Quem tem medo da sabatina?

Por Flávio Dutra

Nos meus tempos de estudante tinha verdadeiro pavor do dia da sabatina. Deveria ser aos sábados, de acordo com origem latina do termo -  sabbatum -, só que os cruéis professores não ligavam para a tradição e aplicavam a sabatina a seu bel prazer, em qualquer dia da semana. Aluno apenas regular que eu era, o anúncio da prova que avaliaria não os meus conhecimentos, mas o que eu não sabia de determinada matéria, me fazia perder o sono. Sobrevivi, porém, às sabatinas da escola e às da vida, estas bem mais complexas e merecedoras de outra análise.

Agora o termo sabatina volta a se apresentar, após a confirmação de que o presidente Lula já escolheu o atual ministro da Justiça, Flávio Dino, para a vaga de Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal/STF. Trata-se da indicação de um peso pesado e, no caso, não estou fazendo qualquer relação com o corpanzil do ministro e, sim, com seu currículo. Formando em  Direito, com mestrado em Direito Constitucional, Dino foi deputado federal e duas vezes governador do Maranhão. Ele e Luiz Fux, acreditem, serão os únicos integrantes do STF que já desempenharam a função de juiz. Dino foi juiz federal por 12 anos e assumiu cargos ligados à magistratura, como secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e assessor da Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF). O futuro integrante do Supremo é, também, o único entre seus pares com efetiva vinculação partidária, primeiro no PCdoB e agora no PSB, pelo qual foi eleito senador.  

Dino será ouvido no Senado dia 13 e, diferente do estudante aflito com as sabatinas escolares que eu era, não terá dificuldades de passar por essa prova. A oposição se prepara, entretanto, para fustigá-lo, com artilharia pesada, lembrando a omissão de dados vitais no acordo de leniência da Odebrecht, a presença da Dama do Tráfico no seu ministério, a sonegação de imagens de câmeras do Palácio da Justiça no episódio de 8 de janeiro e a ausência, em mais de uma vez, nas audiências para as quais era convocado nas comissões do Congresso. 

Nada disso impedirá que Dino tenha expressiva votação e sua indicação aprovada, até porque não existem casos de desaprovação pelos senadores dos escolhidos pelo presidente da República. E, assim, Lula, além de dar uma banana aos correligionários que queriam uma mulher, de preferencia negra, na substituição de Rosa Weber, promove no STF o que já é prática nos seus governos: o aparelhamento da instituição, com indicados "terrivelmente" próximos, leais e partidariamente alinhados.

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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