Tiaraju Brockstedt: Da ansiedade à calmaria

Jornalista há quase 40 anos, Tiaraju Brockstedt conta como driblou o medo de mudanças e revela a vontade de escrever uma novela

Por Karine Viana
Ele diz desconhecer se tem virtudes: "Não sei se tenho uma qualidade, acho que não tenho nenhuma", revela num tom sereno e sem parecer modesto. No entanto, no decorrer da entrevista, o editor de Variedades do Correio do Povo, Carlos Tiaraju Brockstedt, acaba elencando algumas de suas características positivas: é centrado, organizado, fiel e procura trabalhar bastante.
Aos 63 anos e há quase quatro décadas à frente da mesma editoria, sendo cerca de duas delas no diário da Caldas Jr., o jornalista conta que aprendeu a lidar com as mudanças, motivo ao qual atribui o que considera um de seus maiores defeitos: "Sou atacado. Nunca lidei bem com mudanças". É o tempo, segundo afirma, que tem auxiliado na aceitação dos erros alheios e também dos próprios deslizes.
Tiaraju também é daqueles que tentam buscar incessantemente a perfeição. "Fazer as coisas mal feitas me deixa irritado", diz. Entre um assunto e outro, ele para e conversa com alguém da equipe, pergunta sobre as pautas e analisa as imagens. Consegue transitar entre a entrevista e o trabalho sem perder a concentração. Embora a dedicação profissional seja uma de suas marcas, o jornalista faz questão de afirmar: não leva os problemas do trabalho para casa.
O início de tudo
A importância de traçar um limite entre a vida profissional e pessoal foi consolidada ao longo da carreira que, embora dedicada quase em sua totalidade a variedades, também teve uma breve excursão pela redação de notas policiais, safra e cinema. O começo dessa trajetória se deu ainda durante a faculdade de Comunicação, na PUC, onde se formou no início da década de 80, paralelamente ao curso de Direito, que também concluiu. "Se fiz a escolha certa, com a Comunicação? Não sei", afirma, pensativo.
A opção pelo Jornalismo não surgiu de influências familiares ou de contatos, mas pelo interesse por cultura, livros, televisão e cinema. Começou sua jornada na Zero Hora, onde iniciou com uma coluna de televisão. Ainda estudava quando começou a procurar emprego. Conseguiu na ZH, no setor de Central do Interior. As portas da editoria de Variedades se abriram para Tiaraju quando foi convidado a cobrir a ausência de um colega, conforme relata: "O jornalista foi embora e nunca mais voltou. Fiquei no lugar dele".
Foram 18 anos em Zero Hora. Paralelamente, ainda no início da carreira, trabalhou na Rede Pampa e na Secretaria de Cultura, além de ter se aventurado também em um programa de TV, chamado Olho Vivo. "Teve um outro programa também, mas nem lembro o nome e não fez muito sucesso", recorda.
Ainda estava na ZH quando recebeu um convite para integrar a equipe do Correio do Povo. Viu alguns colegas migrarem pra concorrência, mas, avesso a mudanças, optou por permanecer no Grupo RBS após a empresa cobrir a oferta salarial. Tempos depois, após o período ao qual ele intitula como "grande leva", por volta de 1992, quando assumiu a direção de redação o jornalista Augusto Nunes, Tiaraju se viu obrigado a trocar de ambiente de trabalho. Tiaraju finalmente iniciava sua trajetória, também longa, na Caldas Jr.
Uma vida mais mansa
A migração da ZH para o Correio do Povo foi, para o jornalista, uma espécie de divisor de águas: "Foi o início de uma nova etapa da minha vida". Não foi apenas o ambiente físico que passou por mudanças, mas também o modo como leva a vida. Embora a ansiedade se caracterize por um estado que auxilia na resolução de tarefas, também pode se mostrar nociva a longo prazo. "Eu era muito ansioso e isso é ruim, embora tenha sido bom naquela época", revela. Hoje, tenta buscar uma vida mais tranquila, salientando a importância de separar trabalho de vida pessoal.
Em décadas de profissão, o jornalista enfrentou diversas fases, mas o maior desafio se refere, talvez, ao começo da trajetória, quando era preciso ganhar o interesse do leitor e conseguir um retorno positivo, ampliando a importância da editoria. Muitas vezes, Tiaraju precisou lidar com pequenas mudanças de última hora, acontecimento que abominava. "Lembro que uma vez eu estava em casa vendo TV quando tive que correr para o jornal arrumar a nota sobre o capítulo da novela Malu Mulher, que estava errado", confessa. O capítulo, na verdade, havia sido modificado devido à censura.
Hoje as coisas se mostram diferentes e também mais facilitadas. Alguns imprevistos como o caso da censura e a difícil busca por pautas, que antes irritavam Tiaraju, hoje estão minimizados. A facilidade, através da internet, do recebimento de pautas e roteiros e também o aumento da equipe, com a qual não contava no início da carreira, quando editava sozinho cerca de quatro páginas do caderno de variedades, tem ajudado no trabalho. "Lembro que na estreia da novela Tieta eu não tinha material algum. Eu costumava baixar na segunda-feira a matéria do outro domingo", confessa. O material enviado nunca chegava diretamente às suas mãos, o que exigia uma maratona atrás do conteúdo a ser publicado. "Não era muito fácil", finaliza.
A calmaria
Tiaraju repete várias vezes que hoje dribla melhor as situações de dificuldade. Carrega consigo uma espécie de nova filosofia de vida, que se caracteriza em não se incomodar, seja com o que for. "Já tive a minha cota de incomodação", salienta, enquanto se autodenomina como "zen total". "Antes eu ficava bravo com qualquer mudança relacionada à coluna, hoje eu penso: Não é meu, por que vou ficar bravo?".
Casado há 30 anos com o professor George Tadeu Koetz, tempo suficiente para não lembrar de detalhes de como se conheceram, Tiaraju costuma dizer que tem duas filhas, uma poodle e uma yorkshire. Procura manter "uma vida fora do jornal", o que considera fundamental, mas também fala da importância de se afirmar num local: "Quando tu começas a pensar assim, dá mais valor à profissão, te dedica mais". No entanto, ele enfatiza: "Tu trabalhas, mas tem a tua vida".
Em casa, não é adepto da cozinha, mas confessa ser fã de comida caseira e também do que chama de porcarias, a começar pelas batatas fritas. Filmes e literatura policial também fazem parte do dia a dia mais caseiro de Tiaraju, que se mostra eclético quando a questão é música: do forró à música clássica, que não é exatamente seu estilo, mas está entre as trilhas que ouve.
Embora não leve mais preocupação do trabalho para casa, algumas coisas que podem estar atreladas ao trabalho e ao lazer são permitidas ao jornalista, como livros, filmes, programas culturais, televisão (mais propriamente vídeos) e, segundo ele, o acompanhamento de pelo menos uma novela. "Geralmente assisto uma novela, pois é bom para se manter no assunto", diz.
Tiaraju já está aposentado, mas afirma que continuará trabalhando enquanto puder. Entre os planos para quando se afastar da vida jornalística está o de escrever uma novela. "Acho que quando eu me aposentar de vez talvez tente alguma coisa nesse sentido. Pode ser muito tarde, mas eu quero tentar", revela. O que conseguiria, acredita, com um pouco mais de tempo a sós com o roteiro. Quer dizer, com paz e tranquilidade.
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