Diversidade e Comunicação: Daniel Rodrigues enfrentando preconceitos

Autor de artigo publicado nesta sexta-feira em Coletiva.net, jornalista conversou com Luan Pires

Luan Pires teve um papo sobre diversidade com Daniel Rodrigues - Arquivo Pessoal

Daniel Rodrigues tem mais de duas décadas na área da Comunicação. Atua há quase 20 anos na Martha Becker Connections, onde há cerca de 10 é o coordenador de Comunicação. Mas, sua voz se faz presente em outras frentes: é crítico de Cinema, apresentador e produtor de um programa de rádio, além de percorrer por diferentes setores desse segmento. Além disso, leva sempre a serenidade no seu discurso e a consciência da sua responsabilidade como profissional com voz ativa no mercado.

Quando falamos de diversidade, o que vem primeiro na sua cabeça?

Sempre penso na diferença em diversidade de uma universidade de hoje do que na época que eu cursava. Era evidente, embora hoje em dia tenha evoluído bastante, que a presença de negros na academia e no mercado era escassa. 

Quando você estava dando seus primeiros passos na Comunicação, como foi lidar com figuras de referência mais escassas? 

A gente sempre carece de figuras de referências, em vários níveis. Mas eu me apoiei muito em referências que iam além do meu espectro de Comunicação, ou Comunicação Corporativa, minha principal área de atuação hoje em dia. Mas, fato é que tive o privilégio de ter a minha própria família como referência. Ética e cultura, esses conceitos me deram base para enfrentar os preconceitos do racismo estrutural. À medida que a gente vai crescendo, é natural querer mais essas referências. Por isso, a partir do momento que entendi as referências que queria buscar, fui atrás e elas apareceram naturalmente. Porque existem referências negras aos montes! Só, claro, precisam de mais visibilidade. Joel Zito Araújo, por exemplo, um cineasta e documentarista que já legou importantes obras para a nossa cultura. Milton Nascimento e Gilberto Gil são exemplos também, pois são pessoas que ajudaram e ainda ajudam a entender a sociedade que a gente vive. Acho que referências podem vir de várias áreas e setores, desde que façam sentido para ti.

E se a gente virasse a chave e pensasse em ti como referência para novas gerações, como um comunicólogo que atua em várias áreas. Como você vê o mercado atual e seu papel como referência nele?

Tenho plena consciência que ainda são muito escassos casos de pessoas como eu, em cargos de diretoria e gestão. Há anos no mercado, poucos negros passam por esses ambientes de Comunicação maiores, porque isso é reflexo do nosso racismo estrutural. Lá na raiz, ele já impede essas pessoas de chegarem mais adiante. Por isso, não podemos parar de nos esforçar para gerar equidade. E também por isso vejo o meu papel como exemplo importante para os jovens fazerem as coisas certas e com amor, como diria minha mãe.

Como jornalista, que acaba pautando a sociedade através dos projetos que desenvolve, o que você acha que poderíamos fazer a mais? Quais são os caminhos, ou a mistura deles, que podemos tomar?

Precisamos pressionar para que haja melhora para todas as minorias. Precisa existir um pacto mais consistente por parte de quem detém o poder das empresas de Comunicação. Porque isso só vai acontecer de fato quando esse convencimento for natural e não em resposta a alguma coisa. De 10 anos pra cá, a causa negra vem tomando um posicionamento muito proeminente, porque avançamos neste ponto. Agora estamos num estágio de discurso negro mais propositivo. Só assim, mudando a estrutura, mudamos o racismo estrutural. 

Em relação a mim, não só dentro da Comunicação Corporativa, mas em tudo que faço, procuro dizer e afirmar esses discursos, que também são meus e da minha família. Coisas que são importantes de serem ditas e ouvidas, seja nas críticas de Cinema que faço, no meu programa de rádio ou em outras ações. Sei da posição em que estou e da responsabilidade dela.

Você é uma pessoa que tem uma visão de quando diversidade era um contexto muito tímido e vive agora essa pauta com a força que a sociedade exige dela. Queria saber como foi o crescimento dentro de ti e do mercado sobre essa pauta?  

Eu tive uma aculturação muito brancocêntrica. Tenho ciência disso. Mas, a maturidade e a vida profissional me trouxeram a busca por tentar entender minhas raízes mais profundas. O que eu percebo é que, hoje em dia, ficou muito mais latente em mim essa percepção de que tudo que eu manifesto vem dessa raiz. Por outro lado, eu vim de uma família vitoriosa, porque diante de todos os processos de dificuldade que as famílias negras têm, a minha conseguiu colocar seus filhos em uma situação melhor. Eu sou muito privilegiado nesse aspecto e, por isso, não tinha muito essa referência do "pode ou não pode" porque tu és negro. No passado, muitas vezes, o preconceito estava lá e eu nem percebia. 

E isso resume bem toda conversa. Tem pessoas que não têm nem a família como base, por inúmeros motivos e buscam no profissional que trabalha com elas, que aparece em grandes cargos, e outras referências, essa base. Isso constrói a noção de identidade. E isso é importante.

Ter essa consciência de si mesmo, independente da onde ela vem, é importante pra comunidade negra. A sociedade precisa dar as ferramentas para essa construção interna acontecer. Ter pessoas negras no mercado de Comunicação falando e expressando o seu eu ajuda a construir essa base em outras pessoas negras. Sabe, me coloco num momento de não só servir de exemplo, mas de formar outros exemplos. É um processo, mas tudo que for possível fazer para isso é importante.


Esta matéria faz parte de um conteúdo especial sobre diversidade e Comunicação, produzido por Luan Pires para Coletiva.net. Todas as sextas-feiras, o jornalista publicará uma entrevista exclusiva com o articulista do dia. Para conferir o artigo de hoje, assinado por Daniel Rodrigues, clique aqui.

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