Milene Santos: Em busca de autoconhecimento

Da dança dos primeiros passos à liderança nas grandes campanhas, ela fez da Publicidade uma paixão

22/08/2025 18:10 / Atualizado em 22/08/2025 18:45
Milene Santos: Em busca de autoconhecimento /Crédito: Estúdio Mythos

Foi numa daquelas tardes quentes de inverno que a diretora de Marcas e Negócios da HOC House Of Creativity, Milene Santos, recebeu a reportagem para esta entrevista de perfil. Entre goles de café e água fresca, a conversa de duas horas aconteceu na sala temática da Disney, na nova sede da agência, em pleno Moinhos de Vento.

O espaço, envolto em símbolos de magia e sonhos, parecia um reflexo do que viria a seguir. A escolha não foi ao acaso: Mi, como gosta de ser chamada, aprecia a vista privilegiada dali, onde o verde acalma e inspira. Talvez seja mesmo simbólico começar esta história em um cenário que une tranquilidade, inspiração e sucesso, os mesmos ingredientes que marcam sua trajetória.

Milene Silveira dos Santos veio ao mundo no dia 27 de fevereiro, em Viamão, filha de Otávio e Madilene, irmã do meio entre três. Do pai, eletrotécnico e administrador, guardou o senso de responsabilidade. Da mãe, que reinventou a própria vida ao se formar em Psicologia depois dos 50 anos, aprendeu que nunca é tarde para recomeçar.

A infância, nos anos 1980 e 1990, foi feita de brincadeiras e explorações nas ruas, livros que despertavam mundos, música sempre presente e o verde da natureza como quintal. Aos seis anos, foi ela quem pediu para calçar as sapatilhas de balé, e ali começou um amor pela arte que jamais a abandonaria.

Boa aluna, embora mais curiosa que aplicada, deixava-se guiar pela inquietação. Lia sobre Jornalismo, Teatro, Propaganda; fazia testes vocacionais, sempre apontando para a Comunicação. Quando chegou a hora da escolha, percebeu que não seria bailarina profissional, como sonhava em silêncio. Preferiu abrir outro palco: o da Publicidade e Propaganda, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), aos 17 anos. ?Amor à primeira vista. Não me vejo fazendo outra coisa?, diz, ainda hoje.

A escolha pela Comunicação

Ainda na faculdade, estagiou na Comunicação da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul. Mas foi em agências que descobriu a verdadeira paixão. Aos 21 anos, entrou na Centro Propaganda como assistente de Produção Gráfica. 

Aos 24, já na McCann Erickson, Mi trocou a Criação pelo Atendimento e mergulhou fundo no universo do varejo. Foi quando descobriu o ritmo acelerado das grandes contas, como BIG, em um tempo em que anúncios atravessavam a cidade em folhas de fax e as fitas betas corriam às emissoras de TV.  Mal havia chegado, a diretora responsável se desligou, e a jovem profissional assumiu a conta da rede de supermercados, então com apenas cinco lojas no Rio Grande do Sul. 

Para dar conta da responsabilidade, os dias começavam às 7h e só terminavam de madrugada, perto da 1h. Foi exaustivo, mas também transformador. ?Um aprendizado que me viciou nessa cachaça da Comunicação?, resume, com um brilho de quem sabe que a intensidade daquele tempo moldou o que viria depois.

Chegou então um novo e duradouro capítulo: primeiro com a Morya/HOC, sob a liderança de Fábio Bernardi e Lara Piccoli, marcando o início de uma fase fértil, com grandes clientes regionais e nacionais. Foi nesse cenário que Mi consolidou sua maturidade profissional, guiando equipes, atravessando desafios e celebrando conquistas. 

Hoje, além dos clientes da HOC, também assume a diretoria de Atendimento na HOC Sports, ao lado de Liana Bazanela, multiplicando olhares e experiências. E é ali que se orgulha de projetos que transcendem a propaganda, alcançando o território das causas.

Assim nasceu o emblemático case da 'Camisa Embarrada' do Sport Club Internacional, concebido em apenas uma semana e meia, no meio do caos das enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, em 2024, e que logo ganhou repercussão nacional. Para Mi, não se tratava apenas de Comunicação: ?Estar ali, naquele momento, participando de uma causa tão maior do que a gente, foi um dos pontos altos da minha carreira?, lembra, com a convicção de quem sente a força de cada escolha bem feita.

