Valdir Friolin: Um olhar multipremiado

Aposentado e com mais de três décadas dedicadas à fotografia, Valdir Friolin coleciona prêmios e ainda sonha em registrar uma Copa do Mundo

Por Karine Viana - 15/03/2013
Sobre o sofá da sala, a munição de logo à noite. Câmera, lentes, flash e para-sol são alguns dos acessórios preparados para registrar o jogo de futebol pela Copa Libertadores ao fim do dia. Os equipamentos compartilham o espaço da sala de estar, no bairro Menino Deus, com troféus, fotografias e uma imagem de Nossa Senhora. O anfitrião, usando óculos, cabelos devidamente alinhados e com um sorriso, aponta para o que move sua trajetória e são seus motivos de orgulho: a fotografia que lhe rendeu o primeiro prêmio como fotojornalista e a imagem dos netos estampada na tela do computador.
Aos 61 anos, Valdir Gomes Friolin conta que se descobriu na profissão ainda na adolescência, nos longínquos anos 60, por influência do tio materno, Taltibio Gomes de Moraes. Na sua cidade natal, Santana do Livramento, onde nasceu em 9 de junho de 1951, trabalhava auxiliando o tio, até vir para a Capital na busca por novas oportunidades, em 1969, e passar a colecionar prêmios e notoriedade no meio fotográfico, façanhas conquistadas em mais de quatro décadas de dedicação à fotografia. O fotojornalista deixa a modéstia de lado quando aborda, com orgulho, o próprio trabalho. Em contrapartida, se mostra uma pessoa humilde quando revela seguir o que chama de lema: "Sou o que sou e zé fini".
Nos números da vida, dois casamentos, duas filhas, três netos, 30 anos de trabalho dedicados ao jornal Zero Hora, 14 prêmios ARI de Jornalismo, outros prêmios e menções honrosas e o sonho de cobrir uma Copa do Mundo. Embora com maior volume de condecorações atribuídos ao seu trabalho desenvolvido na editoria Geral, Friolin se especializou na fotografia esportiva, e almeja registrar o maior evento mundial dedicado ao futebol e que vai ocorrer em 2014 aqui no País.
Marlon Brando sem moto
Nascido e criado na fronteira com o Uruguai, Friolin é um dos seis filhos da costureira Alexandra Gomes Friolin e do pedreiro Francisco de Assis Friolin. O destino bem que tentou fazer com que trilhasse outros caminhos, mas foi a influência do padrinho e do tio materno, fotógrafo na cidade, que o levou ao fascínio da imagem. "Eu tinha que ser fotógrafo mesmo. Eu via, na época, o Marlon Brando de motocicleta, com jaqueta de couro e uma câmera. Aquilo fez eu me apaixonar mais pela fotografia. Em compensação, nunca tive moto", lembra aos risos.
Um mapa astral feito há alguns anos confirmou suas aptidões: fotografia, comunicação e jornalismo, mas Friolin teve breve incursões pelo futebol e pela música. Ainda na escola, participou da banda do Professor Chaves: "Uma coisa simples, mas me marcou quando eu era guri", lembra. Mais tarde, ensaiou alguns passes de bola, quando jogou em times locais, mas também não levou adiante. "Fui até cantor!", revela, ao lembrar que ainda nos tempos de colégio fundou a banda 'Os Terríveis' - em alusão ao grupo da época 'Os Incríveis' -  em parceria com alguns colegas, com quem gravou um compact disc, lhe rendendo até admiradores. "A Rosina Duarte era minha fã número um", se referindo ao apoio dado pela jornalista, hoje editora do jornal Boca de Rua.
A inspiração pelo trabalho do tio, no entanto, pravaleceu. Até mesmo durante a prestação de serviço militar, Friolin desenvolvia seus dotes fotográficos. "No quartel eu era fotógrafo oficial. Eu me livrava de muitos serviços, como montar a cavalo, porque fotografava", conta em tom de alívio. Com uma câmera na mão desde os 15 anos, teve a oportunidade de trabalhar na Folha Popular, proposta de emprego antes ofertada ao tio, que optou por indicar o pupilo para a atividade. Também passou pela Plateia até vir para Porto Alegre, pós-serviço militar, na busca de novas oportunidades, onde continuou trabalhando com o tio e um amigo, fazendo fotos em estúdio. Em 1974 passou a compor a equipe do Diário de Notícias, foi cedido à TV Piratini, onde fazia os slides de programação, e retornou ao Diário até seu fechamento, no final de 1979.
Prêmios e desafios
Tão logo deixou o Diário de Notícias, Valdir Friolin recebeu o convite para trabalhar na Caldas Júnior e em Zero Hora. Acabou optando pela segunda devido à possibilidade de começar imediatamente, em dezembro de 1979. "Fiquei 32 anos na Zero Hora, a minha vida toda foi lá", diz, enquanto aponta para um quadro na parede: "Aquela foto ali rendeu meu primeiro prêmio ARI de Jornalismo, em 1980. O título 'Terra e não cafezinho' foi feito pelo grande jornalista Carlos Alberto Kolecza, ele deu o título e eu ganhei o ARI". A pauta foi uma das primeiras como funcionário da ZH. No Palácio Piratini, Friolin registrou o momento em que o garçom, por instruções do então governador, serve cafezinho aos colonos que ali estão clamando por terra. Mulheres cabisbaixas e crianças no chão completam a imagem que lhe rendeu o prêmio por unanimidade, 13 votos a zero.
