Alice Bastos Neves: Leveza e otimismo

Apresentadora do Globo Esporte tem como premissa de vida ser feliz

Alice Bastos Neves - Felix Zucco

Alice Bastos Neves nunca sonhou em ser jornalista, tampouco em se tornar apresentadora de um programa televisivo esportivo. Porém, o que ela não escolheu, a vida por si só fez a sua parte. Após se formar no colégio, a jovem não tinha ideia do que cursar, então, a aptidão com as disciplinas de Português e História a encaminhou naturalmente para a Comunicação Social, mais precisamente, ao Jornalismo.

Logo após alguns semestres, a estudante se encontrou profissionalmente e percebeu: era exatamente ali que se encaixava. Foi, então, que algumas lembranças da memória retornaram, quando a pequena Alice brincava de entrevistar as pessoas com um microfone que vinha junto de um aparelho gravador de brinquedo. O rádio, a primeira paixão dela, foi o abrigo do primeiro estágio. Na extinta RádioFam, da hoje Faculdade de Artes e Design - Famecos, deu os primeiros passos com a voz pela qual é reconhecida de longe por seu "Boa tarde, gente!". Foram lugares de aprendizado, ainda, o Jornal do Comércio e duas assessorias de imprensa, uma pública e outra privada.

Ao se formar, passou a enviar currículo para todos os lugares. Inclusive, cogitou ir para São Paulo, realizar o processo seletivo da editora Abril. Mas foi na Uffizi que encontrou uma oportunidade. Logo após ser apresentada aos seus clientes e colegas, porém, recebeu uma ligação inesperada. O teste de vídeo o qual realizara havia há alguns dias havia sido avaliado positivamente. Não pensou duas vezes: na outra semana estava acompanhando os colegas da RBS TV para se tornar repórter do extinto programa 'RBS Esportes'.

Grandes Desafios

Apesar de Raul Costa Júnior, então diretor da emissora, acreditar no potencial de Alice, foram muitos os desafios no início da carreira. Depois de dois meses apenas observando os repórteres da casa, gravou o primeiro off e, mais adiante, algumas passagens. "A primeira matéria que fiz para o Bom Dia Rio Grande achei que estava ótima, mas o Raul me chamou na sala dele para dizer que não ia entrar, porque não estava boa", recorda. Algumas frustrações depois e ela seguiu firme e entende, hoje, que todas serviram como estímulo. 

Foi assim que encarou a primeira entrada ao vivo. Enquanto os colegas estreavam em transmissões no veículo do grupo com menor audiência, a TV Com, Alice passou por uma prova de fogo. No dia da final da Copa Libertadores da América de 2007, um repórter ficou doente. O jeito foi chamar a novata para cobrir o que estava acontecendo antes da partida entre Grêmio e Boca Juniors, da Argentina. Foi assim que estreou em transmissões ao vivo com entradas no Jornal do Almoço e Globo Esporte. O que era para ser um pontapé inicial em rede estadual, foi parar na nacional e a jornalista precisou participar do antigo drops apresentado por Fátima Bernardes. Depois de muito nervosismo, chegou ao Estádio Olímpico, antiga casa tricolor, mas se deparou com outra adversidade. Quando o cinegrafista ligou a luz, os torcedores começaram a xingar muito alto o Galvão Bueno, que iria narrar o jogo. A iniciante só pensava: "E agora? O que eu digo? Eu improviso? Eu digo que a torcida está xingando o Galvão?". A sorte, porém, estava ao seu lado. Como os equipamentos foram ligados, despretensiosamente, antes da transmissão, os gremistas cansaram e, na hora em que foi chamada para entrar no ar, eles já ecoavam "Grêmio, Grêmio, Grêmio".

Ao longo do tempo, surgiram outras adversidades, como encarar uma área majoritariamente masculina, como é o Jornalismo Esportivo. Ela, que precisou ganhar espaço e se fazer relevante naquele meio, opinou sobre o privilégio em iniciar a carreira como repórter de outros esportes, e não de futebol. "Os atletas amadores e os olímpicos precisam muito de espaço. É uma relação de troca muito legal", conta, ao afirmar que no futebol é muito diferente, pois foi neste nicho que os grandes desafios surgiram.

Colhendo os frutos

Hoje, quase dois meses após voltar da Copa do Mundo de 2018, Alice não sabe ao certo dizer um momento de sua trajetória que mais a marcou. Além do maior evento futebolístico, que aconteceu na Rússia, também cita a importância e relevância para ela e a equipe em ancorar o Globo Esporte, durante uma semana e meia, ao vivo, diretamente de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. "Como uma emissora afiliada é um feito incrível, um grande desafio técnico", disse sobre o torneio Mundial, realizado em 2017, pelo qual o Grêmio competiu. Também recorda a sua participação nas Olimpíadas sediadas no Rio de Janeiro, em 2016, além da exclusiva com o técnico da Seleção Brasileira, o Tite.

Apesar de ser apresentadora, a inquietude lhe faz, vez ou outra, ir às ruas realizar reportagens nas quais, muitas vezes, viram pautas nacionais. Apesar disso, sabe que é privilegiada por ter um horário normalmente fixo e "mais comum". Quem agradece é o pequeno Martin, de três anos e meio, que adora a profissão da mãe e abana para a televisão quando ela aparece. "Ele contava aos colegas: minha mãe está na Rússia. Enquanto eu chorava de saudades, o Martin estava super bem e orgulhoso de mim", admite.

