O medo de ficar sozinho
Por Luan Pires

Considerando que sou onipotente e onisciente, eu nunca estou sozinha. Mas, converso muito com minha irmã, que tem muitos nomes, mas vocês costumam chamá-la de Morte. Um dos privilégios dela, ao meu ver, é ver a verdade de vocês. Na hora que vocês deixam esse plano, independentemente do que acham que acontece quando isso ocorre, vocês se revelam.
O fato é que ela vê o que eu não vejo. Durante a vida inteira, fulano gostou de ostentar que não precisava de ninguém. Tratou com indiferença algumas pessoas, focou em bens, esqueceu de pessoas. E tudo bem. Foi uma escolha dele. Mas, ao sumir da luz dos olhos dele, no momento de abraçar minha irmã, aquela postura indiferente sumiu e o que ela viu, conforme me disse, foi só uma vontade enorme de não ficar sozinho.
Outra história que minha irmã me contou foi a de ciclana que morreu com uma culpa corroendo seu peito. Ela, a ciclana, queria ter dito mais vezes a quem amava o quanto ela o amava. Mas, na minha companhia, em Vida, ela nunca disse. Pelo contrário, desdenhou a presença dessa pessoa como quem é indiferente. Pena.
Vocês se revelam na Morte.
E digo tudo isso, pois acredito que morrer é intrínseco ao ser humano. Vocês fazem parte de um ciclo que avança sem parar. Acho engraçado como os humanos têm medo de falar da Morte. Digo, eu sei que não é algo a se conversar num chá entre amigos, mas é algo que todos que já passaram por mim vão encontrar. Talvez a gourmetização do ato de morrer, essa vasta mitologia em torno da minha irmã, venha do desconhecimento do que acontece. Já eu, a Vida, sou aquela trabalhadora incansável do dia a dia, vocês me conhecem e me atribuem as culpas da existência. Eu sem meio que sem graça pra vocês.
Viver dói, assim como morrer. Não adianta fugir da tristeza da perda, porque o luto é o resultado da equação das nossas vidas. Somos mínimos e poderosos. Vivemos e morremos com formigas. Mas pensamos e criamos teorias sobre coisas que não conhecemos como verdadeiros gênios. Tudo é dualidade na existência. Somos nada e tudo. Somos vida e morte. Somos culpas e apegos, amores e carinhos.
Se vocês pararem de enxergar a dor e a alegria como coisas separadas e entenderem que tudo faz parte da mesma moeda, talvez vejam que mesmo com o coração doído, a vida não deixa de ser maravilhosa. E eu preciso dizer, eu sou mesmo.
Com amor, Vida.