Analice Bolzan: Múltipla e tão singular

Passou por muitas áreas, diferentes faculdades, tem muitos apelidos. Ela realmente não gosta de tudo sempre igual

Profissionalmente, ela é a Analice Bolzan. Para as relações de Porto Alegre, é apenas Ana. Na família, a menina que inventava apelidos para todo mundo deu um a ela mesma, então, é chamada de Taíti, inclusive pelos amigos deixados na cidade natal, Osório. Os 10 sobrinhos não se acostumaram a chamá-la de tia. Para eles, ela é a Táta. Uma mulher de múltiplas denominações é também alguém que nunca se acomoda, adora um desafio e acredita que pode ser e exercer uma infinidade de papéis na vida. A mãe do Lorenzo, de 16 anos, ama a maternidade, as amizades, a família, a profissão que escolheu. Definitivamente, ela ama a vida.

É jornalista formada pela Ufrgs e bacharel em Direito, pela PUCRS - claro, não poderia ter apenas uma profissão -, além de especialista em Cine Vídeo, pela Unisinos, onde chegou a lecionar Telejornalismo. Na área jurídica, nunca atuou, mas garante que a graduação lhe rendeu conhecimentos que auxiliam no dia a dia da diretora responsável pela organização de eventos e implantação do projeto de endomarketing no Poder Judiciário do Estado. Na Comunicação, bem, não seria diferente: ela atuou em várias funções, de produtora, passando por repórter, editora, apresentadora e, também, gestora. Isso tudo em diversas áreas: TV, assessoria de imprensa, TV universitária, mídia digital, comunicação interna e até uma breve passagem por rádio, quando atuou ao lado de Bira Valdez, quando este fundou a rádio Sogipa.

Analice acredita no Jornalismo como instrumento de transformação social para mostrar e refletir sobre a sociedade, por isso, o coração nunca deixou de bater, nem o olho de brilhar pela profissão. "Ter atuado em diversas áreas me mostra que é possível exercer o espírito jornalístico, aquela alma de repórter, nas diferentes atividades", resume. A informação não passa apenas pela atuação diária, pois ela é uma consumidora voraz de notícias, especialmente as locais. Mesmo sabendo que precisa estar atenta ao que acontece no mundo, é pela província que se interessa mais.

Estar em família

Ela ama trabalhar, mas nada lhe dá mais prazer do que poder curtir o filho, a mãe, os irmãos, os sobrinhos e, ainda, os sobrinhos-netos. A família, que é base e porto seguro, é bem grande. A caçula de cinco irmãos, ou 'a rapa do tacho', como ela brinca, admite que foi bastante mimada pelo Romildo Júnior, pela Mariane, pela Luciane e pelo Marcos (falecido recentemente). A mais nova da professora Mari e do professor e advogado Romildo traz na memória a casa sempre cheia. E não apenas por eles, mas pelos amigos de todos, que sempre frequentaram o lar. "Amizade é uma bênção, é o nosso ferrolho da vida", define.

Amigos e a família de origem ganham sempre um espaço na agenda, mas tem alguém que não precisa nem pedir pela sua atenção, ela é todinha dele. Lorenzo dá à mãe o orgulho mais genuíno que existe, pois, segundo ela, "é uma geração bonita de ver e acompanhar". Às vezes, chega a incentivar que o filho curta mais a adolescência e se preocupe menos com assuntos tão intensos, como guerras e sustentabilidade. "Eles têm uma visão de mundo diferenciada. É uma fase em que eles, adolescentes, nos colocam em xeque para repensar muitos aspectos da vida", reflete.

O pai do Lorenzo, o advogado Rogério, faleceu quando o menino tinha sete anos. Desde então, são apenas mãe e filho. E foi o próprio herdeiro que se deu conta e alertou Analice: a dupla já tem mais tempo sem Rogério do que com ele em vida. Por outro lado, garante que foi deixado muito amor e tantas coisas boas para o menino. "Falamos nele sempre com muito carinho e de forma natural, trazendo para o nosso dia a dia. Sem endeusar, mas com lembranças sempre gostosas", recorda. 

E por falar na grande família, tem algo que une eles todos ainda mais - e traz zero surpresa aos leitores: a paixão tricolor. Seu Romildo foi conselheiro do clube por muitos anos e o irmão mais velho dela é o atual presidente do Grêmio. Não poderia ser diferente: Analice frequenta estádios desde muito nova. O primeiro jogo, inclusive, nunca esqueceu. Foi em 1977, quando o time do coração saiu vitorioso de um Campeonato Gaúcho. E a estreia in loco só aconteceu depois de um tradicional almoço no Mosqueteiro (restaurante que ficava nas dependências do Olímpico Monumental). Começou sendo levada pelo pai, depois passou a ter a companhia dos primos, das amigas e tantas outras vezes foi sozinha mesmo. Hoje, porém, ir à Arena tem uma novidade deliciosa, a companhia de Lorenzo.

A primeira 'menina do tempo'

Entre tantos nomes e apelidos, tem um título que marcará o currículo para sempre, afinal, Analice foi a primeira apresentadora do tempo na RBS TV. Criada no projeto Caras Novas da empresa, a jornalista atuava no Centro de Produção de Notícias quando foi desafiada por Raul Costa Júnior a fazer um teste para o quadro que estava sendo implementado na programação. A resposta foi imediata: "Pode ser agora?". E foi assim, com toda segurança que lhe é peculiar até hoje, que a jornalista estreou dois dias depois. 

"Eram várias inserções durante o dia, então, foi uma superdedicação e um baita desafio, pois ainda existia certo preconceito com o conteúdo meteorológico", conta. Aos poucos, foi inserindo matérias que uniam a previsão do tempo à importância para a Economia, os costumes e o comportamento do dia a dia do público. "Uma baita de uma experiência", garante ela, que seguiu carreira na frente da câmera, permanecendo por mais de 10 anos entre diversos programas da emissora e também da irmã TVCom.

