Enchentes no RS: "Impossível não viver e se emocionar", desabafa Carine Krüger

Coletiva.net conversou com a gestora e repórter do portal Agora no Vale e o colega Leonardo Demétrio Heisler, que cobrem o episódio desde o início

Carine e Leonardo cobrem a tragédia no Vale do Taquari pelo Agora no Vale - Crédito: Arquivo Pessoal

O ciclone que atingiu o Rio Grande do Sul na semana passada provocou enchentes que vitimaram milhares de pessoas, em especial no Vale do Taquari. Para os veículos regionais, o trabalho vai além de informar, mas também de colaborar com as pessoas que encontram no veículo de Comunicação local um espaço para pedir ajuda. Situação como essa aconteceu com Carine Krüger, jornalista e gestora do portal de notícias Agora no Vale de Lajeado, que noticia o evento ao lado do colega Leonardo Demétrio Heisler e mais dois parceiros, de forma integral, desde a segunda-feira, 4. O relato de hoje integra uma série especial do Coletiva.net, com depoimentos de quem trabalha para noticiar o desastre.

"Tenho certeza que todos os profissionais que cobriram essa tragédia sentiram tudo a cada minuto, impossível não viver, não se emocionar ou deixar de se colocar no lugar das pessoas e tudo o que perderam, em especial as vidas", relatou Carine. Para ela, o momento mais marcante até então foi entre segunda e terça-feira, 5, quando moradores de Muçum e de Roca Sales já estavam cobertos com água do rio, sem luz, sem energia elétrica e sem sinal de telefonia. O único contato que conseguiram foi via WhatsApp com veículos de Comunicação: o Agora e mais duas rádios da cidade. "Eu, pessoalmente, conversei com mais de quatro famílias, tentando acalmar e pedindo ajuda aos bombeiros e à Defesa Civil (que não conseguiam de forma alguma chegar na cidade)." 

Um fato que ela não esquecerá é a ligação de uma senhora de cerca de 50 anos, que estava com mais oito pessoas da mesma família dentro de uma caixa de água, em cima do telhado do segundo andar da casa, implorando por ajuda. A conversa foi das 21h até 2h. "Ligamos para todas as autoridades e equipes de resgate, mas estava impossível chegar na residência." O bate-papo acabou por falta de bateria no aparelho da vítima. "Depois disso, não consegui mais contato com ela e ainda não sei se ela conseguiu sobreviver. Segui encaminhando mensagens na madrugada e no dia seguinte e até o momento não chegaram até ela. Espero que tenha apenas perdido o celular", desabafou.

Para Leonardo, o caso de uma criança que luta contra a leucemia, abraçando a mãe diante da casa destruída, e dizendo que ela não precisava chorar, foi chocante. "A mãe estava desolada porque os remédios foram levados pela água. Graças ao Jornalismo foi possível agora fazer um estoque e ainda arrecadar algum dinheiro". 

A expressão no rosto das pessoas, tanto em Roca Sales como em Muçum, também marcou o repórter. "Era tão forte quanto o impacto causado pela destruição. Dava para perceber logo quem era morador", afirmou. Além desses municípios, ele circulou pelas áreas mais atingidas em Arroio do Meio, Cruzeiro do Sul e Lajeado. 

Cobertura começou no domingo

Conforme Carine, o acompanhamento do fenômeno começou no domingo, 3, pois chovia muito na Serra e eles sabiam que o nível do Rio Taquari poderia subir. Na segunda-feira, 4, pela manhã, começou-se a busca pelo volume de água. Assim, de acordo com a gestora, eles foram um dos primeiros veículos da região a fazer isso, "mas como forma de prevenção de checagem mesmo, até esse momento nem imaginávamos o que estava por vir". Às 9h foi o início real da cobertura, mas ainda com notícias rotineiras sobre a enchente, que são relativamente comuns na região. Toda a equipe ficou atenta e em contato com as autoridades, para alertar o maior número de leitores possíveis pelo portal e pelas redes. 

"Dormimos praticamente cinco horas no total de segunda até quarta-feira para ajudar ao máximo e em tempo real, porque muitas pessoas estavam dependendo de nós", destacou. Acostumado a cobrir enchentes desde 2007, Leonardo também disse que a rotina mudou completamente nessa semana. "Foram tão poucas horas dormidas que, às vezes, tinha que consultar que dia era. E foi assim com todos." Para ele, as circunstâncias tomaram dimensões maiores na noite de segunda-feira, quando chegaram os relatos de Muçum e, principalmente, por volta das 20h, quando ele perdeu o contato com as fontes do município. "As últimas mensagens que recebi eram de desespero."

A executiva acredita que a imprensa, de um modo geral, está sendo profissional e humana. "Se a nossa região vai ter algum tipo de apoio maior, e até mesmo todas essas doações que está recebendo, é porque a informação percorreu e se espalhou com credibilidade em todo Brasil." Para o repórter, a atuação tem sido desafiadora, mas extremamente importante e bem feita. "Estamos, desde o início, informando, mobilizando recursos e assistência, ouvindo as pessoas e destacando histórias de solidariedade e resiliência, mas também chamando a atenção de que algo tem que mudar", concluiu.


Na última semana, o Rio Grande do Sul foi atingido por um ciclone extratropical, que resultou em enchentes em diversas localidades. Desde então, a imprensa gaúcha trabalha para levar ao público informações sobre os acontecimentos, além de mobilizar uma corrente do bem para ajudar as famílias afetadas, especialmente no Vale do Taquari. Nesta série especial, Coletiva.net acompanha o trabalho dos jornalistas que mostram ao Estado e ao Brasil a dimensão desta tragédia.

Comentários