Andrei Kampff: Entre a lei, a bola e o microfone
Jornalista esportivo por mais de duas décadas, ele alia a paixão ao atual trabalho na área do Direito
Ele resistiu muito para não seguir o caminho profissional que trilha hoje. Não queria, de jeito nenhum, repetir os passos dos pais jornalistas, mesmo que fosse um caminho muito natural. Era como se não estivesse escolhendo a própria vida e o destino. O "problema" é que Jornalismo e Direito sempre fizeram parte de quem Andrei Kampff é.
E foi exatamente por isso que saiu de casa para se matricular nos cursos de Publicidade e Propaganda e Arquitetura, mas regressou como estudante de Jornalismo e Direito. Assim como a frase atribuída ao escritor modernista Marcel Proust, "o tempo é o senhor da razão", com o passar dos anos a escolha acabou se confirmando acertada. "Olhando para trás, sinto que tomei a decisão certa", reflete.
O guri, que sempre gostou de assistir a filmes de júri e se interessava muito por leitura, acabou se formando em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), bem como em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). O plano era trabalhar concomitantemente nas duas áreas. Entretanto, este desejo precisou ser adiado por alguns bons anos. Isso porque o universo da reportagem esportiva o consumiu.
Paixão por contar histórias
Como acabou se formando muito mais cedo em Jornalismo, ingressou primeiro no mercado de trabalho da Comunicação. Com passagens pela rádio Guaíba, TVE, RBS TV, rádio Cidade, Globo Recife e Globo São Paulo, Andrei aponta que a área, "ao mesmo tempo que apaixona, também escraviza".
Hoje, com 28 anos de carreira, o filho mais novo dos jornalistas Batista Filho e Olenca Kampff acumula coberturas e reportagens que ficarão para sempre na memória. "Ao pensar na minha trajetória, vem um sorriso, uma alegria e uma gratidão por tudo o que consegui fazer, como participar de grandes eventos, como Olimpíadas e Copa do Mundo", diz o jornalista, que já esteve em 32 países a trabalho.
Para ele, não bastava dizer que determinado jogador ficaria no banco porque estava machucado. Ele gostava de contar histórias. Prova disso foi quando descobriu que, de quatro em quatro anos, existia uma Olimpíada de esquimós, que reunia os povos dos extremos do mundo. Então, não via o que fazer a não ser arrumar as malas e voar até o Alasca para contar essa história.
"O Jornalismo me deu as melhores lembranças e uma vida que não imaginava. Talvez muito mais legal do que sonhava", salienta, ao completar que ainda o levou "para lugares fantásticos e apresentou pessoas diferentes". Por isso, entende que não ter rotina, ir para rua e escutar pessoas são sempre um aprendizado. "O Jornalismo me ajudou a ser quem eu sou", decreta.
Atleta com microfone
Desde criança, o passatempo favorito de Andrei consistia em se reunir com os vizinhos na rua para jogar futebol. Mais tarde, foi a vez do vôlei e do tênis entrarem na vida dele, um eterno apaixonado por esportes. Filho de narrador, não via como aquela área de atuação no Jornalismo pudesse ser diferente da esportiva. "Eu admirava e via de longe (o trabalho de Batista Filho). Acho que a gente meio que repete o que os pais fazem", opina. Inclusive, o filho mais velho, Theo, de 10 anos, é apaixonado por futebol e sai narrando e comentando os jogos e, com isso, deseja ser jornalista esportivo.
Além de cobrir grandes eventos esportivos, Andrei já esteve frente a frente com ídolos do futebol. O inglês Bobby Charlton, o português Cristiano Ronaldo, o alemão Franz Beckenbauer, o argentino Lionel Messi, o francês Michel Platini e o brasileiro (e rei) Pelé estão na lista - tão desejada por outros colegas de profissão - de entrevistas que já realizou. E é exatamente por isso que declara: "Conciliar a paixão pelo esporte como torcedor a uma atividade profissional era, para mim, o mundo perfeito".
Todavia, o momento mais marcante foi a realização de uma série para o Jornal da Globo. Andrei ficou incumbido de registrar um diagnóstico do futebol brasileiro, com o intuito de acabar com o imaginário que as pessoas têm de que o futebol é um trampolim fácil e uma mudança social. Andrei entende que, na verdade, é apenas um retrato da dificuldade que o trabalhador brasileiro tem. "Quando olhamos Neymar, ou um jogador do Internacional ou do Grêmio, estamos vendo a exceção da exceção", aponta, ao salientar que mais de 95% dos jogadores brasileiros ganham muito mal.
Para a série, viajou com equipe durante 45 dias pelo Brasil e passaram por dois estados em cada região. Uma das histórias que mais se recorda foi a de um jogador gaúcho, que atuava em um time no Amapá, e conheceu o filho seis meses depois do nascimento, por uma imagem capturada pela equipe da RBS TV. Na época, só conseguia se comunicar com a família por ligações de um orelhão - telefone público.
