Nilton Fernando: Memória brilhante

Comunicador detalha experiências da carreira e revela que se sente um profissional privilegiado

Dono de uma memória invejável e reconhecendo que fala demais, o comunicador Nilton Fernando Silveira Pereira, ou apenas Nilton Fernando - como é conhecido - recorda o início da carreira com muito orgulho e precisão. Apesar de não se ater a datas, ele lembra detalhes do primeiro teste que enfrentou, aos 17 anos, para ingressar na Rádio Cachoeira, de Cachoeira do Sul, sua cidade natal. Ao ser descoberto anunciando na Feira Intercolegial e Estudantil do Livro (Fiel), foi convidado para um teste no veículo, enfrentando cerca de 50 concorrentes. "Eram textos do Supermercado Real e da chegada do Papai Noel com o Pelé no Estádio Maracanã", conta.

Mesmo sendo escolhido, Nilton não pôde trabalhar, pois ainda era menor de idade. Após completar 18 anos, foi chamado novamente na rádio para, de fato, atuar nas locuções. A contratação, segundo conta, foi feita numa sexta-feira e já na segunda-feira seguinte estreava como âncora do programa 'Vanguarda Jovem'. É retornando ao passado que o pai da Luisa, de 16 anos, diz que foi um privilegiado na carreira e que contou com um pouco de sorte. Por conta disso, se considera "um cara orgulhoso" de tudo o que realizou.

Entrevistas com grandes nomes da Música Popular Brasileira (MPB), por exemplo, estão entre as recordações mais frequentes. O locutor já entrevistou Elis Regina, Cazuza, Gal Costa e Elba Ramalho, entre outros. Seu ídolo Caetano Veloso, ele diz que nunca conseguiu entrevistá-lo e revela que, em todas as oportunidades que esteve próximo do cantor, ficou paralisado. Sujeito simples e de voz grave e marcante, Nilton garante que, mesmo já tendo trabalhado em televisão, sua preferência absoluta é por rádio.

Eterna juventude

Trabalhando na Rede Pampa de Comunicação desde 2009, atualmente o comunicador apresenta os programas 'Pampa Bom Dia' e 'Pampa Saúde'. O primeiro é diário e transmitido às 6h, motivo que o faz acordar muito cedo e estar na empresa às 5h20. A rotina profissional também inclui a segunda atração, que, apesar de ir ao ar nos finais de semana, exige gravações de entrevistas diariamente. A atividade, aliás, tem empolgado muito o profissional, que vive cada momento do dia com o mesmo prazer de anos atrás. Essa paixão pela vida também é relatada no gosto pela natureza. "Adoro mexer com a terra e as plantas. Hoje me arrumei porque sabia da entrevista, estou normalmente de chinelo e bermuda", brinca.

Aos 55 anos, Nilton considera-se um "garotão" e tem certeza que pode conversar com jovens por horas, sem se importar com a diferença de idade. Além disso, o comunicador dedica boa parte do seu dia à Internet. A ferramenta é utilizada para pesquisas, alimentação do seu blog, 'Nilnews', onde mantém uma webradio, e do seu perfil no Twitter. "A internet proporciona descobertas incríveis", afirma, explicando que está sempre em busca de cultura e que a web lhe proporciona isso. Enquanto detalha sua rotina, faz uma observação: toda atividade realizada em casa tem a companhia da inseparável companheira, a cadela vira-lata Kelly. "Ela é incrível. Parece que tudo que eu falo é entendido", paparica para logo apresentá-la e enchê-la de mimos.

O sexto filho de oito irmãos, hoje em dia, mora com o mais velho numa casa deixada pelos pais, o produtor de arroz Antenor (falecido há dois anos) e a dona de casa Estela, que passou a morar com uma irmã após um aneurisma. Mesmo com as perdas e com a falta de costume de ver a casa vazia - segundo conta, em função da família grande, todos estavam sempre lá - ele não se sente sozinho, porém reconhece que a hora de se mudar para um lugar menor está próxima.
Com detalhes

"Tenho muito orgulho da minha profissão por ter tido experiências e oportunidades únicas." É o que diz quando recorda sua trajetória desde o início, na TV Difusora (atual Grupo Bandeirantes), quando concorreu com 365 candidatos. Apesar do mérito, ele revela que nunca se deslumbrou com nada na vida e que sempre foi muito maduro. Nessa época, não sabia para que lado da Comunicação iria, a única certeza era o gosto pelo Jornalismo, especialmente pelo rádio. Esta foi a motivação para prestar vestibular na Unisinos e, após aprovado, vir morar em Porto Alegre.

Enquanto recorda os programas pelos quais passou, Nilton recita o jargão de cada um deles com a mesma entonação de voz de anos atrás. Além desses detalhes, lembra também da maioria dos colegas com quem trabalhou, nome e sobrenome, aliás. O comunicador ainda acumula no currículo passagens pela TVE, na época em que a mesma atuava nas dependências da PUCRS, pela 102 FM, do Grupo RBS, e pela Secretaria da Cultura, Desporto e Turismo, na gestão do escritor Barbosa Lessa.

