Rodrigo Müzell: Apaixonado pela vida
Gerente-executivo de Jornalismo Digital do Grupo RBS, foi à frente de uma equipe em transformação que ele se encontrou na liderança

Rodrigo Müzell se tornou muitas versões de si ao longo do caminho - e talvez essa seja a forma mais honesta de descrevê-lo. Repórter de Economia que virou editor de Copa do Mundo. Jornalista de digital que assumiu uma gerência na televisão. Profissional que evitava a ideia de liderar, mas que passou a gerir pessoas, produtos e estratégias. Nada disso estava nos planos. No entanto, quando as portas se abriram, seja por acaso, por convite ou por sorte, ele entrou.
Marido, pai, músico nas horas vagas, inquieto por natureza e curioso por vocação, Rodrigo é daqueles que acreditam que o jornalista precisa ser apaixonado pela vida, em todas as dimensões nas quais ela se apresenta. "Gosto de entender a vida de uma perspectiva meio externa, olhar para o mundo como se eu estivesse um pouquinho fora e ter interesse por todas as coisas", afirma. É com esse espírito que, hoje, ele lidera uma redação em plena transformação como gerente-executivo de Jornalismo Digital do Grupo RBS.
A playlist da vida
Rodrigo nasceu em outubro de 1979, na zona norte de Porto Alegre. Cresceu no Jardim Planalto, onde a infância seguia um ritmo solto. "Sempre tive condições de experimentar, brincar e viver com muita liberdade e pouca preocupação", explica. Filho de contadores - Antônio, já falecido, e Angelita -, chegou a trabalhar com os pais na adolescência, mas não demorou a perceber que os números não eram o caminho. O irmão mais novo, Alexandre, também tomou rumo diferente: é professor de Educação Física.
O jornalista é casado com a colega de profissão Débora Pradella. A união soma oito anos e há quase um a vida dos dois ganhou um novo centro gravitacional: o filho Leo, nascido em setembro de 2024. Aos 45 anos, avalia que ter se tornado pai com mais maturidade foi uma boa decisão. "Dói um pouco mais as costas, mas toda a ansiedade, os medos e as dúvidas que fazem parte desse processo têm sido experiências tranquilas. Até agora, só tive alegria", garante.
Até mesmo os dias de folga seguem o ritmo do gurizinho. Os instrumentos musicais, que são um dos hobbies de Rodrigo, viraram recursos de experimentação sonora para o filho. "Levo o Leo para fazer algum barulho, dar umas porradas no teclado. Eu toco violão pra ele, até que ele pula no violão e eu não posso mais tocar. Minha relação com a música tem sido assim", relata. Mas não fala isso com pesar, pois se sente satisfeito com a forma como viveu - e ainda vive - sua persona musical.
Por duas décadas, foi músico do Conjunto Musical Gilez, que tocava rock e baladas dos Anos Dourados - décadas de 1950 e 1960. E de vez em quando ainda pinta um convite: algum amigo reúne a galera pra tocar e Rodrigo mata a saudade de fazer um som. Fã dos Beatles, se fosse para escolher a trilha sonora da vida, seria do passado. "Gosto de tudo que é tipo de gênero, mas não ouço muito as músicas atuais", diz. Como a esposa é mais eclética, a playlist da família é diversa, o que está longe de ser um problema: "Amo música, então dificilmente alguma me incomoda. Sou mais ligado ao rock, mas curto muito jazz, blues, MPB e samba".
Os livros também são grandes companheiros, especialmente com a facilidade que os e-books proporcionam. "Eu leio muito rápido, então leio bastante e consigo estar com dois ou três títulos ao mesmo tempo", conta. Divide-se entre ficção e não-ficção, embora o segundo gênero seja mais frequente devido à profissão. Já nas telas, navega por gêneros variados, embora prefira ficção científica. Outra predileção são filmes "que já dá pra saber que não são bons". "Minha geração cresceu assistindo 'Cidadão Kane', 'Duro de Matar' ou 'Curtindo a Vida Adoidado', que para mim são um patrimônio afetivo", explica.
Encontrando o caminho
Em 1997, Rodrigo entrou no curso de Jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) muito motivado pela convivência com Humberto Trezzi, que é seu primo-irmão. "Cresci ouvindo as histórias dele, que tem uma carreira maravilhosa. Ele é muito cativante quando narra, então, eu sabia um pouco da profissão a partir disso", esclarece. Mas não queria seguir o caminho das coberturas criminais e investigativas - ele buscava ser jornalista cultural.
No segundo ano da faculdade, começou a estagiar na editoria de Economia da Gazeta Mercantil. "Apesar de não ser o que eu queria, era melhor do que continuar trabalhando no escritório de contabilidade", conta. Foi durante essa experiência que ele descobriu algo até então inesperado: economia era muito legal! Um dos temas que cobria era o universo automotivo e logo passou a escrever também para o caderno de informática. Ficou lá até 2000 quando, com o fim do período permitido de estágio, começou a buscar novos caminhos.
