Lucas Uebel: Cliques imortais

Fanático pelo time desde pequeno, fotógrafo do Grêmio produziu imagens que ficarão para sempre na história do clube do coração

São cerca de 50 quilômetros entre o Olímpico Monumental e Novo Hamburgo. Distância que é um mero detalhe para ele, que segue o time do coração desde sempre. Quando os torcedores gremistas entoam "Este amor descontrolado, nunca vou deixar de lado. Sempre junto ao Tricolor, eu te sigo aonde for", parece que estão narrando a vida de Lucas Uebel, que pegava o pai pela mão e, se fosse preciso, "até a pé" iria acompanhar os jogos.

No início da Zona Sul de Porto Alegre, presenciou diversos momentos marcantes, como a final da Copa do Brasil de 1994, no jogo contra o Palmeiras, com um placar de cinco a zero para o tricolor gaúcho. "Sempre frequentei o Olímpico, mesmo não sendo de Porto Alegre, mesmo não sendo sócio", conta. 

Passados os anos, o endereço do Grêmio trocou e, agora, a Zona Norte é o ponto de encontro dos torcedores, na Arena. O que não mudou foi a paixão dele pelo time. Pelo contrário. Afinal, hoje, aquele guri que seguia o clube desde pequeno imortaliza títulos e glórias dessa mesma equipe, por meio de suas lentes, e é conhecido como "Lucas Uebel, o fotógrafo do Grêmio".

Uma câmera no meio do caminho

O início desta história, entretanto, começou bem distante das mesmas lentes que capturam os grandes momentos do time. Apaixonado por esporte e especialmente por futebol, Lucas viu no Jornalismo uma forma de se aproximar do mundo onde sempre sonhou em trabalhar - visto que, como jogador, não deu certo. Mas, logo no começo, o gosto foi apenas uma motivação. Formado em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul em 2006, fez estágio em assessoria de imprensa, assessoria de produção de TV e trabalhou no Grupo Sinos.

A única experiência com foto que teve naquela época foi durante a faculdade, nas cadeiras de Fotojornalismo, com os professores Elson Sempé e Júlio Cordeiro. "Até foi uma passagem que nunca me esqueço: em 2004, o Júlio tinha vindo da Olimpíada de Atenas, e na aula nos mostrou essas imagens e a fotografia do esporte me chamou muita atenção", recorda.

Depois de formado, em 2006, uma viagem para a Nova Zelândia, que seria para estudar inglês e viver novas experiências, despertou em Lucas um lado que nunca mais o abandonaria: o de fotógrafo. Isso porque foi do outro lado do mundo que comprou a primeira câmera e decidiu como seria o futuro: trabalhar com fotografia. Mais especificamente, fotografia de futebol.

O desejo, contudo, estava bem longe de ser atingido com facilidade. Quando retornou, começou a procurar oportunidades, mas o mercado era muito fechado. Ao falar com o ex-professor Sempé, conseguiu o contato de Jefferson Bernardes, da Agência Preview. Após muita insistência, descobriu que o dono da empresa precisava de alguém para cobrir os treinos do Grêmio. Coincidência ou obra do destino?

Lucas ainda trabalhou mais uma vez com jornalismo, na editoria de Geral, para o jornal 'O Sul', da Rede Pampa, mas, dessa vez, como fotógrafo. Na época, ele acabava se dividindo entre os dois trabalhos. E foi assim até 2010, quando o Grêmio trocou o profissional responsável pelas imagens do clube, tornou aquele mesmo guri novo-hamburguense, fanático pelo time, o mais novo contratado para o plantel gremista.

Cliques eternizados

Depois de mais de 15 anos sem títulos de grande expressão, o tricolor gaúcho conquistou pela quinta vez, em 2016, a Copa do Brasil e, no ano seguinte, o tricampeonato da Copa Libertadores da América. Quem foi o responsável por eternizar esses momentos? Exatamente ele mesmo. 

