Politicamente (In)Correto

Por Flávio Dutra

Essa compulsão pelo politicamente correto me deixa desconcertado, para dizer o mínimo. A coisa chegou a tal ponto que o politicamente correto atingiu o mundo animal, via pets. Por exemplo, os cães que conhecíamos como vira-latas, os caramelos errantes, os bandos de sarnosos agora são chamados de "cães comunitários". 

Fico imaginando se os cães, promovidos à nova condição, não estão latindo de forma diferente, com menos estridência e mais sociabilidade. Os carteiros, entregadores de pizzas e do gás, certamente agradeceriam. Mais ainda, se pudessem se expressar, os mais exibidos exigiram ser chamados de Pet Comunitário ou até mesmo Dog Community e se fossem adotados não aceitaram ter donos, mas tutores, que é a designação modernosa para o provedor. Parece que a Disney até está pensando em trocar o título daquele desenho clássico para A Dama e o Cão Comunitário.

Brincadeiras e exageros à parte, nem tenho certeza de que chamar de cão comunitário caracteriza como politicamente correto. Vale esclarecer, porém, que o politicamente correto não nasceu ontem, só que agora está mais presente nas relações cotidianas. E tem quem ache que apenas mudando o nome das coisas, está feito o enquadramento e as relações se enobrecem. Afrodescendente e povos originários me parecem exemplos notórios e tenho até medo de fazer referência aos termos usados até então para não ser taxado de politicamente incorreto, rotulado de fascista e alvo de cancelamentos. 

Nessa linha, o politicamente incorreto aparece com outras designações, outras formas de agir, como bullying e preconceito, atitudes reprováveis, com ou sem rótulos.  Que os transgressores sejam responsabilizados e recebam os rigores da legislação, mas me poupem dos excessos na interpretação do que é do que não é, da chatice dos que policiam o comportamento alheio e fora com as hipocrisias de quem nos grupos de Whats faz todo o tipo de piadas inconvenientes e nas redes públicas posa de soberano do politicamente correto.

E deixem os vira-latas, sem outras titulações. zanzarem livremente pelas comunidades;

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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