Retomada de planos
Depois de duas décadas dedicadas exclusivamente ao Jornalismo, em 2018, Andrei decidiu voltar com o plano inicial de carreira e conciliá-la com o Direito. Para tal, deixou a Rede Globo e ingressou em uma pós-graduação, com o intuito de se tornar mestre na área jurídica. Outro passo dado foi a criação de um escritório de advocacia, onde trabalha com um braço na indústria do Esporte e outro na área trabalhista da Comunicação. Aliado a isso, mantém o portal Lei em Campo, escreve para o Uol e também realiza comentários na Jovem Pan sobre Direito e Esporte.
Apesar de confessar que atualmente trabalha mais ainda do que antes, acha que a grande conquista, quando saiu de um veículo e deixou de ser empregado, foi a autonomia. Hoje, consegue administrar o próprio tempo e tem como prioridade a rotina dos filhos. Por isso, o final da tarde é sempre dedicado a buscar Theo e Lara, de sete anos, na escola, além de passar um tempo com os herdeiros, fruto da união com a também jornalista Marcela. O casal se conheceu justamente em um campo de futebol, enquanto estavam trabalhando.
Quando não está na labuta nem com os filhos, tem o costume de ler, embora tenha tomado "um fartão" após concluir o mestrado. Quando se depara com um livro, gosta de biografias, como é o caso da obra de Nelson Mandela, bem como de autores como Tony Parsons e Thomas Piketty. "O que não gosto de ler e nunca me atraiu são livros de autoajuda", aponta, ao indicar que também consome publicações de romance, sejam leves ou mais pesadas.
Outro passatempo é se sentar em frente à telinha e relaxar vendo séries, a exemplo de 'Machos Alfa'. Porém, entre as favoritas estão as premiadas 'This is Us' e 'Breaking Bad', além de adorar os diálogos de 'Mad Men'. Para o futuro, ainda deseja voltar a colocar na rotina uma hora de exercício físico por dia, pois precisou parar de correr por alguns meses devido a um problema na coluna.
Assistir a futebol, contudo, já não tem mais a força que tinha quando trabalhava no dia a dia da reportagem e muito conteúdo sobre o esporte - tanto por exigência profissional, quanto por prazer. "Hoje em dia, vou assistir àquele jogo que me interessa diretamente como torcedor", diz, sem revelar o time do coração. Católico, ainda participa da missa aos domingos e reza todos os dias de noite, junto aos filhos.
Ligação com o Sul
Vivendo longe do Rio Grande do Sul há tanto tempo, hoje, ele, que reside em São Paulo, mantém também como conexão com a terra natal um hobby. Diz respeito ao que considera ser "uma grande terapia", que se chama Chaminé On. Duas vezes por semana, acende a chaminé no apartamento para se desconectar do mundo e mergulhar no momento. Antes de ter uma casa com varanda, gostava de cozinhar, mas depois passou a fazer tudo na churrasqueira, como quando faz até camarão nesse lugar. "Uso ela como se fosse um fogão a lenha, mas com carvão."
Com a família toda vivendo aqui, o irmão mais novo de João e Sandra volta e meia está em solo gaúcho. Por isso, vem ao Estado com um sorriso e retorna com boas lembranças. "Aqui ainda está minha família, meus pais, meus sobrinhos e os grandes amigos da vida inteira. O Rio Grande do Sul conta a minha história. Vir pra cá é um pouco de me encontrar comigo mesmo."
Nascido em Porto Alegre, no Hospital Fêmina, Andrei relata que estar na cidade o pega muito, pois adora contemplar o Guaíba, ver o pôr do sol, conferir o clima de futebol na rua, além de sentir o cheiro de churrasco e ver as bergamotas que vendem em cada esquina.
Andrei passou a infância e adolescência toda no bairro Menino Deus. Uma das grandes recordações da época era frequentar shows de rock em lugares como Araújo Viana, Opinião e Gigantinho. Inclusive, o mais marcante foi no ginásio do Beira-Rio, quando teve uma oportunidade que muitos fãs desejaram ter tido: ver Renato Russo cantar ao lado de Dado Villa-Lobos e Renato Rocha, no ápice da banda Legião Urbana.
Ainda sobre música, comenta: "Minha playlist é menos do que sou e mais do que fui a vida inteira". Assim sendo, ouve rock dos anos 1980 e 1990, a exemplo de The Smiths, Dire Straits, U2, Paralamas, Kid Abelha, Ira, Titãs, Engenheiros do Hawaii. "Cresci ouvindo as mesmas bandas que ainda escuto, mas também gosto de voltar um pouco no tempo e escutar The Beatles, Rolling Stones e Queen, por exemplo", manifesta.
Nada de planos
Ele já fez tantos planos para o futuro, enquanto a vida tomou caminhos tão distintos, que é difícil planejar os próximos passos. Entretanto, entende como desafio consolidar o escritório e conseguir conciliar dentro da rotina algo na Comunicação.
Com a qualidade de estudar e se esforçar para conquistar os desejos, sabe que possui como maior defeito a ansiedade. Porém, acha que querer tudo para ontem tem as suas vantagens. E é exatamente por tudo isso que Andrei resume ser "alguém que não tem medo de lutar e está disposto a enfrentar os desafios que a vida apresenta".