Mário Alberto Gusmão: Perseverança e independência

Fundador do Grupo Sinos, Mário Gusmão continua na ativa aos 69 anos e articula a transição da diretoria da empresa para as mãos dos filhos e sobrinhos.

Mário Alberto Gusmão, 69 anos, dedica-se há 49 para o Grupo Sinos, empresa que fundou junto com o irmão, Paulo Sérgio Gusmão. "O mano faleceu há oito anos, mas sempre fomos nós quem administramos o negócio, desde o primeiro jornal", faz questão de lembrar. A trajetória de sucesso do empreendimento de comunicação teve início na cidade natal da família Gusmão, São Leopoldo. Hoje, seus periódicos, revistas e emissoras de rádio abrangem 45 municípios do Estado, chegando a Região Metropolitana de Porto Alegre, ao Vale do Sinos, ao Vale do Caí, ao Vale do Paranhana, à Serra e parte do Litoral.


A história da vida de Mário confunde-se com a história do Grupo Sinos. Apesar das origens humildes, seu fascínio pela imprensa lhe fez cultivar sonhos ambiciosos já na juventude. Filho de Maria Emília de Paula e órfão de pai desde muito pequeno, ele é o caçula de quatro irmãos e precisou trabalhar cedo para ajudar no sustento da família. Os estudos não foram prioridade, "não cheguei a completar o ginásio", revela. Preferiu empenhar-se na busca de atividades que lhe proporcionassem renda. Adolescente, uniu o útil ao agradável fazendo a entrega de porta em porta do jornal Estado do Rio Grande - produzido na época pelo Partido Libertador - e, posteriormente, assumindo o cargo de "faz tudo" em uma emissora de rádio local.


Cabeça nas nuvens, pés no chão


Em 1957, com 21 anos, o caçula investia na abertura do jornal SL junto com o irmão Paulo Sérgio, que atuava como representante comercial no setor coureiro-calçadista. O projeto ousado deu certo. São Leopoldo ainda não tinha um jornal forte e recebeu muito bem a novidade. "Nós éramos repórteres, fotógrafos, gráficos, entregadores, fazíamos tudo. E, no começo, as edições eram semanais", relembra Mário. A família Gusmão tinha grande participação na rotina da cidade. Sua mãe, Emília, foi presidente da Cruz Vermelha local por 30 anos. Também foi eleita vereadora e, em 1959, tornou-se prefeita.


Os feitos da mãe influenciaram de forma positiva os dois filhos que, a esta altura, colhiam os primeiros frutos da produção do SL. "Ela nos mostrou a importância de pensar nas outras pessoas. Foi inspirados nela que adotamos a política editorial da prestação de serviços", conta. Em 1960, os irmãos fizeram uma nova aposta. Fundaram um segundo jornal, batizado NH, na cidade de Novo Hamburgo, por acharem que lá havia um potencial econômico maior. Quando a nova publicação começou a circular, o Grupo Sinos era apenas um embrião e fazia uso de serviços terceirizados. Simultaneamente, o SL continuava circulando em São Leopoldo. "Já era um império funcionando", brinca Mário.


Instalados com seu escritório em Novo Hamburgo, em 1967 adquiriram equipamento para montar uma gráfica própria. "Foi aí que lançamos o primeiro jornal impresso em off-set na região Sul do país", ressalta orgulhoso o fundador. A essa tecnologia, ainda pouco conhecida na data, eles tiveram acesso durante o golpe militar, em 1964, através de um repórter do jornal, Rodrigo Silva. "Ele pertencia ao grupo do Brizola e, quando estourou a revolução, fugiu para o Uruguai", narra. Do país vizinho, Rodrigo escreveu uma carta aos patrões enviando junto um tablóide impresso em off-set. Na carta, perguntava "quando o nosso NH terá essa qualidade de impressão?". A provocação foi recebida com entusiasmo, visto que os irmãos adoravam desafios. "Tivemos crescimento porque acreditamos no nosso projeto desde o primeiro número e tivemos foco no nosso trabalho", avalia.


Tanta perseverança despertou a atenção de empresários e políticos locais. "Não faltou gente nos fazendo convite para integrarmos sociedade de fábricas de sapato ou assumirmos cargos políticos", lamenta. Convicto, ele diz nunca ter aceitado por prezar a independência editorial das publicações do Grupo Sinos que, apostando sempre na busca de assinantes, foi conquistando um grande número de leitores ao longo dos anos. De fato, como previam Mário e Paulo, a região era próspera e o negócio ganhou grandes proporções. Os jornais se multiplicaram e impressos especializados no setor coureiro-calçadista foram criados. Hoje, a empresa é uma das maiores do Estado na área da comunicação.