A vida fora da agência

Ela é mãe de José Victor, de 21 anos, seu grande parceiro, com quem compartilha idas ao cinema e ao estádio para torcer pelo Inter ? clube que também acompanha profissionalmente, transformando paixão em trabalho. ?Atender ao Inter é o presente da minha carreira na Publicidade. Quando o Fábio me convidou, eu disse que não esperava menos, e ele respondeu que não poderia ser outra pessoa?, lembra.

O time embala memórias afetivas: o amor pelo Internacional começou ainda na infância, quando acompanhava o pai ao Beira-Rio, e hoje se renova a cada jogo, a cada projeto, conectando passado e presente em uma mesma emoção. E paixão!

Viúva desde 2024, após 23 anos de casamento, fala com serenidade sobre as perdas que enfrentou ? o pai, em 2021, e o marido, vítima de câncer. "A vida mostrou que não temos controle sobre tudo. O que podemos escolher é como viver com o que nos acontece. Sempre procurei seguir com leveza, buscando felicidade nas minhas escolhas", reflete.

Um dos vínculos mais afetivos que construiu com o marido e o filho foi a coleção de carrinhos Hot Wheels. O hobby começou ainda na infância do menino e se transformou em uma paixão compartilhada, que segue viva até hoje. Realizando um sonho antigo de ter um quarto de brinquedos, Mi decidiu dedicar um espaço da casa para expor a coleção: são cerca de 1.800 carrinhos enfileirados em prateleiras, colorindo o ambiente e carregando memórias de afeto e cumplicidade.

Em casa, ela divide os dias com as cachorrinhas vira-latas, Magnolia e Margarida, companheiras silenciosas de rotina e afeto. Na cozinha, encontra reconexão: gosta de cozinhar para os outros e transformar ingredientes em cuidado e carinho. Entre alguns vasos e canteiros, mantém viva também a paixão pela jardinagem; e a música, sempre presente, colore cada canto do lar. O balé, hoje, sobrevive como memória de disciplina e expressão. 

A publicitária se define como ?cafezeira?: do grão especial ao simples café solúvel, cada xícara é bem apreciada. Nos momentos de descanso, entrega-se às séries e aos filmes, da comédia ao suspense, mas sempre com o olhar atento às histórias que exploram o ser humano ? um fascínio que atravessa toda sua vida.

Entre perdas e redescobertas

A morte do marido trouxe a Mi a necessidade de reaprender a estar consigo mesma. "Não gosto de solidão, mas estou aprendendo a ficar comigo e com minhas cachorrinhas. Como vou fazer isso da melhor forma?". O luto, ela diz, também reforçou valores: a importância de cuidar das pessoas, de respeitar o tempo e de cultivar leveza, mesmo em dias difíceis. 

Prestes a completar 50 anos, já escolheu seu presente, que será uma viagem solo, ainda sem destino definido, mas certamente à beira do mar brasileiro. Um gesto de liberdade, um convite a novas descobertas. ?Quero me desafiar, retomar estudos, talvez em Psicologia ou Sociologia. Quero continuar buscando autoconhecimento?, afirma, com a serenidade de quem aprendeu que a vida não se planeja, mas se vive plenamente a cada passo.

O futuro em movimento

Da menina que sonhava em dançar nos palcos à mulher que se reinventou tantas vezes dentro da Publicidade e na vida pessoal, Mi guarda a mesma essência, que é ter a alegria como lema. "É melhor ser alegre do que ser triste. Ninguém é igual a ninguém. A vida é respeitar as diferenças e saber se adaptar ao que vem."

No trabalho, quer continuar criando campanhas que marquem a sociedade. Na vida pessoal, manter o astral leve, a rede de amigos, os encontros em bares e casas de samba, as conversas com o filho e os momentos simples que, para ela, são o verdadeiro luxo.

Mi é, acima de tudo, alguém que aprendeu que não existe vida profissional e pessoal separadas: existe uma só a ser vivida com intensidade, respeito e alegria.