Na trajetória, aliás, a televisão voltou a ser seu ambiente em diversas oportunidades, como as emissoras universitárias. É que Analice participou da elaboração e montagem da TV Universitária da PUC, ao lado de Flávio Porcello, a quem dá os títulos de grande amigo e referência profissional. "Ele me faz muita falta, deixou uma lacuna enorme na minha vida", lamenta, em um raro momento de voz embargada (Porcello foi vítima da Covid-19, em novembro do ano passado).

E esse mundo acadêmico não parou na Famecos, pois ela ainda participou da equipe que montou a TV Unisinos, quando esta fez parceria com o Canal Futura. "Foi uma experiência muito prazerosa e de bastante realização. Trouxemos a realidade da comunidade local para dentro da emissora e oportunizamos grandes aprendizados aos estudantes", orgulha-se. Terminou? Claro que não. O meio televisivo voltaria com o convite de atuar na TV Justiça. Com a criação do Centro de Produção da Justiça Federal (CPJUS), estreou o programa Via Legal, um dos grandes orgulhos da jornalista. Isso porque a emissora foi agraciada com o Prêmio Esso de Jornalismo e Prêmio de Direitos Humanos - troféus que faz questão de deixar expostos em casa. 

O outro lado do balcão

Como seu Romildo teve alguns mandatos como deputado estadual, e ele e dona Mari ainda moravam em frente à Assembleia Legislativa do Estado, o ambiente político sempre foi bastante natural para Analice, que veio para Porto Alegre aos seis anos e vivia no trabalho do pai. "Era um lugar mágico para mim. Entrava na redação da Assembleia e achava tudo encantador", lembra a fã da novela 'Malu Mulher'. O folhetim da Globo tinha como protagonista uma jornalista, a quem Analice imitava colocando um óculos na cabeça e uma bolsa a tiracolo. Ou seja, ela não brincava de boneca, brincava de ser jornalista.

Bem, mas era inevitável que a política batesse à sua porta. E quando chegou, ela aceitou e foi trabalhar em campanhas eleitorais em Santa Catarina. Poderia ter se envolvido ainda mais? Claro que sim, porém preferiu escolher a profissão que exigiria certo distanciamento do tema, afastamento da vivência partidária, visão crítica e análises de contextos. "Senti que era importante trabalhar também em outras frentes. E foi o que eu fiz por diversas vezes", relata.

Atuar no chamado 'outro lado do balcão' veio quando assumiu a assessoria do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Dessa passagem, não há dúvidas, o maior desafio foi o julgamento do ex-presidente Lula. Precisava atender aos quase 500 veículos que cobriram aquele momento, montando uma estrutura grande de transmissão direta, buscando a isonomia de tratamento entre pequenos e grandes veículos. A lista de trabalho foi intensa, mas diretamente proporcional ao prazer em ter realizado um trabalho sério, sistemático e processual. De lá pra cá, mudou o Tribunal, mas não a área.

Antes de chegar ao Tribunal de Justiça, passou ainda pela assessoria da Famurs, que oportunizou conhecer ainda mais o Interior do Estado, a vivência dos municípios e diversas conversas com os assessores de imprensa de todas as prefeituras. "Foi enriquecedor, pois são realidades completamente diferentes", resume. Falta alguma coisa ainda? Sempre. Segundo ela, o Jornalismo propicia isso. "O importante é não perder o sangue e o coração de repórter, identificar o que é notícia, pois o canal a gente adapta. O que não muda é o conteúdo, nem a essência", ensina.

O que ganha atenção

Como uma boa menina de Osório, a praia é seu habitat natural, é onde ama estar e se sente em casa. Completa o cenário ideal, claro, se a família estiver toda reunida. Mas não podendo estar sempre no litoral, quando chega em casa, a principal tarefa é simples e cheia de significados: conversar com Lorenzo. Com a rotina e horários diferentes de ambos, eles passam o dia sem se ver, por isso, quando a noite chega, vem junto a sede de colocarem o assunto em dia. 

Aos ouvidos não fazem bem apenas notícias, mas muita música. Da geração do rock'n'roll, porém criada ao som de muita MPB, Analice se diz eclética e desprendida de preconceitos com o que é novo. "Claro que alguns estilos não me ganham tanto, mas não deixo de ouvir nada", garante. Não é adepta à moda das séries, mas ama cinema. No entanto, o que realmente ganha atenção são os livros. Sequer consegue citar apenas um, pois adora dicas de leitura, sendo a última 'A uruguaia', de Pedro Mairal.

Gosta muito de cozinhar e recebe elogios neste quesito. Na lista de habilidades culinárias entra de tudo, desde o trivial do dia a dia, passando por massas, peixes e até mesmo o comando da churrasqueira. Lorenzo, porém, optou por ser vegetariano, o que tem causado à mãe muitos desafios interessantes para descobrir novidades do cardápio sem carnes. O que ela gosta mesmo é do ritual: preparar tudo, ouvindo música e conversando com as pessoas na volta. "É terapêutico", explica. 

Por mais que o famoso "fazer nada" seja importante, não consegue nem tem a pretensão de chegar lá, como brinca. Ela gosta mesmo é de estar em movimento, seja no trabalho, seja na vida pessoal. Pelos olhos e pelas palavras dela mesma, Analice é "a mãe do Lorenzo, orgulhosa do que o filho está construindo; a jornalista que tenta manter essa alma de repórter; alguém que preza muito a família e os amigos, que gosta de estar junto e sente um prazer incrível de conviver com pessoas. E que tenta manter o brilho no olho para tudo na vida".

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