Tudo em casa


Apesar de sempre ter trabalhado em família, Mário não considera essa uma maneira de conciliar a profissão com a vida pessoal. Ele conta que sua esposa, Iara Maria Adami Gusmão, 62, com quem está casado há 42 anos, várias vezes manifestou interesse em atuar no Grupo Sinos junto dele. "Mas eu nunca permiti", ressalta, explicando que tal decisão prejudicaria o convívio do casal. Desde a fundação da empresa, muitas demandas o obrigaram a privar-se da companhia de Iara e dos dois filhos nas horas mais inadequadas e, embora ele admita que se dedica mais aos negócios do que à família, afirma que valoriza muito o tempo que passa em casa. Iara, que é professora aposentada, hoje se dedica à confecção de bolsas, um hobby.


O executivo diz que o caminho da sua residência até a sede do Grupo é feito diariamente por ele de maneira quase automática, natural. O trajeto é repetido até mesmo nas férias, quando ele acompanha os funcionários em almoços e conversas. "Gosto de estar aqui", assegura sentado à mesa da sala de reuniões. Apenas duas coisas são capazes de desviá-lo dessa rotina: o esporte e as viagens. "Adoro jogar tênis", revela. Joga pelo menos uma vez por semana, na hora do almoço ou após o expediente, "para não interromper o serviço". 


Vice-presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e diretor da Sociedade Inter-americana de Imprensa (SIP), Mário viaja seguidamente para congressos e eventos das entidades que representa. Sempre a trabalho. "E sou crente", brinca, ao relatar que participa das atividades sem relaxar. O contato com profissionais de outras cidades é visto por ele como uma forma de lazer. "Renova as idéias, faz bem demais", complementa. Seu gosto pela vida profissional vem crescendo nos últimos anos. Embora tenha planejado apenas sossego e uma condição financeira estável para depois dos 60 anos, acredita que é justamente o cotidiano atribulado que tem lhe garantido "saúde, atenção e firmeza". 


Arauto das boas coisas


O objetivo é diminuir o número de tarefas sem desligar-se do grupo de comunicação e realizar, gradativamente, a transição da diretoria executiva para as mãos de seus sucessores: os dois filhos, Fernando Alberto, 40, e Carlos Eduardo, 39, e os dois sobrinhos (filhos de seu irmão Paulo Sérgio), João Frederico e Sérgio Luís, que já assumiram os cargos. Assim, o patrimônio construído permanecerá com a família Gusmão durante pelo menos mais uma geração.


"Estou tentando me adaptar a essa nova condição, mas ainda não consegui. Estou acostumado a trabalhar muito", admite. Mas enfatiza: "Quero que essa mudança aconteça enquanto eu estiver vivo". O processo teve início há dois anos, com a criação de um conselho de administração composto por pessoas da comunidade convidadas por Mário. Desde então, os novos diretores conduzem a empresa prestando contas ao conselho através de planejamentos e relatórios. "Chamei pessoas de fora para criar uma administração formal. Se não, ia ser papai para cá, titio para lá?", justifica.


Todavia, é com muito orgulho que ele fala da vinda dos filhos para o Grupo. "Aconteceu de forma natural, eles sempre se interessaram pelos negócios", recorda. Para Mário, o mérito está em terem começado pelas funções de repórter do jornal e técnico na área de informática, chegando à administração alguns anos mais tarde. Atualmente, Carlos Eduardo é o diretor superintendente da empresa e Fernando Alberto é o diretor dos jornais especializados em sapatos e coordenador do setor de informática. Mas o pai continua por perto: "Acompanho tudo à distância", assinala.


O compromisso comunitário das publicações do Grupo Sinos, "fundamental na consolidação da empresa", é um assunto que o fundador não abre mão de discutir. "Devemos o sucesso que tivemos a esse aspecto", afirma com segurança. Para o futuro dos veículos de comunicação que criou, deseja que o bom desempenho conquistado seja mantido e que seus sucessores dêem continuidade à prestação de serviços desenvolvida até então. "Um jornal tem que ser um elemento propugnador de coisas boas para a sociedade, um instrumento de luta para que essas coisas aconteçam", define.

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