Quando as marcas farão as pazes com o público brasileiro?

De Gabriel Besnos, para coletiva.net

Em um país cada vez mais vocal sobre suas diversas identidades e experiências, muitas delas sendo orgulhosamente representadas na publicidade de marcas líderes nacionais, um certo "Brasil profundo", um tanto quanto ressentido, ainda encontra empresas envolvidas num dilema: continuar a servir velhos estereótipos ou finalmente espelhar a realidade vibrante e multifacetada de sua gente? Acredito que está na hora de as marcas, em geral, decidirem de que lado estão - e não por uma demanda pessoal minha, mas do próprio capitalismo!

Trago exemplos: o culto quase fetichista à juventude, notadamente, é uma das marcas do pensamento etarista na publicidade. Quando uma marca idealiza um único tipo de beleza ou estilo de vida, centrado na juventude, ela demonstra uma profunda desconexão com as transformações sociais. O etarismo, nesse contexto, reduz o valor daqueles que verdadeiramente têm "bolso" para comprar os produtos e serviços, mas cujas vozes são silenciadas nos anúncios. Esse fenômeno desvaloriza a experiência e exclui quem poderia trazer riqueza de vivências para a marca, contribuindo para uma visão de sociedade que desconsidera as contribuições e a capacidade de consumo de pessoas mais velhas.

Da mesma forma, a heteronormatividade nas campanhas publicitárias pinta um retrato obsoleto da sociedade, ignorando a riqueza das relações LGBTQIA+. O racismo estrutural limita muitas vezes a representação de pessoas negras a nichos específicos, e o capacitismo reduz pessoas com deficiência a histórias de superação, ignorando a complexidade de suas vidas diárias. Mais do que isso, uma representação verdadeira exige um compromisso com a profundidade dos afetos, a autenticidade das relações e uma conexão real com os saberes e as ancestralidades de cada grupo representado. As marcas precisam adotar uma postura de aprendizado contínuo com o diverso, engajando-se de maneira horizontal e respeitosa, em vez de se posicionarem como autoridades distantes, impondo mensagens padronizadas e estereotipadas.

Se antes o capitalismo podia se dar ao luxo de ignorar a diversidade, hoje ele é impelido a reconhecer sua centralidade estratégica. Dados do Instituto Locomotiva revelam que R$72 de cada R$100 gastos no Brasil vêm de grupos tradicionalmente marginalizados, destacando não apenas a diversidade demográfica do país, mas também seu significativo poder econômico. Este não é um nicho de mercado menor, mas um segmento central que impulsiona a economia nacional.

Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, enfatiza a necessidade de as empresas entenderem esses dados não como estatísticas distantes, mas como um reflexo vivo da composição do mercado brasileiro. 'Negligenciar a diversidade', ele afirma, 'é negligenciar uma fatia substancial do seu próprio mercado potencial. As marcas que se adaptam a essa realidade e cultivam uma genuína conexão com todos os segmentos da sociedade não apenas sobrevivem; elas prosperam.'

Se há algo que a Agência Bistrô aprendeu ao longo dos anos, é que a diversidade é mais do que um conceito para se exibir em campanhas publicitárias - ela é um pilar fundamental para o sucesso e a inovação. Como a organização mais bem colocada no ranking Great Place To Work (GPTW) 2023 entre as pequenas empresas brasileiras em diversidade LGBTQIA+ e étnico-racial, sabemos que uma equipe diversificada reflete o mosaico da sociedade e é essencial para entender as necessidades do público. Conquistas como essa reforçam a ideia de que uma organização comprometida com a inclusão pode guiar seus clientes na jornada de encontro com o público brasileiro.

As marcas que buscam se conectar verdadeiramente com o Brasil precisam reavaliar suas estratégias de marketing, colocando a diversidade no centro de suas operações. Isso não é apenas sobre justiça social, embora essa seja uma razão importante por si só, mas sobre a maneira mais inteligente de crescer e inovar em um mercado competitivo. Na Bistrô, nossa diversidade interna nos dá uma perspectiva única para criar campanhas que ecoam a realidade das ruas, das casas, da vida cotidiana de milhões de brasileiros.

Fazer as pazes com o público, portanto, significa mais do que incluir; significa entender e respeitar. Significa ouvir ativamente e permitir que as verdadeiras histórias das pessoas inspirem e moldem as campanhas. É uma oportunidade para as marcas se reconectarem com seu público de forma autêntica e colherem os frutos econômicos dessa visão inclusiva. As marcas brasileiras estão numa encruzilhada. Podem escolher o caminho da inovação e da inclusão ou permanecer na confortável, mas obsoleta, zona de exclusão. Fazer as pazes com o público é a única estratégia que garante um futuro vibrante tanto para as marcas quanto para a sociedade brasileira. Não é apenas sobre ser político; é sobre ser relevante.

Gabriel Besnos é sócio-diretor e vice-presidente de Criação da Agência Bistrô.

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