São Paulo também já foi a sua casa. Alertado por um colega de que lá poderia ter maiores chances de crescimento, Nilton resolveu tentar algumas entrevistas e conquistou a chance de atuar na Bandeirantes, em rádio e na televisão. Por conta desta experiência, que durou oito anos, pode garantir que, atualmente, dois dias na capital paulista são suficientes para querer voltar a Porto Alegre. Foi na Band, aliás, que o profissional passou boa parte da carreira. Tem orgulho disso e conta, inclusive, que guarda muitas fotos dos 15 anos dedicados à emissora.

Como se não bastassem os oito anos de desafios na terra da garoa, Nilton recebeu mais uma missão. Convidado a retornar para a capital gaúcha, ele voltou para estruturar uma nova rádio na Band, desta vez para um público bem jovem. "Pensar cada programa, cada detalhe de uma novidade foi emocionante", define. É contando a experiência que traz à tona mais uma recordação carinhosa: conhecer bandas e cantores consagrados, que, na época, estavam em início da carreira. Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Bebeto Alves, Nei Lisboa e Engenheiros do Havaí, por exemplo, foram, muitas vezes, ouvidos em primeira mão pelo locutor.

Sempre em frente

Como não poderia ser diferente, Nilton ainda encarou outro desafio. Quando a empresa em que trabalhava comprou a TV Difusora, a rádio da qual era locutor e produtor teve que mudar de sede e de nome. Mais uma vez, o comunicador se pôs a pensar durante uma madrugada inteira para estruturar o projeto de um novo veículo. Hoje, a conhecida Ipanema FM guarda na sua criação as ideias de um dos seus fundadores. A carreira dele não se resume a rádios musicais. Nilton também atuou em emissoras de frequência AM, puramente jornalística.

Após sair da emissora, ficou dois anos fora do mercado, mas não guarda mágoas dessa época. "Entendo que, com o passar dos anos, surgem novos talentos e o mercado precisa ser renovado." Apesar da longa caminhada profissional, ele diz ser muito discreto e que falar demais é uma característica dos dias de hoje. Para exemplificar as características, conta que, em determinada ocasião, ainda como universitário, o comunicador utilizou o programa que apresentava na Band como trabalho da faculdade. O professor foi criticá-lo dizendo que o 'Linha Nacional' já existia, no que Nilton respondeu: "Sim, sou eu quem apresenta". A cena foi motivo de gargalhadas na turma.
As heranças do tempo

Quando se olha no espelho, Nilton diz que enxerga o mesmo garoto de Cachoeira do Sul, mas "com algum amadurecimento". Mesmo apaixonado por literatura, música, teatro, cinema e todos os demais temas que proporcionem conhecimento, ele confessa que se tornou mais caseiro e que, com isso, descobriu outros interesses longe da badalação de eventos, peças e shows. O locutor, que lê oito jornais diariamente, não gosta de ficção, prefere situações reais e que lhe tragam informações valiosas.

A leitura sempre foi uma constante. A mãe Estela que, segundo ele, "era uma menina de cidade que casou com um fazendeiro, tinha assinatura de muitas revistas, publicações que fascinavam Nilton na juventude. "Acho até que eu era um pouco 'nerd'. Lia até à luz de velas", brinca. Sobre as heranças deixadas pela família, cita a liberdade com que foi criado e garante que tenta agir da mesma forma com Luisa. "Ela é muito madura e sincera. Confio nela, pois somos amigos, mas estou sempre de olho", diz, para logo em seguida tentar convencer que não é ciumento. "Quando vou buscá-la no aeroporto (a filha mora em São Paulo) e a vejo descendo as escadas, penso sempre na mesma coisa: como ela cresceu", derrete-se.

Ele não separa a vida profissional da pessoal, pois classifica que as duas sempre se misturaram muito. "Nunca tive muita chance de parar e olhar para trás. As mudanças na minha profissão aconteceram de forma rápida e uma seguida da outra." Se não fosse jornalista, Nilton tentaria ser médico. Não sabe explicar o motivo, apenas tem certeza do interesse pela área da saúde. Já o que o tira do sério é a injustiça. Considera-se um dedicado amigo, ou, como ele chama, "pai de todos". "Chego a esquecer de mim para ajudar os outros."

O sagitariano convicto explica que, mesmo com o tom de voz firme, é, na verdade, um brincalhão muito emotivo e confessa que procura sempre se divertir enquanto trabalha. Apesar de ser muito franco, o que, conforme ele, pode ser bom e ruim, ele garante estar vivendo uma fase 'zen'. "Sempre trabalhei com o controle da emoção, nem sempre é fácil dar notícias trágicas."
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