingênuo e seu texto tem a clara intenção de promover uma reserva de domínio sobre um campo profissional - o jornalismo - do qual ele é um mestre.
Ocorre, porém que essa divisão nunca existiu de fato: jornalismo e publicidade sempre se misturaram de forma clara ou disfarçada. O jornal Zero Hora, por exemplo, tem vários jornalistas com espaços de opinião que servem para promover empresas de várias áreas, principalmente na construção civil. Todos os textos da jornalista Giane Guerra têm sempre um viés comercial.
Nessas horas lembro uma frase de Millôr Fernandes sobre o que é, ou deveria ser essa atividade: "Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados". Ou seja, está tudo à venda dependendo apenas do que o cliente quer pagar.
Digo isso com a experiência de quem esteve dos dois lados, primeiro como jornalista e depois como publicitário. Comecei na Última Hora como repórter e depois no Jornal do Comércio e Rádio Gaúcha como redator até chegar aos Diários Associados. Lá fui produtor do Repórter Esso, tanto na TV Piratini, apresentado pelo Helmar Hugo Schumacher, como na Rádio Farroupilha, com o Lauro Haggeman.
A Esso era um anunciante poderoso ficava então difícil para o Departamento Comercial dos Associados infiltrar um comercial como notícia. Quando chegavam aquelas reportagens em filme (se usava o modelo de 16 milímetros) e eu desconfiava que aqueles closes repetidos durante um jantar de políticos, tinham um interesse mais do que jornalístico, tratávamos de velar o filme.
Quando o curso de Comunicação da PUCRS deixou de ser apenas uma escola de jornalismo e abriu um espaço para a Publicidade fui convidado a dar aulas, devido à minha experiência como professor de História no Ensino Médio do Estado.
Foi nessa ocasião, que troquei também o jornalismo do rádio e TV pela publicidade. Flávio Correa,o Faveco, que conheci na Piratini me convidou para ser redator da sua agência, a Standard Propaganda, com uma proposta irrecusável: "pago o dobro do que ganhas como jornalista". Desde então passei pelas maiores agências do Estado - Standard, Marca, MPM, Módulo e Símbolo, até o momento em que decidi ficar apenas na área do ensino, somando à PUC também a Unisinos.
Na Famecos/PUC - havia uma certa má vontade dos alunos de Jornalismo, que alguns professores estimulavam, contra o pessoal
da Publicidade.
Os futuros jornalistas seriam os defensores de todas as boas causas e os publicitários usariam seu talento para vender sabonete e refrigerante.
Minha resposta naquela época e hoje é a mesma: os jornalistas servem a um patrão que dita a linha de comunicação do seu veículo e muitas vezes, quando pensam estarem defendendo uma boa causa, estão servindo aos interesses do dono do jornal, televisão ou rádio. Os publicitários usam a sua capacidade criativa, como redatores ou diretores de arte, para vender clara e objetivamente um produto de acordo com um briefing (outro palavrão) fornecido pelo anunciante, mas isso não os impede, de vez por outra, defender uma causa social mais nobre, obviamente tendo alguém que pague pela divulgação.
Na época da MPM, o Sérgio Gonzales fez uma frase que gosto de repetir: "Nós não vendemos nossa alma para o Mafuz (o primeiro M da agência MPM: Mafuz, Petrôneo, Macedo ) , apenas a alugamos e por um bom preço".