Jornalista-mãe

De acordo com Alice, as viagens são um grande desafio para uma jornalista-mãe, pois, por um lado, existe a realização profissional e, por outro, o coração fica partido com saudades do pequeno. As coberturas fora de Porto Alegre, aliás, bem como o trabalho na RBS TV só são possíveis graças ao suporte que ela tem. Os pais, Edmundo e Miriam, cuidam do neto durante as oito horas de trabalho da filha. Quando não está nos estúdios, divide-se em cuidar de Martin, com atividades como buscá-lo na escolinha, e as demandas domésticas, como ir ao supermercado, além de comparecer na sagrada terapia.

Com o dia a dia acelerado e devido aos cuidados com o filho, anda desatualizada em relação a filmes, mas consegue admitir que não tem um gênero favorito, só não gosta de terror. Às vezes, as pessoas tentam a convencer, mas, se tem o mínimo de medo, nem chega a cogitar. Outra tarefa que muitas vezes escapa da rotina é comparecer à academia para realizar musculação. "Faço do jeito que dá e quando consigo", confessa ela, ao contar sobre o irmão, Felipe, educador físico, que a cobra sobre o assunto.

Jornalista-filha

Se Alice sempre sonhou em ser mãe enquanto brincava com as bonecas, isso se deve ao exemplo materno que teve. Em uma época na qual cursar alguma faculdade sobre exatas era algo masculino, Miriam se formou em Engenharia Civil em uma universidade federal, apenas para provar sua capacidade e, ao segurar o canudo, o dedicou aos filhos, ainda crianças, salientando a importância dele.

Como Miriam desejava mesmo ser professora, ainda cursou Pedagogia, orientando ainda mais a filha. Na infância, Alice fez aula de música, quando teve contato com canto, violão e teatro; depois, participou da escola de Artes da Ufrgs, onde tinha escultura e pintura. Contudo, o que mais a cativou foi a dança, desde ballet até a contemporânea. "Atualmente, é uma frustração não conseguir dar seguimento a esta paixão, porque eu amo", confessa.  A adoração era tão grande que, após alguns semestres cursando Jornalismo, passou na federal para Educação Física - pois queria dar aula de dança. Ao ingressar na RBS TV, no entanto, precisou trancar o curso.

Pelotense, a jornalista veio para Porto Alegre com quatro anos. Dos momentos vividos no Sul do Estado recorda a casa que os pais construíram. O recanto possuía uma cancha de areia, onde ela e o irmão brincavam, pintavam as paredes, além de tomarem banho de lama. Quando chegou à Capital, o lar diminuiu, mas o quintal continuou grande. "Meu pátio virou a Redenção, porque cresci no Bom Fim, onde eu moro até hoje, e que não quero deixar", expôs. Das memórias do Parque Farroupilha, ainda rememora quando aprendeu a andar de bicicleta sem rodinhas. Edmundo desafiava a filha: ele apostava corrida e, caso a pequena ganhasse, comprava um saco de pipoca como recompensa.

Extracampo

Fora do ar, Alice gosta de estar com os amigos e familiares. Ter muitos lugares para acomodar todo mundo na sala é fundamental para ela que adora realizar reuniões em casa. Assim como a comida favorita, ala minuta com a gema mole, se diz melhor preparando refeições simples do que quando deseja fazer um prato elaborado.

Mesmo fora das telinhas, Alice não deixa a caixinha mágica de lado. Além de acompanhar os mais variados programas jornalísticos e esportivos de diversos canais para se inspirar, assiste, quando pode, os jogos de basquete da liga americana NBA. Outro esporte que a agrada é o vôlei, pois o praticava desde pequena com o pai.

Ainda em frente à televisão, são as séries que a fazem parar por alguns momentos. "Assisto tanta bobagem que até fico com vergonha de falar", brinca, mencionando o gosto por 'Modern Family', uma trama cômica, pois é curta e leve. Focada, antes de embarcar à Rússia, assistiu a vários títulos sobre o país, dentre eles 'O Império dos Czares'. Após voltar, ainda não se apegou a algo, além de finalizar a primeira temporada do drama que a conquistou, 'Big Little Liars'.

A leitura é outra parte importante da vida: consome tudo o que para na sua mão. Desde 'Harry Potter', passando por biografias, até algo mais denso, como 'Sapiens' e 'O Poder do Hábito'. No momento, é 'Noites de Alface', de Vanessa Barbara, que ocupa a cabeceira. Sobre outra arte, a música, gosta do que se produz em território nacional bem mais do que em internacional. Cresceu em uma casa em que Bossa Nova, MBP e música gauchesca embalavam a família Neves. Mas o que Alice adora mesmo é descobrir novos artistas brasileiros. 

Ser feliz, sempre

Católica praticante, comparece à missa com frequência. Foi criada dentro dos preceitos desta religião cristã, e esta identificação tem muito a ver com a referência de padre que tem, o Monsenhor Urbano Zilles. Ainda, avalia a importância que a igreja que frequenta, Nossa Senhora do Líbano, tem na vida dela: "É importante ter fé em alguma coisa", pondera.  

Enquanto se diz insegura, defeito que busca amenizar na terapia, a apresentadora do Globo Esporte também se considera sincera e natural. Otimista e fácil de se adaptar a diversas situações, ela revela que criou um lema de vida. Recentemente mandou bordar em uma camiseta: "Ser feliz ou ter razão? Ser feliz, sempre". "Não vale a pena brigar apenas para impôr tua posição, mas, sim, ponderar e abrir mão. Ser alegre é bem mais legal!", garante.

Alice sabe que conquistou o público desde o início e, graças a isso, vem construindo uma história com credibilidade e solidez no Jornalismo Esportivo. Por isto, quando percebe onde chegou, questiona-se sobre o que fez para merecer tanto. Tudo isto porque vive o momento. Enquanto muitos planejam o futuro, ela se dedica a pequenos projetos e os realiza pouco a pouco. E, assim, preenche a telinha com simpatia e sorriso largo.

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