Margaridas em marcha pelo bem viver

Por Márcia Martins

Na música 'Cor de Rosa Choque' da eterna Rita Lee, a letra diz "mulher é um bicho esquisito, todo mês sangra, um sexto sentido maior que a razão". Talvez isso explique um pouco tanta disposição para as mulheres acumularem tarefas, disputarem lugar no mercado de trabalho de uma sociedade patriarcal, enfrentarem o cansaço ao começar uma terceira jornada no dia e cuidarem da casa e dos filhos, porque essas funções ainda recaem mais sobre elas. E, no meio de toda essa rotina, as mulheres, do campo e da cidade, encontram muita disposição para arregaçar as mangas e fortalecer a luta pelos seus direitos.

Assim, não foi surpresa, na quarta-feira à noite, os cantos e gritos de entusiasmo proferidos pelas mulheres no lançamento, em Porto Alegre, no Armazém do Campo, da 7ª Marcha das Margaridas. Lideranças de movimentos sociais, feministas e sindicatos de todo o Estado projetam levar mais de 600 mulheres gaúchas a Brasília nos dias 15 e 16 de agosto, para aquela que é considerada a maior mobilização de mulheres do campo e da cidade da América Latina. Na edição deste ano, da marcha que ocorre de quatro em quatro anos, o tema proposto é 'Margaridas em marcha pela reconstrução do Brasil e do bem viver'.

E as mulheres têm total consciência que há muito a ser reconstruído neste País, porque os nossos direitos - tão arduamente conquistados - são os primeiros a serem retirados em regimes não democráticos e que não tem preocupação alguma com políticas públicas. As pautas elencadas para a 7ª marcha pedem o retorno das políticas públicas de saúde, educação, previdência e assistência social, o fim da violência contra as mulheres, a preservação do meio ambiente e o fim de qualquer tipo de discriminação. "Queremos igualdade de direitos e faremos a maior mobilização do campo e da floresta", defendeu a representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag).

Na marcha de 2023, que teve a primeira edição em 2000, serão debatidos temas que interessam às mulheres do campo, das águas e das florestas. E no encerramento, o cansaço não consta do dicionário para elas, que irão caminhar cerca de sete quilômetros até a Esplanada dos Ministérios para entregar as reivindicações ao Governo Federal. Na edição de 2019, todas as portas em Brasília foram fechadas para as mulheres da marcha.

O nome 'Marcha das Margaridas' e a data homenageiam a presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande (Paraíba), Margarida Maria Alves, assassinada em 12 de agosto de 1983, a mando de latifundiários da região. A sua luta pelos direitos das trabalhadoras do campo incomodou os fazendeiros. Foi morta na porta de sua casa, com um tiro no rosto na presença do marido e da filha. Mas, como disse num discurso no Dia do Trabalhador e da Trabalhadora, em 1° de maio de 1983, "da luta, eu não fujo". "É melhor morrer na luta do que morrer de fome".

Pois, mais uma vez, Brasília ficará florida com uma invasão de margaridas em agosto. De todos os cantos do País. Margaridas de todas as raças, idades e orientação sexual. Porque elas jamais cansam de lutar. E nem adianta tentar enterrá-las, porque as mulheres são sementes, germinam e brotam novamente para prosseguir na luta.

 

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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