Um de seus cliques favoritos, inclusive, foi em 2017, quando imortalizou uma defesa do goleiro Marcelo Grohe. "Gosto muito porque foi um pós-defesa e a foto captura todas as expressões dos torcedores no estádio, com caras de chocados com um milagre que presenciaram", explica. Lucas começou também uma tradição, ao sugerir que a dupla de zaga Pedro Geromel e Walter Kannemann beijasse a taça da Copa do Brasil. De lá para cá, muitos outros cliques com os dois jogadores beijando as demais taças conquistadas foram feitos.

Entretanto, nem tudo foram flores. Durante uma partida da Libertadores, em 2013, realizada no Chile, houve um problema com o time local devido a uma provocação do técnico da época, Vanderlei Luxemburgo. "Estava saindo do campo e, quando olhei, ele estava correndo e a confusão toda foi atrás. Todo mundo começou a brigar e eu estava em cima de um banquinho, cheio de 'tralha'. Não sabia como desviar e senti um impacto muito forte na minha cabeça. Então, percebi que tinha levado uma pedrada", rememora ele, ao admitir que, na realidade, o que achou que seria uma pedra era, na verdade, uma garrafa plástica. 

Para além do Grêmio

Além dos cliques tricolores, outros momentos deixaram Lucas muito orgulhoso. Exemplo disso são as fotos que produziu durante a Paraolimpíada do Rio de Janeiro, em 2016, o que considera ter sido uma oportunidade única. Afinal, fotografou para a internacional Getty Images e trabalhou bastante para o Comitê Olímpico do Catar, bem como cobrindo outros esportes e países. "Fiz muitas fotografias legais, que me renderam muito reconhecimento. Uma das fotos, inclusive, foi selecionada pelo 'The Guardian' como uma das imagens do ano na categoria esportes."

Todavia, um dos momentos de mais satisfação, sem dúvidas, foi cobrir a Copa do Mundo em 2014, realizada no Brasil. "Acompanho desde pequeno, tem foto minha com dois anos, vestido com a camisa da seleção brasileira na Copa de 1986. Sempre foi um evento pra mim e parava tudo para assistir", aborda. Ele cobriu os cinco jogos em Porto Alegre e, em paralelo, também fez trabalhos para a Agence France-Presse (AFP) de acompanhamento ambiental dos jogos do Brasil, como, por exemplo, da Fan Fest.

Fora do âmbito esportivo, outro destaque da carreira aconteceu durante a pandemia de Covid-19. Como continuava em contato com a Getty como freelancer, integrava um grupo para tratar sobre pautas e uma delas era sobre o registro das cidades vazias devido ao lockdown. Um dia, saiu de manhã para retratar os pontos de Porto Alegre e foi em várias partes do município.

"Uma foto que deu bastante repercussão foi em cima do viaduto da Rodoviária, que é sempre muito movimentado. Então, fiz a foto e ficou o contraste dos prédios da cidade e a rua vazia", explica ele, que teve essa mesma imagem usada pela banda Green Day durante o 'One World Together At Home' - festival musical e on-line que aconteceu durante aquele período. Conforme Lucas, ele estava em casa e amigos começaram a mandar mensagem, avisando que haviam usado a foto dele, o que o surpreendeu (positivamente, claro).

Vinho & Rock'n'Roll

Este momento foi ainda mais marcante porque Lucas gosta muito da banda norte-americana responsável pelo hit 'Wake me up when september ends'. Rock, aliás, é o gênero favorito dele, que se enxerga como uma exceção no mundo futebolístico, onde o que predomina são o pagode e o sertanejo. Além de Green Day, ele cita como parte da playlist CPM 22, Legião Urbana e Foo Fighters. 