Foi por meio de uma colega que soube de uma vaga de freelancer no caderno de Informática da Zero Hora. "Cheguei com algumas páginas que eu tinha feito e o Moisés Mendes me contratou", conta. Foi efetivado como repórter somente em janeiro de 2001, após a formatura, e por cerca de cinco anos cobriu pautas voltadas à tecnologia dentro da editoria de Economia. Foi até o Japão e a Coreia do Sul acompanhar a evolução dos celulares e o nascimento do 3G. "Eu estava aqui quando 'tudo era mato'", lembra.
Os países asiáticos não foram as únicas viagens. Em 2009, por exemplo, embarcou para os Estados Unidos para um grande desafio: ser repórter do Philadelphia Inquirer por seis meses. Sabia inglês, mas longe de ter conforto na escrita. As palavras vinham, mas não com a segurança que sentia com o português. Também teve que lidar com a desconfiança dos colegas: "Antes de mim, eles receberam um jornalista da Romênia que fez uma matéria em seis meses. Eles achavam que eu ia ser assim".
Sem receber pautas, passou a propor, conquistando espaço. Em uma reportagem chegou a entrar em um hospital para entrevistar um policial baleado. "Eu nem sabia as regras de lá para entrar em hospital. Aproveitei que não sabia e entrei", admite. Algumas matérias renderam a capa do jornal e também foi ali que atestou o profissionalismo do Jornalismo brasileiro.
Em constante evolução
De volta ao Rio Grande do Sul, em 2010 recebeu o convite para cobrir a preparação do Brasil para a Copa do Mundo de 2014. "Teve mudança de legislação, obras, lançamentos e votações. A ideia era que eu fosse um radar", explica. E também viveu um pouco no mundo do Esporte, é claro. Para ao menos entender o básico, começou a fazer plantão e pegar os jogos que ninguém queria para aprender. E, apesar de não revelar o time do coração, carrega uma relação intensa com o futebol, que define como "a grande manifestação cultural brasileira".
E, de repente, Rodrigo estava com um pé em todas as editorias, virando uma espécie de coringa na redação. Foi nesse período de preparação para o evento esportivo que viveu um grande desafio: cobrir a ocupação do Complexo do Alemão. "Estava em um evento no Rio de Janeiro, que era sobre a Copa, quando começou aquela loucura. Fiquei uma semana subindo e descendo o morro como repórter policial", conta.
Quando voltou para Porto Alegre, chegou com uma vontade: fazer Jornalismo Geral. Conseguiu realizar em 2014, quando se tornou líder de uma equipe de 20 pessoas comandando o Digital e a seção de Últimas Notícias da Zero Hora. "O bichinho da liderança me mordeu, e é legal quando morde, pois comecei a ter prazer não só em fazer o conteúdo, mas em coordenar e planejar", destaca. Em 2017, participou da criação de uma editoria sobre Porto Alegre, que proporcionou uma cobertura mais robusta dos assuntos da Capital.
Quando 2018 chegou, trouxe uma nova guinada - e das grandes. Foi convidado para a gerência de Produção e Reportagem na RBS TV. Não dominava nem a linguagem e nem a técnica da televisão, mas entendia de Jornalismo. Estava lá quando a pandemia começou, o que trouxe mais uma camada de desafio para quem precisava liderar não apenas equipes, mas outros líderes também. "A cada passo dessa trajetória, fui aprendendo coisas diferentes", resume.
Assumindo a própria pauta
Desde 2022, Rodrigo tem uma missão diferente: comandar a gerência executiva de Jornalismo Digital da redação integrada. Hoje, as decisões precisam preservar os valores jornalísticos, mas também dar resultado. Para o jornalista, liderar uma redação com mais de 200 profissionais, entregar produtos que chegam a mais de oito milhões de pessoas e, ainda assim, garantir a saúde do negócio, é uma grande honra. "É um trabalho importante para o nosso Estado, o nosso País e para a vida de todos aqui", avalia.
É por isso que o momento atual é o que considera como o maior desafio e a maior conquista da carreira. O aprofundamento da transformação digital da empresa, que ocorreu em 2024, trouxe mudanças na estrutura da redação visando um foco mais claro e um desenvolvimento mais acelerado. Como líder, Rodrigo fala com orgulho dos colegas que estão se reinventando nesse momento. "Vejo editores que estavam dedicados ao impresso entregando um baita resultado no digital", exemplifica.
O jornalista afirma que esta era a intenção: "Estamos abrindo horizontes". Para ele, um dos grandes papéis de um líder é garantir que a equipe tenha condições de se desenvolver. E vale ressaltar que não é apenas a equipe que está abrindo os horizontes. Com toda essa trajetória, é fácil perceber de onde surgiu o convite para ingressar no conselho do World Editors Forum, do qual faz parte desde julho de 2025. "É uma iniciativa de troca de experiências e contato internacional. O foco é no fazer jornalístico", explica.
Se há algo que Rodrigo aprendeu durante a carreira é que o futuro raramente se comporta como o previsto. "Se me perguntassem há 20 anos se eu seria gerente, eu diria 'bem capaz!'. O peso e as preocupações eram uma visão do inferno. Hoje, é o contrário", afirma. Apesar de grandes viradas terem acontecido ao acaso, atualmente o jornalista segura melhor as rédeas da própria trajetória: "Existem momentos em que você tem que tomar decisões". O objetivo é permanecer liderando, seja uma equipe ou um projeto, mas sem sair do Jornalismo - sua grande paixão.