Enquanto folheia uma revista da Associação Riograndense de Imprensa, que reúne imagens de 1958 a 2007, o fotógrafo resume sua carreira nas imagens estampadas na publicação. "Sou o cara que mais publicou fotos num livro da ARI. Neste, tenho 28 publicadas", diz. São imagens que lhe renderam 11 prêmios. "Agora, mesmo estando fora da ZH, ganhei mais um. Desta vez, fui contemplado com o 2º lugar. O importante é que mesmo fora do jornal, ganhei um rescaldo", comemora. A sequência em que mostra um jóquei caindo do cavalo durante uma competição lhe rendeu o prêmio. Embora viesse a se especializar na cobertura do futebol, Friolin registrou outras competições. Chegou a ficar conhecido como 'Fotógrafo da curva um', codinome atribuído a ele por captar o momento exato em que um piloto se acidentava fatalmente no Tarumã.
O fotojornalista andou por toda a América do Sul, com exceção da Venezuela. Também foi a Orlando, nos Estados Unidos, onde, junto com o jornalista Gilberto Leal, esteve como convidado da GM na cobertura do lançamento do Ômega, justamente pela fama adquirida durante o trabalho no Tarumã. No entanto, Friolin destaca como desafios trabalhos realizados no Estado, na editoria Policial. Em um deles, na tentativa de registrar uma venda ilegal de terras, ainda nos anos 80, ele e o repórter se depararam com uma arma apontada para eles. Em outra ocasião, se arriscou atrás de uma árvore para registrar um foragido trocando tiros com a polícia. Como resultado, captou o momento exato em que o bandido foi atingido, imagem que estampou a capa de Zero Hora no dia seguinte.
ZH e futuro
Embora tenha dedicado metade da vida ao trabalho desenvolvido na Zero Hora, Valdir Friolin nutre uma mágoa, baseada principalmente na forma como foi dispensado de suas atividades. Segundo ele, a chefia lhe chamou para uma conversa, na qual a idade avançada (ele já tinha 60 anos e estava aposentado) foi utilizada como argumento para sua dispensa. "Eu acho que poderia fazer muito mais, acho que poderia continuar mais uns anos, mas é a vida", lamenta, acrescentando ainda que a diferença salarial entre os colegas e o fato de, mesmo cobrindo o futebol, nunca tenha lhe rendido um convite para cobrir Copa do Mundo, também motivaram seu descontentamento.
Hoje, a rotina de Valdir, que muitas vezes se sobressaiu no meio de outros fotógrafos, ao registrar fotografias exclusivas, se baseia profissionalmente nos chamados freelas, trabalhando ao lado do fotógrafo Wesley Santos, proprietário da Press Digital. Naquela noite, preparava-se para o jogo da Copa Libertadores, evento que lhe possibilita um mercado mais amplo para a venda de imagens, bem diferente dos programas esportivos locais, como o Campeonato Gaúcho. O trabalho também é diferente do realizado há anos, quando cerca de 15 minutos de partida eram registrados para que pudesse voltar ao hotel e ali deixar o banheiro totalmente às escuras, para revelar as imagens.
Sem o cumprimento de uma jornada fixa de trabalho, o fotógrafo tem hoje uma rotina mais leve, dividida entre uma cerveja e uma conversa com os amigos pelo Menino Deus, cafezinhos pelos bares da Rua dos Andradas, uma romântica música italiana, ouvida no silêncio de sua residência, e passeio com os netos. Estes fazem brotar um sorriso orgulhoso do avô, enquanto mostra suas fotografias e fala das características de cada um. Guilherme, 11 anos, é filho de Carmem Andréia, filha mais velha do fotógrafo. Lucas e Tiaguinho, com sete e dois anos, filhos da Ana Paula. As duas são fruto de seu casamento com Ivone Gazano da Silva, com quem conviveu por quase 30 anos. Depois casou pela segunda vez, agora com a jornalista Joelma Pizzolloto, 23 anos mais jovem, e com quem viveu por 12 anos.
Quando perguntado como se vê daqui a alguns anos, responde logo: "Daqui a alguns anos? Eu vou te mostrar uma coisinha aqui. Estes são meus heróis". Friolin fala enquanto mostra, na tela do computador, fotografias cotidianas dos netos. "Quero isso. Viajar com meus netos. Ir à praia, viajar pelo interior, em Livramento, onde nasci", acrescenta. Mas isso tudo não é imediato. O fotógrafo ainda quer alçar outros voos, que até então não fizeram parte da sua carreira como fotojornalista. "Isso depois da Copa do Mundo. Depois da Copa quero cutir meus netos e viajar. Enquanto der, vou viajar com eles".
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