Reflexões natalinas e meus protestos

Por Flávio Dutra

Há uma certa melancolia neste período de festas. Talvez seja pela obrigatoriedade de mostrar felicidade, enquanto a realidade pode ser desanimadora. Culpa também das revisões que o fim de uma etapa impõe e a conclusão de que muito foi sonhado e pouco concretizado e isso vale tanto para a vida pessoal como para o lado profissional. Se pelo menos os presentes compensassem as frustrações, mas nem isso tem ajudado.

Foi-se o tempo das cestas de Natal repletas de produtos importados, ou das bebidas finas ou, ainda, dos eletrônicos de última geração oferecidos como mimos por clientes e fornecedores. No Jornalismo tal prática é conhecida como "toco", como relatei na coluna da semana passada.

Hoje, o recebimento dos regalos é visto com restrições ou tratado como folclore, mesmo porque a falecida operação  Lava Jato desnudou o toma-lá, dá-cá em nível bilionário. Só que boa parte dos implicados - e não a parte boa -  está livre, leve e solta . Não foi surpresa, por exemplo, que Sérgio Cabral, condenado a mais de 400 anos de prisão, foi libertado e vai passar as festas de fim de ano em casa, para reencontrar as joias conquistadas com propinas  e degustar os pratos e bebidas sofisticadas que lhe foram sonegadas na cadeia. E, assim, cumprir pouco mais de 1% da pena atrás das grades. É muita pilantragem sob  a égide suprema da Justiça.

Na verdade, quero deixar meu protesto veemente também por outro motivo relevante, em nome de todos os capricornianos que fazem aniversário no Natal ou nos dias próximos. Não são poucos, garanto, e a maioria alega que é discriminada quanto aos presentes, recebendo um que vale por dois devido a proximidade de datas. Por muito tempo fui vítima dessa sovinice, eis que nasci em 6 de janeiro, dia de Reis (mera coincidência), embora  a data seja referência a chegada dos reis Magos, Melchior, Baltasar e Gaspar à gruta de Belém para presentear o pequeno Jesus com ouro, incenso e mirra. No  Uruguai a troca de presentes ocorre nesse dia. Mesmo assim, apesar  de  todo esse respaldo bíblico e de tradição, muitas vezes eu ficava sem o  presente de aniversário.

Nem por isso precisei apelar para o divã dos analistas a fim de curar minha frustração por não ser presenteado  e olha que   nem precisava ser ouro, mirra e incenso, bastava um carrinho, uma bola, um joguinho qualquer.

Não vão faltar línguas maldosas para dizer que estou aqui apelando para o coitadismo e  insinuando  a necessidade de ser presenteado no aniversário próximo -  com vinhos importados, espumantes de boa cepa, cervejas  artesanais, camisas azuis de grife, utensílios para churrascos. Não, gente,  não precisa se incomodar, mas não custa lembrar que 6 de janeiro está chegando.

Aproveito para desejar a todos os que prestigiam este espaço um Natal sem uva passa e muitos abraços e vários brindes pelo ano novo. 

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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