Em relação à telinha, assiste a bastantes séries, tanto quando está em casa, e ganha a companhia da esposa, Alice, a exemplo de 'This is Us', assim como nos momentos em que está viajando e acompanha tramas que são mais de ação e aventura - além, é claro, de documentários esportivos. O mesmo vale para filmes, visto que adora ver as produções da franquia 007 e já conferiu tudo que foi lançado com o detetive James Bond.

Nas horas de folga, Lucas não abre mão também de tomar um bom vinho. "Não sou um enólogo, mas gosto de sempre experimentar. Nos anos em que íamos para Argentina e Chile, sempre trazia uma e outra garrafa desses países que são tão tradicionais na área", comenta.

Outro hábito que aprecia muito é o de fazer churrasco, pois adora a função de reunir os amigos e a família, enquanto fica na churrasqueira assando a carne e conversando. Entretanto, os dotes culinários não param por aí. Afinal, considera-se um cozinheiro amador e sempre tenta se arriscar a inovar nas receitas. "Quando estou em casa, a cozinha é comigo. Então, testo pratos novos, experimento novidades e uso o pessoal aqui de casa de cobaia", brinca ele, que cita como especialidades um risoto de filé aos quatro queijos, além do tradicional estrogonofe.

Dedicação à família

Quando não está com a câmera nas mãos, é ao lado da esposa e da filha, Luiza, de três anos, que Lucas pode ser encontrado. "A gente passa tanto tempo longe, que quando não estou trabalhando, me dedico bastante, brincando e aproveitando para nos divertirmos sem preocupação", pontua.  

A herdeira, inclusive, é fruto de dois apaixonados pela fotografia, que se conheceram devido a esse gosto. Casados desde 2013, Lucas e Alice se encontraram em 2007, por causa do antigo chefe e amigo Jefferson, e frequentaram o setor de Foto do Palácio Piratini na mesma época. Também jornalista fotográfica, hoje ela trabalha com eventos e fotografa ensaios e festas.

Filho mais novo de Carlos e Beatriz, o fotógrafo é o caçula dos irmãos Rafael e Juliano. Da infância em Novo Hamburgo, recorda das reuniões de família em casa e da companhia dos primos. Considera essa época como muito boa, uma vez que sempre morou no mesmo lugar e brincava na rua com os amigos e primos, e jogava futebol. Inclusive, até hoje, sempre que pode, joga uma partida. Afinal, "fotografar é bom, mas jogar às vezes também dá vontade".

Simplicidade e muitas realizações

Ao se considerar um cara bem simples e que gosta muito de ter contato com as pessoas, é um apaixonado por fotografia, jornalismo e esporte. "Tento traduzir a paixão pela minha profissão diariamente com tudo o que faço." Enxerga como qualidade ser amigo e fiel, bem como alguém que não falha com quem convive e que gosta de olhar nos olhos das pessoas, e falar a verdade. Em relação ao defeito, acredita que seja muito crítico consigo, pois nunca está satisfeito com o que faz, sempre pensando que pode fazer mais e melhor.

Apesar de toda essa crítica, Lucas olha para trás e se sente muito realizado com tudo o que viveu e conquistou ao lado do clube que tanto ama. "Adoro viajar. Às vezes cansa, mas é bom. Fui ao Mundial de Clubes, uma experiência que não me esqueço. Fazer fotos lá do outro lado do mundo foi incrível", diz, orgulhoso.

Para o futuro, deseja investir mais em seu canal do YouTube, local onde conta histórias sobre fotografia, assim como experiências profissionais e dicas técnicas. "Sempre gosto de compartilhar, até para quem está com aquela dificuldade que tive no começo, de encontrar um mercado fechado", explica ele, que também ministra cursos em parceria com o FootHub.

Tudo isso com o intuito de mostrar que quem está por trás das câmeras tem uma história para contar e não somente sobre aquelas imagens em si. "Mostrar que a foto tem valor e quem está ali produzindo também tem": é o principal objetivo dele. E deste texto também.

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Editora

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